10/12/2014 - 12:47
Pelo menos duas vezes por mês, nos últimos três anos, o administrador de empresas Luiz Claudio Santos tem feito o trajeto entre São Paulo e São Luís, a capital maranhense. Santos, que é diretor
de logística e infraestrutura da CGG Trading, do grupo têxtil Coteminas, divide sua rotina com um cargo importante, o de porta voz oficial do Consórcio Tegram, sigla para Terminal de Grãos
do Maranhão. Localizado no porto de Itaqui, o Tegram já consumiu R$ 600 milhões, investidos por um grupo de empresas que ainda inclui a anglo-suíça Glencore, a NovaAgri, do fundo Pátria, e o Consórcio
Crescimento, formado pela francesa Louis Dreyfus Commodities e pela Amaggi, da família do senador por Mato Grosso, Blairo Maggi. A previsão é de que as operações comecem nos primeiros meses de
2015. “O porto de Itaqui resolverá boa parte do problema logístico do País”, diz Santos. Para falar do andamento final das obras e de como o Tegram vai contribuir para melhorar a logística do agronegócio,
o executivo recebeu a revista Dinheiro Rural.
DINHEIRO RURAL – Em que medida o Terminal de Grãos do Maranhão pode mudar a logística do Norte do Brasil?
LUIZ CLAUDIO SANTOS – O grupo que bancou o projeto do Tegram tem por objetivo brigar pelo produtor. É importante destacar que será cada vez mais intenso o aumento da produção agrícola nos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e da Bahia, na região chamada de Matopiba, onde o Cerrado é altamente mecanizável. Alguns estudos conduzidos pelo consórcio mostram que no Piauí, por exemplo, há quase dois milhões de hectares aptos ao cultivo de grãos, que serão plantações na rota do Tegram. Também há cerca de três milhões de hectares no Tocantins, além de muita área de pastagens degradadas no Maranhão e no oeste da Bahia, que igualmente podem ser tomadas pelas culturas de soja e milho. Essas áreas do Matopiba somente aguardam novas alternativas logísticas para entrar no mapa da produção.
RURAL – O milho também pode se beneficiar dessa saída logística, um grão que enfrenta forte concorrência dos Estados Unidos, maior exportador mundial?
SANTOS – Sem dúvida que o cereal brasileiro também será beneficiado. É fundamental destacar a importância do milho nesse projeto, porque atualmente esse grão tem uma escala de produção muito pequena no Matopiba, frente ao potencial da região. Por conta disso, o produtor não tem a garantia de comercialização, principalmente do milho safrinha. E a safrinha é um trunfo para o Brasil, que a colhe justamente quando as lavouras americanas ainda estão em crescimento. Portanto, além de o milho plantado atender o mercado interno, o Tegram vai criar a possibilidade de se ter a colheita da safrinha como um produto exportável.
RURAL – O Tegram suportará a produção dos dez milhões de hectares que formam o Matopiba?
SANTOS – Com certeza. Somente de capacidade estática o terminal suporta 500 mil toneladas de grãos. Cada um dos quatro armazéns construídos pode armazenar até 125 mil toneladas.
RURAL – Esse volume equivale ao de qual porto do País?
SANTOS – É difícil fazer comparações, mas o Tegram já nasce com um potencial muito grande. O porto de Santos, no litoral paulista, por exemplo, possui capacidade para armazenar um milhão de toneladas de granéis. Santos é bastante grande, mas nesse terminal as empresas trabalham de modo independente umas das outras. Já o Tegram vai operar com um conceito novo no mercado, pois é um consórcio formado por quatro empresas em um único estabelecimento. A comunicação entre elas é algo inédito no Brasil e facilitará muito a logística de expedição.
RURAL – Qual é a capacidade de embarque do porto?
SANTOS – Atualmente, via o porto de Ponta da Madeira, que fica ao lado do de Itaqui, em São Luís, é exportado minério de ferro. No porto de Itaqui há um berço para petróleo e outro para cargas
gerais, como alumínio, fertilizantes e grãos. Com o consórcio atuando na área e visando exclusivamente a produção agrícola, o primeiro berço para receber navios vai levar o Tegram a uma capacidade de exportar cinco milhões de toneladas por ano. O segundo berço, com previsão para operar em 2017, elevará essa capacidade para patamares acima de dez milhões de toneladas. E há,
ainda, a possibilidade de um terceiro berço, que não faz parte do projeto atual. Para se ter uma referência, neste ano a previsão é fechar em 65 milhões de toneladas de soja e milho vendidas ao exterior.
RURAL – Como o sr. avalia o Tegram, em comparação a outros projetos de expansão e construção de portos no Norte do País?
SANTOS – Estou certo de que o Tegram concorre como uma ótima alternativa no conjunto das vias de escoamento de grãos do País. No Matopiba, estamos em pé de igualdade, por exemplo, com os corredores de Miritituba, no rio Tapajós, que liga o Centro-Oeste aos portos de Belém e Vila do Conde, e também com a rota pelo rio Madeira, até o porto de Santarém, ambos no Pará. Essas duas rotas vão capturar uma grande quantidade de cargas de Mato Grosso. Somente nas proximidades da BR-163, entre os municípios de Nova Mutum e Sinop, no norte do Estado, há quase 30 milhões de toneladas de grãos sendo produzidos, com boa parte escoada por Santos ou por Paranaguá. Os novos canais que estão surgindo, entre eles o Tegram, beneficiarão o produtor à medida que disputarem preços com outros modais. Mas é claro que ainda há muito que avançar em termos de infraestrutura, principalmente no que depender do governo federal.
RURAL – Como o Tegram vai driblar as ineficiências da infraestrutura logística para ser competitivo?
SANTOS – As ferrovias Norte-Sul e Carajás serão os principais meios de transporte até o Tegram, com capacidade de descarga de quatro mil toneladas por hora. Com isso, estamos próximos de uma boa solução. Em relação à ferrovia Norte-Sul, a previsão é de que em maio de 2015 entre em operação o trecho que já está pronto, de 860 quilômetros de trilhos entre Anápolis (GO) e Palmas (TO). Com os
terminais multimodais de transbordo rodoferroviário, 80% do desembarque de cargas no porto será efetuado por trens.
RURAL – Que tipo de navio vai atracar no Tegram?
SANTOS – O Tegram foi projetado para navios de calado de 15 metros, que podem transportar até 75 mil toneladas. Há um estudo sobre o aprofundamento de um dos berços, visando o recebimento de navios maiores, a exemplo das embarcações que suportam até 140 mil toneladas e atravessam o canal do Panamá. Mas, como para nós esse não é um mercado significativo, o investimento vai depender da demanda futura.
RURAL – O que muda para os portos ao Sul do Brasil com a virada logística para o Norte?
SANTOS – O Tegram vai solucionar boa parte do problema de logística do País. No entanto, como a produção do Centro-Oeste, Norte e Nordeste do Brasil continuará crescendo, os portos ao Sul do Brasil ainda serão um modal importante para a safra agrícola. Mas eles terão de se reorganizar para evitar as filas de espera dos navios, principalmente em Santos e Paranaguá. Somente no ano passado, quando muitos navios ficaram ancorados por até 60 dias, as empresas de navegação pagaram mais de R$ 1 bilhão em espera, a chamada demurrage.
RURAL – A gestão compartilhada do Tegram, decidida pelas empresas que integram o consórcio, tem sido positiva?
SANTOS – Com o modelo de gestão implantado nunca houve problemas de administração, desde que o grupo ganhou a concessão em 2011, ano em que a Empresa Maranhense de Administração Portuária
abriu licitação para o Tegram. As consorciadas desembolsaram R$ 143 milhões pela concessão, válida para 25 anos, podendo ser renovável por mais 25 anos. Nossa parceria é de longo prazo e tem tudo para dar certo. Há vários comitês, como os de engenharia, financeiro, estratégico, jurídico, operações, fiscal e recursos humanos, que funcionam de forma harmônica e de comum acordo.
RURAL – Os rumores de que a NovaAgri, que pertence ao fundo Pátria, poderá ser vendida não levam à quebra dessa harmonia?
SANTOS – Não temos informações sobre a venda, até porque se ela vier a ocorrer é uma decisão interna da NovaAgri. Mas acredito que mesmo se acontecer não vai mudar muita coisa não. Não existe risco de que uma mudança desse tipo venha a prejudicar o consórcio ou a operação portuária. O consórcio já investiu R$ 600 milhões e, nos próximos cinco anos, a previsão é investir mais R$ 300 milhões em armazenagem, transbordo e infraestrutura. São cifras que não dão margem a dúvidas de que o projeto é vencedor.
RURAL – O consórcio já tem algum outro projeto em vista?
SANTOS – Não de imediato, pois foi criado exclusivamente para o Tegram. A prioridade é fazer o terminal de grãos funcionar a todo vapor, mas quem sabe no futuro… Depois que tudo estiver no seu devido lugar, nada nos impede de discutir novos projetos.