Em abril, o agrônomo José Antonio de Souza Rossato Júnior, presidente da Cooperativa Agroindustrial (Coplana), de Guariba, no interior paulista, esteve em Madri, bem próximo à “Plaza de Toros de las Ventas”, a mais tradicional pista espanhola, na qual toureiros se tornam celebridades desafiando animais. Mas Rossato Júnior estava pouco interessado nesse tipo de distração. O que ele queria era enfrentar o público presente ao Fórum Internacional do Amendoim, evento promovido pelo Conselho Internacional de Castanhas e Frutas Secas (INC, na sigla em inglês), organismo do qual fazem parte 630 representantes de 72 países, para mostrar que o Brasil tem capacidade de produzir e vender em quantidade esta leguminosa, a quarta mais importante do mundo, juntamente com a soja, o feijão e o sorgo. O executivo quer mais acesso a um mercado mundial que consome anualmente 35 milhões de toneladas do grão em casca, cultivadas em cerca de 21 milhões de hectares, de acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Rossato Júnior sabe que o esforço em direção a esse mercado é gigantesco. Embora o País tenha produzido na safra 2015/2016 um volume 18% acima da safra anterior, a colheita não alcança nem mesmo meio milhão de toneladas: foram exatas 410 mil, volume que representa 1,2% da produção mundial. “Por isso precisamos apostar na venda lá fora”, afirma Rossato Júnior. “A exportação é fundamental para manter o ritmo de crescimento do setor e também o nosso.”  No ano passado, a Coplana faturou R$ 399 milhões, dos quais metade com o comércio de amendoim. Neste ano, a previsão é exportar até 23 mil toneladas do produto beneficiado, principalmente para a Europa que utiliza o grão na indústria da confeitaria e  paga mais do que o mercado de óleo bruto. A cooperativa exporta o amendoim cru, chamado de blancheado (sem a película que envolve o grão), o semielaborado (granulado e tostado) e recentemente passou a vender a pasta bruta da leguminosa.

A Coplana, que reúne 1,5 mil cooperados com foco na produção de cana-de-açúcar, possui um grupo de 150 agricultores que estão apostando no amendoim. Ela é uma das mais antigas cooperativas de São Paulo, criada há 53 anos. Tem entre os fundadores e primeiro presidente o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, atual coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas e, até hoje, um de seus cooperados.  A recomendação aos produtores é que o amendoim entre como uma alternativa nas áreas de renovação de canaviais, disputando a preferência pelo milho ou mesmo a cana de ciclo curto. “A renda do cultivo do amendoim chega a amortizar até 20% dos custos de implantação de um novo canavial”, afirma Rossato Júnior. Na região Centro-Sul do País, os canaviais ocupam 7,9 milhões de hectares. “Se tomarmos por base a necessidade de renovar 15% dessa área anualmente, são 1,2 milhão de hectares disponíveis para outras culturas e queremos que os produtores escolham o amendoim.” Tomando-se a atual produção, o potencial é de cerca de 4,2 milhões de toneladas por safra, o que levaria o País a brigar por uma posição entre os dez maiores produtores do mundo. Hoje, ele ocupa a 16ª posição entre as commodities. O Valor Bruto da Produção (VBP) é estimado em R$ 662,7 milhões neste ano, 8,4% acima de 2015, de acordo com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).


Lavoura nos trinques: o produtor Walter Souza, que cultiva 980 hectares, tem investido em máquinas para ser mais eficiente no campo

De olho na possibilidade de um mercado mais robusto, nos últimos seis anos a Coplana investiu R$ 40 milhões para construir a maior processadora de amendoim do País. São 110 mil toneladas anuais do grão, embora os cooperados consigam fornecer somente a metade dessa demanda. “Foi justamente comprando amendoim de produtores não cooperados que estamos chegando ao limite da nossa capacidade”, diz Rossatto Júnior. “Nos próximos meses, vamos definir como continuar investindo no setor”. Na safra encerrada no dia 30 de junho, os cooperados colheram 59 mil toneladas de amendoim, mas o desempenho poderia ter sido melhor, caso o excesso de chuva não tivesse atrapalhado o desenvolvimento a cultura. “Nós estimamos a quebra da safra 2015/2016 em pelo menos 20%”, diz ele. Ainda assim, a produção média dos cooperados foi exemplar: 165 sacas de 25 quilos, por hectare, 22% acima da média nacional.


Bem aquecido:Renata Sampaio, do IEA, afirma que a tendência para todo o ano de 2016 é de mercado em alta, por causa do dólar valorizado

O interesse da cooperativa no amendoim não é recente. A Coplana vem propondo a cultura como alternativa de renda há cerca de duas décadas. Um dos principais argumentos é a sua valorização histórica, constante e segura. Nos anos 1990, uma  tonelada no mercado internacional valia US$ 700. Subiu para US$ 1 mil no final dos anos 2000 e nos últimos anos o preço tem ficado próximo de US$ 1,8 mil por tonelada, chegando a picos de US$ 2,5 mil, como ocorreu em 2013. De acordo com a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), órgão do governo federal, a Europa foi o principal destino das 96,6 mil toneladas de amendoim em grão, exportadas pelo Brasil em 2015, ante 63,6 mil toneladas vendidas em 2014. A exportação de óleo bruto também cresceu: passou de 38,4 mil toneladas para 57,8 mil toneladas, enviadas também para a Europa, além da China. Renata Martins Sampaio, pesquisadora do Instituto de Economia Agrícola (IEA), diz que na última safra o grão se beneficiou da valorização da moeda americana, assim como ocorreu para as culturas de soja e milho. “Essa valorização do dólar deve manter aquecidas as vendas externas de amendoim também em 2016”, afirma Renata. O Brasil possui hoje cerca de 3,5% do mercado exportador, figurando em quinto lugar. Estão na frente, por exemplo, Argentina e Estados Unidos, países que investiram muito em pesquisa para melhorar a qualidade do grão. 


Equipamento de primeira: a Coplana investiu R$ 40 milhões para construir a maior processadora de amendoim do País

Para vencer o desafio da produção, a Coplana conta com associados como Walter Luiz de Souza, 55 anos, da fazenda Santa Cândida, na região de Jaboticabal (SP). O cultivo de amendoim é uma tradição na família de Souza, que se tornou uma grande produtora da oleaginosa em terras de áreas de reforma de canaviais. Na safra 2015/2016, o agricultor plantou 980 hectares, dos quais 90% em terras arrendadas e 10% em terras próprias. Souza aposta tanto na cultura que, nos últimos anos, tem modernizado seu parque de máquinas. A última aquisição, realizada na safra 2014/2015, foi uma colhedora de tecnologia americana, avaliada em R$ 290 mil, com capacidade para 2,5 mil sacas por dia, ante 1,2 mil sacas do modelo antigo.  “O esquema do amendoim é ótimo”, afirma o produtor, que paga aos donos da terra o equivalente a 15% da colheita. A média de produção na safra passada foi de 208 sacas por hectare, 26,5% acima da média dos cooperados, embora ele também tenha perdido produtividade em função do excesso de chuva.


Embarque garantido: quase metade do grão processado no interior de São Paulo segue para a Europa e a China

O produtor Delson Luiz Palazzo, da fazenda Santa Emília, também em Jaboticabal, diz que a Coplana propõe um modelo de assistência que de fato assegura a sobrevivência dos seus cooperados. Palazzo, que cultiva 500 hectares de cana-de-açúcar, está na atividade desde 1990. Arrenda para produtores de amendoim as terras que precisam de reforma, ficando com 20% da produção. “O modelo da Coplana garante uma injeção de dinheiro na região”, afirma ele. O agricultor se refere à oferta de sementes certificadas, defensivos, assistência técnica, informações sobre mercado e facilidades na obtenção de crédito, além de garantir a comercialização do amendoim.  Rossatto Júnior diz que isso é apenas uma parte da assessoria dada aos produtores e que a cooperativa tem se esforçado também na busca por certificações para facilitar o acesso global ao mercado. Há cinco anos, a Coplana recebeu a certificação internacional BRC (British Retail Consortium), exigência do mercado europeu, e em 2014 a certificação Kosher, para vender amendoim à comunidade judaica. “Nós acreditamos que, ao acompanhar a qualidade do grão, do campo à indústria, isso pode nos levar ainda mais longe”, afirma ele.