01/12/2016 - 11:51
Como os goleiros veteranos de grandes clubes, o italiano Luciano Roppa, 69 anos, presidente da Trouw Nutrition no Brasil, subsidiária da empresa holandesa de alimentação animal Nutreco, ainda tem defendido bem sua retaguarda, quando a maioria dos executivos de multinacionais já pendurou as chuteiras há muito tempo. Agora, ele decidiu que fará o mesmo no final de 2017: vai se aposentar da vida de executivo para cuidar de uma fazenda no interior paulista. “Vou criar bois, já tenho cerca de mil animais”, diz Roppa. Mas antes ele tem uma missão a cumprir nesse jogo: formar o seu sucessor para liderar o ataque da companhia que, no ano passado, faturou mais de R$ 600 milhões, segundo estimativas do mrcado; possui sete fábricas de ração, suplemento animal e desenvolvimento de tecnologias; e conta com 1 mil funcionários.
A comparação com o futebol não é apenas uma metáfora para Roppa. Ele diz que o esporte marcou a sua vida e trabalho. Isso porque, quando jovem e já no Brasil aos sete anos, ele queria mesmo era ser atleta. “Cheguei a ser aprovado numa peneira de juvenis do São Paulo Futebol Clube, como goleiro do time”, afirma o executivo. Mas a carreira no futebol não passou daí. Ela foi logo interrompida pelo pai Carlo Pietro Roppa, que exigiu do filho a continuidade dos estudos. Assim, em 1972, o ex-futuro goleiro se formou médico veterinário pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), no campus de Botucatu.
O sucessor escolhido para ocupar o lugar de Roppa é o engenheiro agrônomo André Luiz Junqueira Franco, 47 anos, diretor geral no Brasil, respondendo pelos departamentos de manufatura e logística, recursos humanos, marketing, vendas, preços e gestão das linhas de produtos para piscicultura e equinos e animais domésticos. “Roppa tem sido um grande apoiador e, apesar de estar bastante presente, me dá liberdade para aprender a partir de meus próprios erros e acertos”, diz Franco. “Ele domina muito as questões técnicas e de mercado do nosso setor, com uma tranquilidade que eu nunca havia visto antes.” Para Jeffrey Abrahms, especialista em recursos humanos e sócio-gerente da consultoria Fesap, a sucessão em uma empresa depende muito do processo de avaliação da gestão e do alinhamento das metas, além do desapego de quem está passando o bastão. “O equilíbrio emocional e a vaidade controlada são essenciais para quem vai deixar o cargo”, diz Abrahms. “Além disso, o tempo de convívio na empresa, entre o atual gestor e seu sucessor, é importante para uma boa transição.”
No caso de Roppa, como um goleiro experiente que já passou por longos e intensos treinamentos, em sua trajetória como executivo ele foi sempre um “atleta” de alta performance. O início da carreira como veterinário foi em uma granja de suínos no interior paulista. “Fui porque ganharia mais do que ser professor na faculdade, onde já havia passado em um concurso”, afirma Roppa, que durante a faculdade pensava em se especializar em cirurgia de pequenos animais. Já a experiência como executivo foi construída em grandes empresas do setor, entre elas a brasileira Guabi, seu primeiro emprego e na qual permaneceu por duas décadas. Em 1995, a experiência acumulada o fez dar um passo ousado: sair da posição de funcionário para a de sócio. Junto com nove colegas de profissão, Roppa ajudou a fundar a Nutron, empresa que se tornou referência no País. “Alcançamos a liderança no mercado em menos de seis meses”, afirma. “Isso mostra que, às vezes, as pessoas são mais fortes do que um produto.” Mas, ainda em 1997, em virtude da necessidade de aumentar o capital de giro, eles venderam 50% para a holandesa Provimi, que compraria o restante da empresa cinco anos depois. Porém, ele continuou na companhia, que o contratou como presidente. E permaneceu no cargo até 2011, quando a Provimi-Nutron foi comprada pela americana Cargill. “Na época, eu já tinha 64 anos e por uma política interna da Cargill não poderia mais exercer cargos direção.”
A partir daí, Roppa foi conhecer um outro lado do jogo, o de consultor. Entre as empresas que utilizaram os seus serviços estão a alemã Basf Crop Science, a americana Elanco Saúde Animal, a sueca Alfa Laval e a brasileria Ouro Fino. “Eu pensava em um ano sabático, mas algumas empresas começaram a me procurar e não resisti”, afirma ele. O retorno ao cargo de presidente, seu atual posto, ocorreu em 2014. Roppa sabe que na cartilha futebolística a regra para ser um bom goleiro é ter muito mais atenção, rapidez e elasticidade do que os demais jogadores. É isso que ele espera deixar como herança para o seu sucessor, Franco. “Comandar é contar com profissionais mais qualificados do que você”, diz Roppa. “Franco possui uma grande capacidade organizacional e estratégica”. Embora o executivo tenha chegado na Trouw há cerca de um ano, sua carreira no setor já tem peso. Entre as empresas pelas quais passou estão a Ceres Agro, empresa de comércio de insumos, com sede em Pouso Alegre (MG), e a americana Monsanto. “Não tive dúvida quando recebi o convite para fazer parte do time do Roppa porque todas as suas referências são muito positivas”, diz Franco. Abrahms, da Fesap, destaca que um sucessor tende a modernizar as práticas da empresa e deixar marcas pessoais. “Isso ocorre, mesmo que as mudanças estejam acontecendo muito rapidamente, com a consolidação dos mercados e o avanço tecnológico”, afirma Abrahms. Para Roppa, a contratação de Franco é como terminar a partida sem tomar um único gol.