25/02/2021 - 8:00
Parte das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) da cidade de São Paulo tem de lidar com fila e aglomeração de quem busca se cadastrar para a “sobra” da vacina contra a covid-19. Para evitar o desperdício no fim do dia (parte dos frascos contém 10 doses, que após abertos não podem ser guardados), a Prefeitura orientou as UBSs a abrirem cadastro para que idosos com mais de 60 anos e profissionais da saúde – moradores da região – possam receber o imunizante.
O problema é que a oferta é muito menor do que a demanda. Na UBS Sigmund Freud, em Moema, zona sul, por exemplo, até o fim da tarde de anteontem havia mais de 500 cadastrados. Na Barra Funda, zona oeste, o Centro de Saúde Escola Barra Funda Alexandre Vranjace está com lista de espera de mais de 300 nomes. Na Vila Alpina, zona leste, a UBS ressalta aos pacientes que a inscrição “não é garantia”, pois já ultrapassou os 150 cadastrados, enquanto o posto Jardim Aeroporto, na zona sul, informa aos pacientes que há “bastante” procura, com “muito mais” de 50 inscritos.
Uma enfermeira da unidade de Moema informou que diariamente sobram, no máximo, duas doses. Para acelerar a produção da vacina, foram feitos frascos maiores, com dez doses em cada. Atualmente estão sendo vacinadas pessoas com mais de 85 anos. Por volta das 18 horas, quando acaba a imunização oficial, se há sobra de vacinas os profissionais da saúde telefonam para quem foi cadastrado, que tem cerca de uma hora para aparecer e receber o imunizante excedente.
Uma senhora de 60 anos parou o trânsito da Avenida Indianópolis, na zona sul, para entender o motivo da fila na unidade de Moema. Ela indagou ao segurança se era para aplicação da vacina e disse já ter feito o cadastro. Com a SUV estacionada em fila dupla, ignorando as buzinas, tentou descer do carro para fazer novo cadastro.
Insatisfeita por não colocar seu nome novamente na lista, avisou que apareceria mais tarde, perto das 19 horas. “Vai que a pessoa chamada não aparece, né? Aí aplicam em mim, porque ninguém vai jogar dose fora.”
Marie Bonducki, de 68 anos, disse que demorou 15 minutos na fila da UBS de Moema para fazer o cadastro. Soube da sobra pelas redes sociais, mas não estava muito confiante em receber a dose. “Com esse governo que é uma lástima, nunca se sabe o que vai acontecer.”
No mesmo local, Vivian do Carmo, de 64 anos, reclamou da bagunça. “Não custava nada, coloca uma faixa, indica um distanciamento. Está todo mundo aglomerado”, queixou-se.
Zeila Colesi, de 74 anos, comentou que o cadastro foi simples de fazer. “Tem muita gente, não sei se vai ter sobra para todo mundo. Mas a gente sempre tenta. De um jeito ou de outro espero tomar a vacina.”
Palmas e foto nas redes. Entre os que conseguiram aproveitar a oportunidade está a aposentada Olinda Martinez, de 67 anos, que recebeu a primeira dose na quarta-feira, 17, dia seguinte ao que se cadastrou em um posto do Brooklin, zona sul. “Só tinha dez pessoas na frente. Ontem (segunda-feira), passamos lá e já tinha 290 pessoas (na lista)”, conta.
Olinda ainda conseguiu que o marido, também idoso, fosse vacinado, mas perdeu a chance de inscrever o pai, de 82 anos. “Se soubesse (que levaria alguns dias para a faixa etária dele ter a vacinação liberada), teria colocado antes de mim”, lamenta ela, que tomará a próxima dose em maio. A sensação é de que “ganhou na loteria”. “Se fosse esperar a minha vez, talvez só no fim de março.”
Os conhecidos dela estranharam a situação. “Tirei foto e postei para todos os meus amigos. Perguntaram até se eu tinha pagado”, comenta. “Todo mundo me ligou, dizia ‘Graças a Deus, amiga, que você conseguiu’.”
A empresária Maria Helena Nader, de 77 anos, também conseguiu se vacinar em uma UBS, em Indianópolis, há cerca de uma semana. Conta que a filha viu uma pequena fila em frente ao posto e decidiu levar os pais. “Perguntei o que era? É a vacina que sobra, responderam. Passei a mão na bolsa e fomos lá.”
Segundo ela, oito pessoas (entre profissionais de saúde e idosos fora do grupo prioritário atual) conseguiram tomar a vacina naquele dia. “Recebi a última que estava sobrando na geladeira”, comemorou. “Cada vez que um tomava, eram palmas e uma gritaria. Fui abençoada!”
Sem protocolo
A Secretaria Municipal de Saúde informou que não há protocolo de como as UBSs devem realizar o cadastro. Em alguns locais, a orientação é para que o interessado vá presencialmente ao local para se inscrever, enquanto outras permitem que o cadastro seja feito por um familiar, desde que leve documento e comprovante de residência. Há outros, ainda, que permitem a inscrição até mesmo pelo telefone, desde que a pessoa leve a documentação exigida no momento da aplicação. A medida não abrange todas as unidades. Na UBS Bom Retiro, no centro, e no Parque da Lapa, zona oeste, por exemplo, a lista de espera não foi criada, pois o imunizante administrado veio somente em frascos de dose única.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.