12/03/2018 - 10:00
A turismóloga goiana Rosana Lobo Favoretto, 45 anos, nunca imaginou que um dia iria conduzir uma criação de vacas leiteiras. Com especialização em planejamento urbano e ambiental, era óbvio que ela trabalhasse na cidade. E foi isso o que aconteceu até meados do ano passado, como servidora pública do governo de Goiás, na capital do Estado. “Saí do meu emprego no início de 2017 e pensei que ia voltar para o turismo”, diz Favoretto. “Mas não foi o que aconteceu.” Casada com o agrônomo e produtor de leite Gustavo Vaz, 55 anos, ela recebeu do marido a incumbência de por nos trinques a fazenda São Bento, de 968 hectares no município de Palminópolis (GO). “Chamei a Rosana para a missão porque é uma boa gestora e insistente no que faz”, diz Vaz. Ela aceitou o desafio, mesmo sem saber como tirar um pingo de leite de uma vaca. Foram cerca de seis meses de conversas com técnicos agrícolas, até que Rosana decidiu baixar um aplicativo pelo celular. “Achei amigável e prático de usar”, diz ela. “Foi com essa ferramenta que passei a conhecer a lógica da atividade leiteira.”
Ao ser questionada, por exemplo, sobre o número de animais da fazenda, Favoretto não perdeu tempo e foi logo acessando o seu celular. “Tenho tudo aqui”, diz ela, mostrando o aparelho. “São 92 vacas, 53 novilhas, 15 recrias, 79 bezerras e 37 vacas secas.” Com o rebanho de 276 animais da raça girolando, monitorados pelo aplicativo, a gestão da fazenda ficou mais fácil.
“Agora, conhecemos melhor o rebanho e isso deu mais ânimo para investir”, diz Vaz. “Hoje, é ela que está no comando total da atividade.” Em 2017, o casal investiu cerca de R$ 100 mil com serviços de inseminação, compra de sêmen e vacas girolando, além de ração e sal mineral de mais qualidade. A produção foi de 950,5 mil litros e deve chegar a 1,1 milhão em 2018. “Com o aplicativo é fácil chegar a esse número, porque ele nos direciona”, diz Vaz.
A história do casal goiano não é um fato isolado. Com a febre de agtechs, os produtores têm acesso a ferramentas digitais que passam a monitorar a produção 24 horas por dia. Isso traz alento à produção leiteira nacional, ainda carente por tecnologia, mas de potencial gigantesco. O Brasil é um dos cinco maiores produtores do mundo, com 33,6 bilhões de litros de leite por ano. A solução encontrada por Rosana saiu da startup mineira 4Hoofs, dona do aplicativo 4Milk, que este ano passa a ser oferecido a produtores da América Latina e de Portugal.
Disponível de graça para celulares e tablets com os sistemas Android e iOS, além de computadores, a solução permite o agendamento de tarefas comuns do dia a dia, como vacinação e alimentação, programação de acasalamentos, e acompanhamento da reprodução, produção e sanidade dos animais. Segundo o engenheiro elétrico Claudio Notini, CEO da 4Hoofs, o aplicativo ainda permite realizar a compra e a venda de animas, e receber promoções e novidades do setor. “Investimos na plataforma para torná-la uma forte aliada, inclusive para a informação de registros de nascimentos de animais nas associações de produtores”, diz Notini.
Essa função, que será cobrada, começa a rodar neste mês, a partir de um projeto firmado com a Associação Brasileira dos Criadores de Girolando. A ação marca o início da oferta de pacotes pagos no aplicativo. Dependendo do pacote, o serviço pode variar de R$ 30 a R$ 180 por mês. Serão oferecidos módulos financeiros, formulação de dietas para os animais e acesso ao sistema por computador. “Apesar desses pacotes, o aplicativo continua gratuito para as funções já existentes, sem limites para o número de animais registrados”, diz Notini. A visibilidade é para que ajude a startup a atrair mais investidores para a sua plataforma. A ideia é fechar 2018 com R$ 10 milhões de aportes. Até agora foram investidos R$ 2,2 milhões.
Cerca de 11,5 mil downloads do aplicativo já foram realizados, sendo 2,8 mil por fazendeiros que usam a ferramenta todos os dias. O aplicativo 4Milk compete com soluções como o paulista Bovcontrol, o catarinense Jetbov e o Roda da Reprodução, da Embrapa Gado de Leite, e tem atraído as empresas. Entre elas, a americana de saúde animal Elanco, controlada pela Lilly, que pretende oferecer seus produtos e serviços pela plataforma, além da Coca-Cola, que desde 2016 controla o laticínio mineiro Verde Campo. “O aplicativo vai permitir um contato mais próximo com os produtores, para acompanhar a produção ou saber quais insumos eles mais precisam”, diz Notini. “Temos um futuro muito promissor pela frente.”