10/09/2018 - 10:00
A imagem do criador paulista de ovinos Augusto Quirós, de 29 anos, CEO da Quirós Gourmet, surge ao som da música Hotel California, da banda americana Eagles, dedilhada no violão. No vídeo o criador tempera um cordeiro inteiro. As imagens foram gravadas na cabanha Oviedo, propriedade de 507 hectares que fica em Morungaba, a 110 quilômetros da capital paulista. Com duração de três minutos, o filme é um dos 40 publicados no canal de Quirós no Youtube desde o fim do ano passado. Em todos eles, ele aparece preparando um corte específico de cordeiro. “Agora, quero criar um programa com convidados”, afirma Quirós. “A ideia é trazer pessoas influentes nas mídias sociais, personalidades e empreendedores, e desafiá-los a preparar um prato com carne de cordeiro”. Um dos primeiros participantes será o amigo Tallis Gomes, criador do aplicativo de transporte de passageiros Easy Taxi. Também haverá vídeos técnicos sobre a criação e pequenos informativos e curiosidades sobre o mercado de ovinos.
O canal de Quirós tem 3,4 mil seguidores. Sua meta é ser um dos primeiros influenciadores digitais do agronegócio brasileiro. O termo designa as pessoas com muita visibilidade nas redes sociais e que são capazes de influenciar hábitos dos internautas. Além do Youtube, Quirós está no Instagram e no Facebook. No entanto, ele não quer atrair atenção para si mesmo. Seu objetivo é popularizar a carne ovina. O esforço é justificado. O rebanho ovino é o quarto maior do País, com 18,4 milhões de animais, mas o consumo da carne ainda é pequeno. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), são apenas 700 gramas por pessoa por ano. Isso passa longe dos 42,8 quilos de frango, dos 32,5 quilos de carne bovina e dos 14,7 quilos de carne suína consumidos pelo brasileiro anualmente. Para mudar esse quadro, Quirós quer aguçar o apetite das pessoas, estimulando-as inserir esse ingrediente nas refeições em família ou no churrasco com os amigos. “Queremos criar a cultura do consumo da carne de ovinos, mostrando a versatilidade dos cortes e as opções que se podem fazer com eles”, afirma Quirós.
Sua empreitada começou em 2015, quando assumiu a Quirós Gourmet. O empreendimento havia sido fundado seis anos antes, em 2009, por sua irmã Priscila, que hoje se dedica ao marketing. Desde que assumiu a empresa, Quirós ampliou a presença das marcas Quirós Gourmet e Premium Lamb Cabanha Oviedo, antes restrita à capital paulista, para 58 cidades em 16 Estados. Neste ano o faturamento chegará a R$ 8 milhões, 20% a mais que no ano passado. O esforço de marketing e a exposição nas redes sociais já deram frutos. Hoje, redes de hotéis como Hyatt e Fasano, e restaurantes paulistanos importantes como La Casserole e Sal Gastronomia são consumidores fiéis dos cortes da Quirós.
O mais novo freguês é o Tavola Evvai, lançado no ano passado pelo chef Luiz Filipe Souza em Pinheiros, zona Oeste de São Paulo. Em alguns meses, Souza viu a carne de cordeiro se tornar a estrela do cardápio. “Ganha hoje da costela e do filé mignon bovino”, afirma o chef. “O carré de cordeiro é a carne mais pedida no restaurante.” São servidos cerca de 270 pratos por mês, o que representa um consumo de 67,5 quilos. “É uma carne macia e saborosa, muito apreciada pela clientela.”
O trunfo para abrir o apetite da clientela está na fazenda. Quirós vem aplicando técnicas de melhoramento genético no rebanho de 1,5 mil matrizes da raça de origem australiana poll dorset. O animal chega ao ponto de abate com quatro meses de idade, rendendo 13 quilos de carne em média. A propriedade tem abatido 12 mil cordeiros por ano, o que garante uma produção de 156 toneladas de carne. O negócio está no sangue. Os Quirós vêm da região espanhola das Astúrias. A família, que dá nome a um dos municípios da região, cria cordeiros há mais de um século. No Brasil, a propriedade foi batizada com o nome da capital provincial, Oviedo. Nela os irmãos mantêm a tradição do cuidado artesanal com os animais. “Todo o alimento para o rebanho é produzido aqui”, afirma Quirós. Há 145 hectares dedicados ao cultivo de milho e de soja, para a produção de silagem. Cerca de 15 nascentes abastecem os cochos de água e irrigam os 290 hectares de pasto, que complementam a nutrição dos animais.
Ele não está só nessa empreitada. A veterinária Élen Nalério, que trabalha como pesquisadora na Embrapa Pecuária Sul, em Bagé (RS), pretende aumentar a presença da carne ovina na mesa do brasileiro por meio da ampliação da oferta de produtos disponíveis. “A maior variedade ajuda as pessoas a tomarem gosto pela carne”, diz ela. A carne in natura agrada na cozinha, mas as perspectivas do consumo industrial são muito maiores. Desde 2012, a pesquisadora vem estudando opções para contornar o principal entrave ao consumo da carne ovina, seu odor desagradável, resultante do manejo alimentar incorreto por parte dos produtores. “Resolvemos isso processando a carne, o que elimina o cheiro e garante o mercado”, diz Élen. A pesquisadora desenvolveu cerca de dez produtos. Entre eles estão uma linha de frios, embutidos e outros processados como presuntos cru e cozido, copa e bacon. Até o fim deste ano, a Embrapa deve lançar um edital de oferta pública para transferir a tecnologia de produção dos alimentos para uma agroindústria fabricá-los comercialmente.