A Procuradoria da República no Distrito Federal decidiu que é preciso aprofundar a apuração sobre as negociações para compra da vacina indiana Covaxin. O contrato de R$ 1,6 bilhão foi cancelado pelo Ministério da Saúde depois que suspeitas de corrupção e superfaturamento envolvendo a aquisição do imunizante vieram a público na CPI da Covid. Estava prevista a importação de 20 milhões de doses ao custo de US$ 15 cada – a mais cara comprada pelo governo.

A investigação preliminar conduzida pela procuradora Luciana Loureiro ganhou status de inquérito formal nesta segunda-feira, 30. Ao mandar o caso para a esfera criminal, na semana passada, ela apontou “indícios de crime” e “interesses divorciados do interesse público”. A procuradora disse ainda que não se justificaria “a temeridade do risco assumido pelo Ministério da Saúde com essa contratação”.

Na portaria que confirma a instauração do procedimento, o procurador Paulo José Rocha Júnior aponta como objeto da investigação criminal “apurar, especificamente, supostas irregularidades na celebração do contrato”. Ele será o responsável pela investigação.

A Polícia Federal também abriu uma frente de apuração, a pedido do Ministério da Justiça, para investigar se houve irregularidade nas tratativas para aquisição do imunizante fabricado pelo laboratório indiano Bharat Biotech.

As suspeitas de corrupção no negócio foram levantadas pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e pelo irmão do parlamentar, Luis Ricardo Miranda, que é chefe de importação do Departamento de Logística do Ministério da Saúde e relatou ter sofrido pressão “atípica e excessiva” para liberar a compra das doses da Covaxin. O servidor chegou a ser ouvido pela Procuradoria no Distrito Federal na primeira etapa da investigação.

Em depoimento à CPI da Covid, na semana passada, os irmãos Miranda disseram que comunicaram o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sobre os indícios de irregularidades. Segundo eles, Bolsonaro se comprometeu a acionar a Polícia Federal para apurar o caso, mas nenhuma investigação foi aberta na época.

Além da pressão, os Miranda apontaram inconsistências nas invoices (espécie de nota fiscal internacional) enviadas pela empresa que intermediou a importação da vacina, a Precisa Medicamentos, como a inclusão da modalidade de pagamento antecipado. O contrato do governo para adquirir a Covaxin também levantou suspeitas de senadores por ter sido o único firmado por meio de uma empresa intermediária. Todos os outros foram negociados diretamente com laboratório fabricantes ou que produzirão os imunizantes no País. A Precisa Medicamentos não atuava até então no ramo de vacinas.

Pressionado, Bolsonaro disse que desconhecia os detalhes sobre a compra da Covaxin e negou irregularidades no negócio. A versão do Planalto é a de que o Ministério da Saúde abriu um procedimento administrativo interno, mas não encontrou evidências de desvios.

O Ministério da Saúde assinou contrato com a Bharat Biotech, representada pela Precisa Medicamentos, em fevereiro deste ano. O empresário Francisco Maximiano, sócio da empresa, tem depoimento marcado para esta quinta-feira, 1º. Ele teve os sigilos quebrados pela CPI.

A ordem para a aquisição da vacina partiu pessoalmente do presidente Jair Bolsonaro. A negociação durou cerca de três meses, um prazo bem mais curto que o de outros acordos. No caso da Pfizer, foram quase onze meses, período no qual o preço oferecido não se alterou (US$ 10 por dose). Mesmo mais barato que a vacina indiana, o custo do produto da farmacêutica americana foi usado como argumento pelo governo Bolsonaro para atrasar a contratação, só fechada em março deste ano.