21/09/2021 - 22:10
Um grupo de 18 associações ligadas à produção de notícias redigiu um comunicado conjunto, veiculado em diversos jornais nesta terça-feira, 21, demandando “remunerações justas e razoáveis” pelos conteúdos jornalísticos utilizados nas plataformas digitais, como as redes sociais e os serviços de busca. A lista de entidades, que inclui associações do Brasil, do Canadá e de diversos países latino-americanos, se inspirou em uma mudança de legislação australiana.
A Austrália aprovou, em 25 de fevereiro deste ano, o Código de Negociação Obrigatória para Mídia de Notícias e Plataformas Digitais. Esse sistema, segundo as entidades, garante que as plataformas “paguem aos meios de comunicação pelo uso que fazem do seu conteúdo, com o qual o obtêm muitos benefícios, diretos e indiretos”. Entre as entidades que assinam o manifesto está a Associação Nacional de Jornais (ANJ).
Para o presidente da ANJ, Marcelo Rech, a remuneração dos veículos de comunicação, como previsto pela legislação australiana, é uma forma de evitar um “apocalipse informativo”, e o fim da imprensa. “Essa é uma iniciativa inédita. O plano de fundo desse manifesto é a defesa do ecossistema jornalístico e da democracia, que são pilares da sociedade. Em algum ponto do futuro, pode haver um virtual desaparecimento do jornalismo profissional, com consequências extremamente danosas à sociedade”, diz.
Por trás do movimento está a mudança na forma de consumo de notícias e uma dicotomia que tomou conta do mercado: enquanto a audiência dos veículos é maior do que nunca, sua sustentabilidade financeira está ameaçada. “As receitas que financiavam o jornalismo profissional são absorvidas por intermediários que concentram mais de 80% da publicidade digital no mundo”, diz o comunicado das entidades, em referência a plataformas como Google e Facebook.
Valor da compensação
Embora as plataformas tenham anunciado algumas iniciativas para remuneração de veículos de mídia, as entidades acreditam que elas estão longe de serem suficientes. “São louváveis as iniciativas recentes de Google e Facebook, cujo objetivo é pagar à mídia em alguns países pela licença de conteúdo. Porém, acreditamos que esses programas ainda não são a resposta justa e completa de que o setor precisa”, apontam, no comunicado. Na semana passada, o Facebook anunciou um aporte de até US$ 2,6 milhões voltado a empresas jornalísticas brasileiras, incluindo o Estadão.
O presidente da ANJ classifica iniciativas como a do Facebook como “louváveis”, mas ainda insuficientes para reverter as tendências de um possível desaparecimento do jornalismo profissional. “Temos informações iniciais de que as negociações de veículos de comunicação da Austrália chegaram 500 milhões de dólares australianos (aproximadamente R$ 1,9 bilhão na cotação atual)”, diz.
Outro problema, afirma Rech, é que a falta de apoio político pode dificultar as discussões sobre o tema no Brasil. “A situação na Austrália é muito peculiar, porque governo, Congresso e sociedade deram amplo apoio ao projeto. Obviamente no Brasil nós não temos o apoio do Executivo, até porque boa parte dos veículos de comunicação, exercendo sua atividade jornalística independente, são alvos do Executivo.”
Trabalho conjunto
Segundo o comunicado das entidades, a compensação não pode ser feita apenas com base na vontade unilateral das plataformas, mas sim ser fruto acordado de um direito universal preexistente e proporcional para os editores. “Precisamos promover um ecossistema digital justo e equilibrado, no qual a opacidade dos algoritmos não acabe decidindo que informações são relevantes para uma pessoa ou sociedade.”
Questionado sobre o manifesto que cobra uma maior compensação financeira para a produção jornalística no Brasil, o Google afirma, em nota, que está comprometido em “garantir um futuro robusto para a produção de notícias”. “Apoiar o jornalismo de qualidade é importante para o Google. Temos um histórico consistente de trabalho e contato com as associações envolvidas”, diz a empresa.
“Como uma das maiores empresas que mais apoia financeiramente o jornalismo de qualidade, nós acreditamos que temos uma responsabilidade compartilhada de garantir um futuro robusto para a produção de notícias e estamos comprometidos em fazer a nossa parte para que isso aconteça”, acrescenta o Google, no comunicado.
Também em comunicado, o Facebook afirma que veículos de notícias usam a rede social para compartilhar conteúdo e ampliar o total de acessos a seus sites – a empresa diz ter, inclusive, trabalhado em parceria com entidades signatárias do manifesto. “Estamos investindo mais de US$ 1 bilhão em jornalismo globalmente e continuaremos colaborando para apoiar o papel fundamental do jornalismo na democracia”, diz, na nota, Claudia Gurfinkel, diretora de parcerias de notícias do Facebook para a América Latina.