A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) divulgou nesta segunda-feira, 11, uma nota técnica contra a PEC que tenta alterar a composição e as atribuições do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

A entidade de classe contesta as principais mudanças previstas no texto e defende a rejeição da proposta de autoria do deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP). A PEC ganhou apoio de deputados do próprio PT e do PDT, DEM, PP, PCdoB, Republicanos, PSL, PSC, MDB, PSOL e PTB.

“A nova proposta viola, de forma inconstitucional, o desenho institucional do Ministério Público brasileiro”, diz a associação. “Não se pode aceitar a tentativa legislativa de atingir o coração do Ministério Público, que é a sua autonomia institucional e a independência funcional de seus membros”, acrescenta na nota.

O CNMP, ou ‘Conselhão’, é responsável por fiscalizar a conduta de membros do Ministério Público. A PEC atinge tanto a composição do colegiado quanto a própria função do órgão.

VEJA AS PRINCIPAIS MUDANÇAS PROPOSTAS:

– Aumento de assentos no colegiado reservados a indicações alternadas da Câmara e do Senado, que passam de dois para quatro, ampliando a influência externa no Ministério Público;

– Membro indicado pelo Congresso passa a ser também o vice-presidente do CNMP;

– CNMP ganha poder de rever atos privativos de membros da instituição, podendo inclusive anular portarias para instauração de investigações;

– Congelamento de prazos prescricionais de infrações até a decisão final sobre a conduta do procurador ou promotor;

– Corregedor Nacional não precisará mais ser eleito entre os membros do Ministério Público;

– CNMP deverá criar um Código Nacional de Ética e Disciplina para guiar a conduta de membros da instituição no prazo de 120 dias após a provação da reforma;

– Conselhos Superiores dos Ministérios Públicos estaduais, que hoje são eleitos pela classe, passam a ser compostos por membros indicados diretamente pelo procurador-geral de Justiça do Estado.

Em sua nota técnica, a ANPR rebate ponto a ponto da proposta de reforma no Conselhão. Um dos argumentos levantados pela entidade é que o CNMP foi criado como um órgão interno voltado ao controle administrativo, financeiro e disciplinar da instituição e, por isso, deve ser composto majoritariamente por seus quadros.

A associação de procuradores também vê inconstitucionalidade na tentativa de alargar a função do colegiado para permitir uma espécie de revisão e até anulação de atos dos membros do MP, o que é visto como uma ‘invasão’ de suas atribuições funcionais. “O desenho institucional do CNMP não valida a competência para a revisão dos atos finalísticos praticados pelos membros do Ministério Público, no âmbito judicial ou extrajudicial, salvo quanto à sua repercussão na esfera disciplinar”, defende a entidade.

A atualização na forma de indicação dos conselheiros é outro ponto questionado na nota técnica. Isso porque, embora a maioria dos assentos continue reservada aos membros do Ministério Público, a escolha dos integrantes deixaria de ser feita majoritariamente pela classe. “O modelo proposto é inconstitucional, pois fere a autonomia institucional do Ministério Público”, segue a ANPR.

Reações

Internamente, a proposta foi lida como uma resposta da classe política a investigações contra a corrupção. Membros do MP temem que as mudanças em discussão abram caminho para a manipulação de processos administrativos contra o trabalho de promotores e procuradores.

Ao longo da última semana, houve diversas manifestações públicas da classe contra o texto. Uma frente de 38 subprocuradores-gerais da República lançou um manifesto em que classifica a PEC como um ‘golpe’ na autonomia da instituição. A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas) disse que, se aprovada, a proposta servirá como ‘instrumento de cerceio da liberdade e da independência funcional’.

Em entrevista ao Estadão, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, classificou a proposta como ‘um tiro de morte’ no MP. Ele afirmou que também está conversando com todos os deputados federais eleitos pelo Estado para tentar articular a rejeição da PEC.

O procurador-geral de Justiça do Rio, Luciano Mattos, também reagiu ao texto, que chamou de ‘grande retrocesso’ para a instituição.

Autoridade máxima do Ministério Público, o procurador-geral da República, Augusto Aras, disse que pediu ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para adiar a análise do texto enquanto tenta ganhar tempo para rediscutir as mudanças.

Em paralelo, lideranças da classe organizam manifestações em 18 capitais nesta semana, quando a Câmara dos Deputados deve votar a proposta.