A cúpula da CPI da Covid traçou uma estratégia jurídica para tentar levar o presidente Jair Bolsonaro a julgamento diretamente no Supremo Tribunal Federal. A ideia, tratada como “plano B”, é acionar a Corte caso o procurador-geral da República, Augusto Aras, decida engavetar as conclusões da CPI, deixando de processar Bolsonaro e aliados do governo com foro privilegiado.

O comando da comissão pretende usar a chamada ação penal subsidiária pública, ferramenta jurídica que permite à vítima ou ao seu representante legal propor a acusação em caso de inércia do órgão que deveria fazê-lo, em até 30 dias. O movimento, no entanto, é visto como pouco factível por alguns juristas e vem sendo questionado até mesmo por integrantes da CPI.

A dúvida é se um eventual arquivamento dos pedidos de indiciamento feitos pela CPI poderia ser classificado como “inércia” da Procuradoria-Geral da República. Não há acordo sobre o caminho a seguir nem no grupo de oposição da CPI, mas uma ala avalia que o tema deve ser levado para debate no Supremo.

Aras tem poder para dar ou não continuidade às conclusões da CPI, que também serão encaminhadas ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG). Cabe ao procurador-geral investigar e apresentar denúncias criminais contra autoridades com foro privilegiado. Caso a PGR decida acusar formalmente Bolsonaro – hipótese considerada remota -, ainda assim seria preciso autorização da Câmara para o processo seguir adiante. Somente depois desse trâmite a ação seria submetida a julgamento no Supremo.

Senadores da CPI vão levar a Aras, ainda hoje, o relatório final da comissão, que pede o indiciamento de Bolsonaro por nove condutas criminosas na pandemia. Caso Aras decida enterrar agora os pedidos da comissão, Bolsonaro e aliados só responderão a processos dependendo do resultado de uma série de discussões que serão travadas na Justiça.

DIVERGÊNCIAS

Para o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), um arquivamento será equivalente à inércia pela gravidade da situação. “O caminho seria sustentar uma nova tese perante o Supremo para permitir o manejo de ação penal privada, subsidiária da pública, nos casos em que o PGR se omite, incluídas as hipóteses de arquivamento manifestamente contrário ao interesse público”, afirmou Vieira.

O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) discordou. “A ação penal privada subsidiária da pública só tem incidência na hipótese de o PGR se omitir. Se ele optar pelo arquivamento, não tem cabimento.”

O “plano B” também encontra resistências no Supremo e até entre opositores de Aras. A tese dificilmente prosperará, no diagnóstico de ministros do STF, porque exigiria que a Corte recusasse ato de competência exclusiva do PGR.

Também não está claro quem teria a legitimidade para propor a ação. A CPI mantém conversas com associações de familiares de vítimas e com a OAB. “A ação penal subsidiária pressupõe que haja uma vítima específica. A vítima é a sociedade e quem a representa, em casos de ações penais públicas, é o próprio Ministério Público”, disse o advogado Cássio Rebouças de Moraes.

O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, tem orientado a CPI sobre o “plano B”. “Se, em 30 dias, Aras não fizer nada, é necessário que seja dada entrada em ação penal subsidiária. Quem tem legitimidade? Essa é uma discussão séria.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.