Um hotel cinco estrelas no Guarujá (SP) foi o cenário para o encontro de nomes da transição do governo eleito, de Luiz Inácio Lula da Silva, com a classe empresarial. Durante dois dias, aliados do petista tentaram justificar a cacofonia divergente no grupo, enquanto empresários e executivos buscavam maior proximidade com cotados para a Esplanada dos Ministérios.

Braço direito do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) e um dos coordenadores da equipe de transição, Floriano Pesaro usou termos empresariais para tentar explicar as dificuldades enfrentadas em Brasília: “Estamos trocando o CEO desta empresa chamada Brasil”, disse.

Emídio de Souza (PT-SP), deputado estadual eleito e amigo de Lula, emendou: “Floriano falou que é uma empresa constituída para funcionar 50 dias, o problema é que uma empresa, até funcionar redonda, demora um bocado”. Ruídos entre os integrantes têm atrapalhado a articulação da PEC da Transição.

A ideia, disse Emídio, é fazer o diagnóstico e traçar o plano para os primeiros cem dias de governo. “Não é uma babel, é a frente que o Brasil precisa neste momento.”

A escalação dos participantes incluiu o economista Gabriel Galípolo, o médico Roberto Kalil, os advogados Marco Aurélio Carvalho, Cristiano Zanin e Pierpaolo Bottini, a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), e o presidente do PSD, Gilberto Kassab.

Dividiram os corredores com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para evitar o que aconteceu em Nova York, quando ministros foram hostilizados por bolsonaristas, a calçada do hotel foi protegida por grades.

Guinada

Organizado pelo Esfera Brasil, think tank fundado pelo empresário João Camargo e atualmente comandado por sua filha, Camila, o evento mostrou a virada no posicionamento de parte da classe empresarial após a vitória de Lula. Considerado mais alinhado ao presidente Jair Bolsonaro, Camargo pediu, no palco, que empresários se juntem a ele para aplaudir os representantes do governo Lula. “A eleição foi democrática, ganhou honestamente, nós temos de apoiar.”

O novo momento da política nacional permitiu a realização de uma conferência na qual as críticas à Operação Lava Jato dominaram o debate. Coube ao ministro do STF Luís Roberto Barroso levantar um óbice ao tom crítico do painel. Depois de ouvir de Zanin, que defendeu Lula, que a investigação tornou o sistema jurídico brasileiro instável, o ministro rebateu: “Não há segurança jurídica num quadro de corrupção sistêmica e institucionalizada. Precisamos enfrentar a naturalização das coisas erradas que havia no Brasil”.

Outro ministro do STF presente, Ricardo Lewandowski chamou a atenção pelo tom político do discurso e por uma reunião reservada de quase 40 minutos com Alckmin. No pronunciamento público, defendeu a pacificação do País e se mostrou afinado com os principais pontos dos discursos de Lula. O vice, nome mais aguardado do evento, quase faltou. A decisão de não desistir da viagem ao Guarujá atendeu a um apelo de Lula.