O recém-lançado programa habitacional da cidade de São Paulo, chamado Pode Entrar, teve uma adesão elevada de construtoras e já tem sido apontado pela iniciativa privada como um bom exemplo a ser seguido pelo governo federal na reformulação do Minha Casa, Minha Vida (MCMV).

O edital do programa paulistano atraiu 56 construtoras, incluindo as maiores do ramo como MRV, Tenda, Direcional e Plano & Plano. Juntas, as empresas encaminharam propostas de 72 empreendimentos que totalizam 104 mil apartamentos, montante 2,5 vezes maior do que a oferta da prefeitura, de 40 mil.

O Pode Entrar é semelhante à antiga faixa 1 do MCMV no sentido de que ambos buscam atender famílias de renda mais baixa mediante a contratação de empreendimentos com subsídios dos cofres públicos.

No caso do MCMV, a faixa 1 foi extinta pelo governo Bolsonaro por haver acúmulo de obras paralisadas ou atrasadas em governos anteriores, além de falta de verba para novas contratações.

Agora, o governo Lula recriou a faixa 1 e reservou R$ 9,5 bilhões do orçamento para conclusão de obras antigas e novos projetos, mas os empresários desconfiam da viabilidade devido aos problemas enfrentados no passado.

No Pode Entrar, o foco são famílias com renda de até três salários mínimos (grupo 1) e de até seis salários mínimos (grupo 2). No grupo 1, a renda comprometida com o financiamento é de até 15%, sendo o restante do valor subsidiado. No grupo 2, o mutuário recebe da prefeitura uma carta de crédito.

Segurança

A explicação para o grande interesse das companhias está na segurança de que não vão faltar recursos do orçamento municipal para as obras e que haverá correção monetário no fluxo de pagamentos, disseram representantes do setor.

“Os riscos que víamos na faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida era não ter correção do valor da obra, e o risco de perda de orçamento a cada troca de governo. Isso está contemplado no Pode Entrar”, afirma o vice-presidente do Sindicato da Indústria da Construção do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP), Ronaldo Cury. “Se o governo federal quiser copiar vai ser muito legal”, sugere.

O Pode Entrar estabelece para as construtoras o pagamento de 15% do valor dos empreendimentos à vista e 85% até a entrega das moradias. A cada contratação, o dinheiro vai ser “carimbado” para o projeto em questão, evitando o risco de falta de verbas após o início da obra. “Eles empenham os recursos no orçamento e liberam de acordo com o andamento da obra. É uma garantia de que o dinheiro está lá e não vai faltar”, avalia Cury.

Outro aspecto importante, segundo ele, é que o edital já prevê a correção do fluxo de pagamentos para as construtoras com base na inflação. Isso é importante porque reduz o risco de prejuízo das empresas com uma disparada imprevista nos custos de materiais e serviços – assim como ocorreu nos dois últimos anos.

Abaixo de mercado

O secretário de habitação de São Paulo, João Farias, diz que o valor a ser pago pela prefeitura na contratação dos imóveis será de até R$ 210 mil, abaixo portanto do mercado, que costuma ficar perto de R$ 240 mil. “Tivemos algumas propostas de empresas que chegaram a R$ 180 mil. Na média, as contratações vão ficar perto de R$ 190 mil a R$ 200 mil”, conta.

“É um negócio interessante para a iniciativa privada porque a prefeitura compra o empreendimento inteiro. Isso exclui o risco de a empresa não vender os apartamentos e corta as despesas com marketing e corretagem. E o risco de a prefeitura não pagar é quase nulo”, argumenta Farias.

O secretário estima que as contratações começarão até a primeira quinzena de abril, após seleção dos projetos. Um segundo edital para contratação de mais 5 mil unidades será lançado nas próximas semanas. Neste caso, a prefeitura visará a compra de apartamentos já prontos.

O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, elogia o Pode Entrar e observa que é quase tão grande como a retomada da faixa 1 do Minha Casa Minha Vida. O programa paulistano tem orçamento de R$ 8 bilhões para contratar 40 mil unidades, enquanto o federal tem R$ 9,5 bilhões, que devem gerar cerca de 50 mil unidades.

“Lá trás, chegamos a produzir 400 mil unidades no ano”, lembra Martins, citando os primeiros anos do MCMV. “Então, tem de ter vontade política para viabilizar isso. É um segmento importante da população que concentra 90% do déficit habitacional”.

Denúncia

Em janeiro, a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) apresentou ao Ministério Público denúncia contra a Prefeitura de São Paulo por mudar a metodologia de definição do preço referencial mínimo dos imóveis do programa, o que elevou o custo de cada unidade.

De acordo com a Secretaria de Habitação, a definição do preço considerou uma média dos 96 distritos da cidade abarcados pelo programa, embora em algumas regiões os valores praticados pelo mercado sejam mais altos, o que demandou ajustes na metodologia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.