O Ministério de Minas e Energia (MME) pediu novamente à Eletrobras que avalie possibilidade de suspensão do Plano de Demissão Voluntária (PDV) da empresa, até que a pasta examine o “plano de ação para a prestação do serviço adequado e o plano de investimentos para os próximos anos, considerando a ausência da força de trabalho que pode ser desligada”. Esta é a segunda vez que o MME demanda informações sobre os planos de operação da empresa. O primeiro pedido ocorreu após o apagão este mês que deixou 25 estados e o Distrito Federal sem energia elétrica e em meio a denúncias de perseguição a empregados por se oporem à privatização da Eletrobras.

Em novo ofício encaminhado nessa quarta-feira (30) à Eletrobras, o ministério disse estar preocupado por não ter recebido, até o momento, o plano de investimentos futuros para a geração e transmissão de energia, nos próximos anos, e como a diminuição da força de trabalho afetará as atividades da empresa.

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“Sendo a União a maior acionista da empresa e o MME responsável por zelar pelo equilíbrio entre a oferta e demanda de energia elétrica no país é legítimo, racional e importante que esta Pasta tenha acesso a tais informações para que possa avaliar como a Eletrobras, maior empresa do segmento em operação no Brasil, está se preparando para preservar a manutenção e operação de seus ativos, pois eles são primordiais para a confiabilidade do suprimento de energia elétrica”, diz o ofício.

O MME ainda cita que o apagão no dia 15 de agosto, que retirou cerca de um terço da demanda de energia elétrica que estava sendo suprida no momento, “ocorreu em ativos operados pela Companhia Hidro Energética do São Francisco – CHESF, subsidiária da Eletrobras”.

Relatório preliminar apresentado pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) indicou que o desempenho abaixo do esperado das fontes de geração próximas à linha de transmissão Quixadá – Fortaleza II, de propriedade da Chesf, pode ter causado a queda de energia que afetou 29 milhões de pessoas no país.

A avaliação foi apresentada e discutida durante primeira reunião técnica para a elaboração do Relatório de Análise de Perturbação (RAP), que deverá ser concluído em cerca de 30 dias. Segundo o ONS, o sistema de proteção de uma usina também demorou mais tempo que o previsto para entrar em ação, gerando uma sobrecarga que resultou no evento.

A possibilidade de a redução no quadro de funcionários ter contribuído para o evento é defendida por trabalhadores do setor. O engenheiro eletricista Ikaro Chaves, ex-dirigente sindical e ex-conselheiro eleito do Conselho de Administração (Consad) da Eletronorte, uma subsidiária da empresa, disse à Agência Brasil que foram demitidos mais de 2,4 mil trabalhadores, desde o final do ano passado até agora.

Na avaliação do engenheiro, essa enxurrada de demissões foi acentuada com a privatização da Eletrobras e levou outros trabalhadores a serem “compelidos” a aderir ao PDV.

“Muitos trabalhadores, sabendo que existe uma possibilidade muito grande de serem demitidos, acabaram que muitos deles estão sendo compelidos a aderir ao PDV”, disse Chaves à Agência Brasil.

Logo após o apagão, o MME encaminhou, no dia 20 de julho, último dia de adesão ao PDV, um ofício à empresa, solicitando que ela avaliasse a suspensão do plano, mas não obteve retorno. Chaves disse que a queda drástica no número de empregados tem efeito na confiabilidade da operação da empresa, com o sobrecarga das equipes de campo. Segundo o engenheiro, a meta do Grupo Eletrobras é demitir cerca de 1,5 mil empregados, o que representa aproximadamente 20% dos cerca de 8 mil.

“É algo que vimos alertando há muito tempo. A Eletrobras teve uma redução drástica do seu quadro nos últimos anos. Em 2016, o grupo Eletrobras tinha 26 mil empregados, hoje tem pouco mais de 8 mil”, disse. “É preciso haver um processo de transferência de conhecimento, pelo menos. Você não pode, em uma empresa que trata de um setor essencial e estratégico como o setor elétrico, substituir trabalhadores experientes que conhecem os equipamentos, os processos da empresa, por trabalhadores novos que não conhecem esses equipamentos e os processo da empresa. Esse processo não aconteceu e a gente tem alertado, há muito tempo, que essas demissões comprometem a segurança do setor elétrico”, ponderou.

O engenheiro, que entrou no Grupo Eletrobras em 2007, chegou a responder a um processo de demissão por justa causa por seus posicionamentos críticos à privatização da companhia, ocorrida em 2022, durante o governo Jair Bolsonaro. Após pressão de trabalhadores, sindicalistas, políticos, a empresa retrocedeu no processo, mas, segundo Chaves, deixou claro que iria demiti-lo de qualquer maneira.

“Após grande mobilização, a empresa aceitou suspender o processo de demissão por justa causa, mas deixou claro que iria me demitir de qualquer jeito. Diante disso eu não tive outra alternativa a não ser aderir ao PDV e fui desligado no último dia 23. Aliás a empresa havia feito um cronograma de que a primeira turma a ser desligada seria desligada hoje, 31, mas eu fui desligado logo que retornei de férias. Acho que fui o único empregado a ser desligado antes do prazo”, relatou.

A Eletrobras foi contatada pela reportagem, mas até o momento não retornou.