A crise de armazenagem no Brasil não é recente, mas tem se intensificado nos últimos anos, impactando de forma direta a competitividade do agronegócio. Com um déficit de mais de 100 milhões de toneladas, o País enfrenta dificuldades em armazenar grãos como soja e milho, o que gera perdas bilionárias para os produtores e exportadores, que muitas vezes precisam escoar a safra a qualquer preço ou deixar os grãos no tempo, correndo risco de infestação de fungos e pragas. Em um mercado cada vez mais competitivo, a falta de infraestrutura adequada tem resultado em prêmios negativos para exportação, uma realidade inédita nos últimos dois anos. A ineficiência do sistema logístico de armazenagem foi estimada em perdas de R$ 41,4 bilhões entre 2023 e 2024, de acordo com um estudo encomendado pela Kepler Weber, uma das principais fabricantes de silos do Brasil.

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Prestes a completar 100 anos, a Kepler Weber é uma referência quando se fala em soluções de pós-colheita no Brasil e na América Latina.
● A empresa, que atua com foco em beneficiar e armazenar grãos, além de movimentar granéis nos portos, tem resistido à crise.
● Enquanto grandes empresas do setor agrícola enfrentam dificuldades, a Kepler segue com suas fábricas a pleno vapor, projetando mais um ano robusto em 2024.

“Estamos com a fábrica cheia, desacelerando apenas por uma questão de ajustes, mas é o sétimo ano seguido de excelentes resultados”, destacou Bernardo Nogueira, CEO da companhia.

R$ 708 milhões de receita líquida nos seis primeiros meses de 2024, um aumento de 17,2% na comparação com o mesmo período de 2023

Na liderança da Kepler Weber desde 2021, o executivo também traça um panorama das mudanças enfrentadas pela empresa ao longo de quase um século. Segundo ele, a companhia vive hoje sua terceira fase, marcada por uma gestão mais profissional, focada na expansão e na eficiência. “Nos últimos oito anos, passamos por um processo de manufatura profissional, com modelo Toyota e sistema SAP, além de uma gestão que olha para novos mercados e para a resiliência necessária para estar em diferentes cadeias do agronegócio.”

Além da venda de equipamentos de estocagem, a empresa expande
suas operações para mercados relacionados ao agronegócio, como logística e fluxo de grãos para escoamento, além de serviços de digitalização no setor pós-colheita (Crédito:Divulgação)

 

A história da empresa é um exemplo de adaptação e inovação.
● Fundada em 1925, a companhia passou por períodos de dificuldade, como na década de 1970, quando houve a entrada de bancos no controle da companhia.
● Com o tempo, no entanto, a Kepler se consolidou como líder em seu segmento e hoje conta com fábricas em Mato Grosso do Sul e no Rio Grande do Sul, que somam 88 mil metros quadrados de área.
● Recentemente, a empresa assinou um contrato de financiamento de R$ 150 milhões com a International Finance Corporation (IFC), do Grupo Banco Mundial, para expandir e modernizar suas unidades.

O déficit de armazenagem no Brasil é uma questão que impacta além dos agricultores e alcança toda a cadeia produtiva. A falta de capacidade estática pressiona os preços no mercado de commodities, especialmente em momentos de safras maiores. “O agricultor fica sem poder de decisão, sem flexibilidade para negociar o melhor momento para vender sua produção”, explica o CEO. A empresa, que já implantou projetos em mais de 50 países, busca mitigar esse cenário com soluções que garantam maior eficiência e segurança na armazenagem das produções.

estudo encomendado pela Kepler Weber apontou que o maior prejuízo acumulado nos últimos dois anos foi o do milho, estimado em R$ 21,2 bilhões. O prêmio negativo, que afeta diretamente a rentabilidade das exportações, foi registrado entre maio e setembro de 2023, e em 2024, o período crítico se antecipou, começando em abril. Já no caso da soja, as perdas somam R$ 20,1 bilhões, com o impacto sendo mais severo entre março e julho do ano passado, e entre janeiro e maio deste ano.

R$ 1,8 bilhão
é o valor atual de mercado da empresa pela cotação da ação em 30 de setembro

Para enfrentar o déficit de armazenagem, o investimento em infraestrutura é visto como uma solução estratégica. A Kepler Weber tem se destacado com suas inovações tecnológicas, incluindo o KVMax, um secador que consome menos energia e oferece economia significativa para os produtores. Além disso, a empresa investe em digitalização e conectividade no setor de pós-colheita, buscando elevar o nível da tecnologia na armazenagem de grãos. “Estamos promovendo uma evolução, porque o uso de tecnologia nesse setor ainda está praticamente nos anos 90”, diz o executivo.

A digitalização não está restrita aos equipamentos, mas também ao treinamento dos trabalhadores. A empresa lançou o KeplerFlix, uma plataforma de treinamentos on-line, que permite que operadores de diversas regiões do Brasil possam se capacitar remotamente. “Essa iniciativa visa garantir a segurança na operação dos nossos equipamentos, sem a necessidade de deslocamento”, explicou o CEO.

2024 vai ser o maior ano em volume de vendas dos últimos nove anos

Outra área de atuação da Kepler Weber é a prevenção de acidentes com silos durante períodos de alagamento. O Rio Grande do Sul, por exemplo, conta com quase 5 mil unidades de beneficiamento e armazenagem de grãos, muitas das quais podem estar em risco em caso de enchentes. O acúmulo de água nos silos tende a gerar gases inflamáveis, que, ao entrar em contato com faíscas, podem provocar explosões. Para evitar essas tragédias, a Kepler oferece, por 60 dias, vistorias gratuitas para silos afetados pelos alagamentos. “Estamos reforçando nossas equipes para garantir o atendimento aos agricultores que foram impactados”, afirma Nogueira.

A visão da Kepler Weber, segundo seu executivo chefe, vai além da simples comercialização de equipamentos de armazenagem. A empresa está expandindo suas operações para mercados relacionados, como a logística e o fluxo de grãos para escoamento. Com a aquisição da Procer, empresa líder em digitalização no setor de pós-colheita, a Kepler amplia seu escopo de atuação. “Saímos de um mercado de venda de equipamentos de R$ 7 bilhões para um mercado de R$ 1 trilhão, que é toda a cadeia de soja e milho”, afirma, ressaltando as oportunidades que se abrem para a companhia.

Apesar da crise de armazenagem, o agronegócio brasileiro tem se mostrado resiliente. Em 2022, o setor viveu um período de super rentabilidade, com um crescimento histórico na produção de grãos, especialmente soja. Esse “pico de tempestade perfeita”, como definiu Nogueira, foi resultado de uma combinação de fatores, como problemas climáticos na Argentina e a alta demanda global por alimentos. O Brasil se consolidou como um protagonista na produção de alimentos, e a Kepler Weber tem sido uma parceira estratégica nesse processo.

(Divulgação)

“Sempre ouvi que o Brasil era competitivo só da porteira para dentro, isso agora é passado, somos competitivos até o destino final”
Bernardo Nogueira, CEO da Kepler Weber

Olhando para o futuro, a empresa se prepara para seu centenário com otimismo. “Estamos entrando numa fase em que percebemos que podemos mais. Planejamos robustamente e temos visibilidade dos trimestres à frente para fazer os ajustes necessários”, acrescenta Nogueira. A história da Kepler Weber reflete a evolução do próprio agronegócio brasileiro com desafios, mas também com capacidade de adaptação e inovação, onde a armazenagem desempenha um papel de relevância no sucesso de toda a cadeia produtiva.