Ao lado da banana e da laranja, a maçã está entre as três frutas mais consumidas do Brasil. Da produção anual de 1 milhão de toneladas, 90% é consumida internamente. O restante é destinado processamento na indústria ou exportação.

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Com o consumo nacional aproximado de 900 mil toneladas de maçã fresca anualmente, ou 4,5 quilos por habitante, a produção interna costuma ser suficiente para esse consumo, mas a safra 24/25 fechou exatamente por volta de 850-900 mil toneladas, segundo o Cepea (Centro de Estudos Avançados de Economia Aplicada.

Contudo, seguidas quebras de safra nos últimos anos, causadas por instabilidades climáticas – como a falta do frio ideal – levaram ao aumento das importações.

A maçã precisa de um período de frio no inverno para que a planta “descanse” e depois consiga brotar, florescer e dar frutos com qualidade. Sem um inverno regular, a produtividade cai, e muito.

Para o bom desenvolvimento da maçã, são necessárias mais de 600 horas por ano com temperaturas abaixo de 7°C, além disso, o clima precisa ser constante, sem a ocorrência de “veranicos”, como nos últimos 2 anos.

Na safra 23/24 a produção brasileira de maçã despencou de 1.057.35 toneladas em 22/23 para aproximadamente 830 mil toneladas.

Com isso, em 2024, a fruta foi a mais importada do Brasil, aproximadamente 200 mil toneladas que chegaram do Chile, da Itália e da Argentina.

Na contramão, apesar da produção insuficiente para o mercado interno, o Brasil também é um exportador de maçã. Em 2024 foram aproximadamente 10 mil toneladas que tiveram a Índia como maior comprador. Isso acontece porque exportar pode ser mais lucrativo em certas épocas do ano, já que no mercado externo a maçã brasileira encontra preços melhores do que no interno.

Dados: ABPM (Crédito: Ismael Jales)

Setor projeta recuperação

Segundo Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM), em 2026, a expectativa é alcançar 1,1 milhão de toneladas, o que estaria dentro da média histórica.

Celso Zancan, diretor de Logística e Mercado Externo da ABPM, diz que tudo depende do clima que, ao que parece, “está mais favorável”.

“Neste ano, o inverno foi bom, é um dos melhores invernos dos últimos 6, 7 anos, um inverno regular, olhando a planta no campo, ela vai começar a brotar agora. Em termos de invernos, temos potencial, não que a gente vá ter uma super safra, mas vamos voltar aos patamares normais”, explica Zancan.

A produção de maçã no Brasil está concentrada na região sul do país, que nos últimos três anos sofreu com excesso de chuvas e insuficiência de frio, o que prejudicou significativamente as macieiras.

Os estados de Santa Catarina (50,1%), Rio Grande do Sul (46,8%) e Paraná (2,2%) concentraram 98,4% da colheita nacional.

Zancan também é diretor da Rasip Agro, uma das três maiores empresas produtoras de maçãs do país, com participação de 5% a 8% da produção nacional.

Maçã (Crédito/ Divulgação Rasip)

A empresa pertence ao grupo gaúcho RAR Agro Indústria, que se divide em duas frentes de negócios: Rasip Agro, que concentra a produção agrícola, como maçãs, uvas, grãos, leite e azeitonas; e a RAR Gastronomia, que reúne os lácteos, charcutaria (preparo para conservação de carnes), azeites, vinagres e vinhos.

Segundo Zancan, a empresa tem uma produção anual que gira em torno de 70 mil toneladas de maçã e o setor de fruticultura chega a faturar até R$ 250 milhões anuais, com a maçã sendo o carro chefe.

Com a projeção de uma safra maior em 2026, produtores da fruta como Mariozan Correa, que possui um pomar de 16 hectares em São Joaquim (SC), estão mais tranquilos do que nos últimos anos.

“A realidade é que você está preparado para uma ou duas safras de frustração. Mais do que isso, você não está. Então, eu não acredito que tenha gente preparada que consiga bancar mais do que duas safras”, conta Correa. 

O clima mais quente e menos regular como nos últimos anos acarreta no aparecimento das pragas e doenças como o ‘cancro europeu’, doença que pode “matar” macieiras inteiras, exigindo que sejam cortadas e incineradas.

Agora, o produtor espera diminuir o custo com aplicações de defensivos e tentar ampliar uma margem que tem sido apertada.

Produção de maçãs da Rasip (Crédito: Divulgação)

O preço das aplicações varia de acordo com a ocasião, mas nestes casos podem custar de 3 a 8 mil reais. Na produção de Correa a média é de 35 “banhos”, que o produtor espera reduzir para 30.

“É o que a gente espera. Não quer dizer que isso seja efetivado. Porque depende do clima, depende de uma série de coisas no que vai transcorrer pra frente. Mas, de uma maneira geral, a gente espera uma redução em torno de 10% nos custos”, conclui.

São Joaquim (SC), onde o pomicultor tem produção, é considerada a capital nacional da maçã. Localizada próxima à divisa com o Rio Grande do Sul, na serra catarinense, com verões frescos e baixas temperaturas no inverno, a cidade tem um clima propício para o cultivo da maçã.

O município é responsável por 35% da produção e da área plantada de maçã no Brasil. A população estimada do município é de pouco mais de 27 mil habitantes.

Cidade de São Joaquim (SC) Foto: Epagri

Diferentemente do Rio Grande do Sul, que conta com maiores produtores em escala, em Santa Catarina a força da produção é concentrada em pequenos agricultores.

Os invernos por lá costumam ser mais intensos do que na média do país, o que faz bem para a fruta. São Joaquim é um dos únicos lugares no Brasil em que já ocorreram precipitações de neve.

O inverno mais forte de São Joaquim possibilita que as macieiras tenham 900 horas de frio por ano, com temperaturas inferiores a 7°C.

Conservação pós-colheita é a grande vantagem da maçã

Apesar da produção se estabelecer apenas na região Sul, a fruta pode ser encontrada nas prateleiras dos hortifrútis de todos os estados do Brasil. Segundo Thiago Oliveira, economista da Ceagesp, isso ocorre pois a maçã tem uma grande resistência pós-colheita.

“A safra e colheita corre nos meses iniciais do ano, depois as maçãs são armazenadas e distribuídas ao longo do ano até chegar numa nova safra. Então importamos também para suprir a demanda interna da sazonalidade. A maçã tem uma boa vida pós-colheita, o que ajuda no aumento do consumo dada a versatilidade de poder carregar a fruta nas lancheiras e bolsas”, explica. 

Celso Zancan, da ABMP, explicou que essa longa vida pós-colheita é uma das maiores vantagens da fruta em relação às concorrentes, como as frutas de caroço como pêssego e ameixa, que costumam ser armazenadas por, no máximo, duas a três semanas.

“As duas variedades que nós trabalhamos aqui (gala e fugi) são variedades que conservam 10, 11 meses. Mas tem que ter uma fruta equilibrada no campo, com a coleta no momento correto e um bom sistema de câmeras frias”, aponta.

Para se ter uma ideia da logística da maçã no Brasil, Arthur Fonseca, que é comerciante na empresa Bella fruta no Ceasa de Recife (PE), busca o produto diretamente em Caxias do Sul, quase atravessando o país de ponta a ponta. São mais de 3,6 mil quilômetros de distância.

Distância de Caxias do Sul a Recife (Montagem: Ismael Jales/ IstoÉ Dinheiro)

“100% do que eu vendo aqui vem da região sul do Brasil, carrego nas nossas próprias carretas refrigeradas e, em média, demora 5 dias para fazer todo esse trajeto. Geralmente a carreta ‘sobe’, com maçã descarrega em Recife, vai até Petrolina, onde pega uva, para descer novamente, esse é o ciclo”, explicou Fonseca. 

Maçã no Brasil

As principais variedades de maçã produzidas no Brasil são fuji e gala, sendo elas responsáveis por cerca de 98% da produção nacional. Enquanto a produção da fuji é mais concentrada na região serrana de São Joaquim, a gala é mais forte na região de Vacaria (RS).

Até o fim dos anos 1970, o país dependia fortemente das importações: cerca de 95% das maçãs consumidas aqui vinham do exterior. Com investimentos em pesquisa para o desenvolvimento da fruta, o Brasil se tornou quase autossuficiente, entrando no ranking dos 10 maiores produtores da fruta no mundo.

*Estagiário sob supervisão