20/06/2020 - 7:12
Uma das regras do jornalismo pede que as informações principais sejam dadas logo de cara. Casados há 55 anos, Antonia Lima Teles e Antonio Nascimento Teles foram internados no mesmo dia com covid-19 em São Paulo. Pioraram e chegaram a ser entubados. O que acontecia com um se repetia com o outro. Na UTI, sofreram em leitos paralelos. Os dois são do grupo de risco: diabética, ela tem 80 anos; ele, 79. Após cerca de 15 dias, os dois melhoraram e venceram a doença juntos. Hoje, estão em casa. A vitória do casal é quase um abraço em meio ao distanciamento. Além disso, traz um convite para você seguir mais um pouquinho na leitura, além das informações principais.
Os dois chegaram ao Hospital Igesp, na Bela Vista, região central de São Paulo no dia 23 de maio com quadros muito parecidos: síndrome gripal há cinco dias. Os dois exames de tomografias sugeriam covid, o que depois foi confirmado. No dia 26, ela piorou e precisou de oxigênio. Foi para a UTI e acabou entubada. Os exames do seu Antonio foram piorando. O comprometimento dos pulmões aumentou. Ele foi para a UTI no dia 28 e acabou entubado. Os dois ficaram na mesma UTI e, por coincidência do processo de internação, acabaram em leitos paralelos, um ao lado do outro. Entubados e sem consciência, não sabiam um do estado do outro.
Foi dona Antonia que se recuperou primeiro. Ela foi extubada no dia 1.º. De novo, a história se repetia. Antonio saiu do tubo um dia depois. Antonia recebeu alta no dia 8; Antonio, no dia 12.
O aparelho de oxigênio no canto da sala verde clara, na casa em São Mateus, zona leste, é um sinal de que a recuperação continua. O equipamento só é necessário de vez em quando, em momento de falta de ar. Seu Antonio ainda reclama da tosse. Ali, eles têm duas “enfermeiras”: a filha Maria Claudia Teles, a caçula de seis irmãos, e a nora Edinalva Teles.
As lembranças da internação são esparsas – é melhor assim. Eles dizem que sentiam sede. Enfermeiras contam que um perguntava do outro, quando começaram a melhorar. A palavra que mais usam para resumir o período é “vitória”.
Fazia uma semana que o Estadão queria conhecer o casal. Seu Antonio saiu do hospital exatamente no Dia dos Namorados. Seria uma história linda para a data. Afinal, eles são namorados há quase seis décadas. Não deu para falar com eles na semana passada. Estavam debilitados e cansados.
O clima de namoro entre os octogenários não desapareceu em uma semana. Pelo contrário. Na hora da foto, o marido espontaneamente segura a mão da mulher, procura um chamego e diz: “Estou namorando.” Existe carinho e contato, independentemente dos cliques. Amor. “A gente precisa ouvir o outro e tentar entender. Acreditar que as dificuldades vão passar. Se um fica nervoso, é melhor deixar para conversar outra hora”, diz ela, explicando como um casamento se sustenta desde 1965.
Os dois são baianos e migraram atrás de uma vida melhor. O casal se conheceu na Igreja de Santo Antônio, no Ipiranga, zona sul de São Paulo. Era um domingo chuvoso. Durante o ritual, só olhares. Na saída, Antonio ofereceu uma carona no guarda-chuva. A princípio, ela disse que não tinha problema em se molhar. Depois, aceitou. “Faz 55 anos que estou debaixo desse guarda-chuva.”