11/08/2020 - 13:14
A comparação feita pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, de relatórios de inteligência envolvendo grandes eventos com o monitoramento de opositores é contestada por ex-ministros da pasta e especialistas na área. Na semana passada, Mendonça citou documentos relacionados à Copa do Mundo e à Olimpíada para exemplificar que o levantamento de informações sobre 579 servidores públicos ligados a grupos antifascistas é algo rotineiro na pasta.
Os exemplos foram citados por Mendonça na reunião sigiloso com parlamentares em que admitiu a produção do documento pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi). A existência do “dossiê”, focado em policiais e professores, foi revelada no fim do mês passado pelo portal UOL.
Para o ex-ministro da Segurança Pública Raul Jungmann, que chefiou a pasta no governo Michel Temer, é preciso esclarecer qual é a fundamentação do monitoramento dos antifascistas, o objetivo, o método utilizado para obter informações e para quem foi enviado.
“Não era monitoramento para segurança. Você tinha uma atividade de inteligência focada em adversários políticos, em tese, do governo. Para quê? Para informar-se e manter informado ou para retaliação? Evidentemente que configura infração”, disse Jungmann.
Outro ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo afirmou desconhecer a informação citada por Mendonça na audiência com parlamentares de que a pasta produziu relatório de inteligência sobre o Movimento Brasil Livre (MBL) durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Na ocasião, um dos alvos, segundo Mendonça, foi Kim Kataguiri (DEM-SP), um dos líderes do grupo e hoje deputado federal.
“Se estou fazendo acompanhamento de pessoas para segurança pública, eu não vejo problema. Se são informações para evitar colocar em risco a operação, não tem problema. Agora, se eu pego policiais e pessoas ligadas à área de segurança pública, só porque não pensam igual ao governo, o que é isso? Me parece que está se usando pretexto para confundir”, disse Cardozo.
Para especialistas, mesmo que haja relatórios produzidos em governos anteriores, isso não justifica eventual monitoramento de adversários políticos da gestão atual.
“Imaginando que tenha acontecido, naquele caso, você estava lidando com possível incitação à violência, enquanto agora você está atrás de gente que não está incitando violência, pedindo queda do regime, mas simplesmente fazendo oposição ao governo”, afirmou o cientista político e analista criminal Guaracy Mingardi.
Para o professor da UFRGS Marco Cepik, especializado na área de inteligência, há a possibilidade de a ação da Seopi ser enquadrada como crime de responsabilidade ou até abuso de autoridade, pois são “alvos ilegítimos” por “motivos fúteis, as suas opiniões”.
Mendonça nega perseguição de opositores e abriu uma sindicância para verificar se houve alguma irregularidade. Em seu primeiro ato após dar início ao processo interno, demitiu o responsável pela área de Inteligência, o coronel Gilson Libório. A medida, segundo o ministro, foi uma forma de dar garantir a “imparcialidade na apuração dos fatos”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.