02/09/2020 - 13:14
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu trancar parte da ação penal contra o ex-conselheiro do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) Leonardo Manzan, investigado na Operação Zelotes – apuração sobre esquema de corrupção no julgamento de recursos administrativos que envolviam empresas e pessoas físicas acusadas de sonegação fiscal e previdenciária.
Para o colegiado, a denúncia do Ministério Público contra Manzan, em relação ao período entre 2009 e 2012, apresentou as condutas supostamente ilícitas do conselheiro de maneira “abstrata e genérica”, prejudicando o exercício do contraditório e da ampla defesa.
De acordo com as investigações da Zelotes, o grupo criminoso manipulava o julgamento de processos administrativos no Tribunal da Receita em troca de propina. Entre os integrantes do grupo, estariam sócios de empresas de consultoria e membros do conselho.
Em um dos processos decorrentes da operação, a denúncia apontou suposta participação de Manzan no favorecimento de empresa que não havia obtido sucesso em procedimento administrativo, e que teria contratado o grupo criminoso para reverter a situação. Após novo julgamento – que contou com a participação do conselheiro investigado -, a empresa teria obtido o direito de ser ressarcida pela União em mais de R$ 37 milhões. Manzan foi denunciado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. As informações foram divulgadas pelo STJ.
Ao analisar um primeiro pedido de habeas corpus, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) reconheceu que, em relação ao chamado “quarto período” disposto na acusação (2009 a 2012), houve apenas “afirmação genérica” de que o conselheiro teria recebido vantagem indevida, sem a descrição de qual ela seria, forma de recebimento ou valor. No entanto, o Tribunal entendeu que, em razão de ainda existirem indícios da obtenção de propina nos autos, seria necessário esclarecer melhor os fatos. Nessa linha, negou o trancamento da ação.
No entanto, o ministro Nefi Cordeiro, relator do novo habeas no STJ, considerou que o Ministério Público, ao descrever o fato criminoso, não indicou precisamente qual seria a vantagem ilícita recebida pelo conselheiro – “o que não é admissível, pois não há responsabilidade penal objetiva”.
Cordeiro destacou que toda denúncia precisa preencher os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, devendo conter a exposição do fato criminoso, a qualificação do acusado ou os esclarecimentos para que se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol de testemunhas.
“As exigências contidas no artigo 41 do CPP foram estabelecidas para garantia e efetividade do princípio da ampla defesa, pois é imperioso que a peça acusatória contenha de forma especificada a imputação, ou seja, a exposição com rigor de detalhes dos fatos criminosos que tenham sido praticados, de forma a permitir ao acusado condições de formular sua defesa no limite da acusação penal que lhe é imposta”, explicou o ministro.
Lavagem de dinheiro
Em relação à suposta ocultação de valores transferidos aos investigados, o relator também considerou a denúncia “genérica”, sem que tenha havido a individualização da conduta do conselheiro na apontada dissimulação.
“De fato, verifica-se que a inicial acusatória mostra-se genérica e imprecisa, porquanto não foram demonstrados os atos do paciente capazes de se amoldarem aos tipos penais previstos no artigo 317, parágrafo 1º, do Código Penal (corrupção passiva) e no artigo 1º da Lei 9.613/1998 (lavagem de dinheiro), notadamente porque não mencionada qual vantagem indevida ou promessa de tal vantagem teria sido solicitada ou recebida, tampouco como e quando a percepção ilícita teria ocorrido e se houve pagamento indevido”, concluiu o ministro.