03/09/2020 - 7:03
Um estudo de meta-análise, que reuniu evidências de sete ensaios clínicos realizados em 12 países, incluindo o Brasil, confirmou que medicamentos corticoides reduzem a mortalidade por covid em pacientes com quadros críticos da doença. As novas evidências fizeram a Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgar novas diretrizes para médicos e gestores recomendando o uso dessa classe de remédios para pacientes com formas graves da infecção. Entre os corticoides recomendados estão drogas como a dexametasona e a hidrocortisona.
Os corticoides são anti-inflamatórios de baixo custo usados há décadas principalmente no tratamento de doenças inflamatórias, respiratórias e alérgicas, como asma e artrite. A meta-análise, publicada ontem no prestigioso periódico científico Journal of the American Medical Association (Jama), avaliou a utilização de três remédios dessa classe: dexametasona, hidrocortisona e metilprednisolona.
Os estudos analisados tiveram a participação de 1,7 mil pacientes. Todos os ensaios clínicos foram randomizados, ou seja, os participantes de cada grupo (o que recebeu o medicamento e o grupo controle) foram escolhidos por sorteio.
No grupo que tomou um dos corticoides, 32% dos pacientes morreram após o período de seguimento de 28 dias. Já entre os pacientes que só receberam o suporte clínico padrão, a mortalidade no período foi de 40%, o que equivale a um risco 20% menor de óbito entre os doentes que receberam a medicação.
A pesquisa também aponta que os corticoides se mostraram seguros, sem risco aumentado de efeitos colaterais graves. “Os eventos adversos variaram entre os estudos, mas não houve sugestão de que o risco de eventos adversos graves fosse maior em pacientes tratados com corticosteroides, exceto para os dois menores estudos, nos quais o número total de eventos adversos graves foi 1 e 3”, destaca o artigo publicado.
A meta-análise foi realizada por um grupo de trabalho formado pela OMS para dar rápida resposta sobre possíveis tratamentos para covid. O grupo conta com cientistas de todo o mundo, incluindo o Brasil.
Entre os estudos que foram considerados nessa meta-análise está uma pesquisa coordenada pelos principais hospitais privados brasileiros que mostrou que a dexametasona foi capaz de reduzir o tempo de entubação entre doentes graves.
Os pesquisadores brasileiros alertam que o benefício e a segurança dos corticoides são válidos só para doentes graves com covid, que precisam de suporte respiratório. Para quadros leves ou iniciais, o medicamento não tem benefício comprovado e pode até piorar a condição.
“O corticoide não vai curar a doença ou combater o vírus, ele vai modular a resposta inflamatória do organismo para combater uma reação exagerada. Só que essa resposta, no início da infecção, é o que combate o vírus. Ela só se torna prejudicial se fica desenfreada. Se você a bloqueia logo no início, pode aumentar o tempo dos sintomas”, explica Luciano Cesar Pontes Azevedo, superintendente de ensino no Hospital Sírio-Libanês, integrante do comitê executivo da Coalizão Covid-19 Brasil e um dos autores do estudo brasileiro. Por causa desse e de outros riscos, os corticoides só devem ser usados com prescrição médica.
Histórico
As novas evidências sobre os corticoides reafirmam os achados do estudo Recovery, divulgados pela Universidade de Oxford (Reino Unido) em junho. A pesquisa apontou que a dexametasona mostrou-se capaz de reduzir em um terço o número de mortes entre pacientes entubados.
De acordo com Azevedo, desde o estudo britânico, a dexametasona já vinha sendo usada na prática em hospitais brasileiros no tratamento de casos graves de covid. As novas evidências, diz ele, ajudam os médicos a ter mais segurança sobre quando e com qual paciente prescrever a medicação. “Os novos estudos são importantes para comprovar que só quem se beneficia é o paciente mais grave”, diz ele.
Questionado sobre a inclusão desse tratamento em seus protocolos, o Ministério da Saúde afirmou que “as orientações do governo federal são atualizadas conforme o surgimento de novas evidências científicas”, mas não detalhou se irá incorporar o uso de corticoides em seus documentos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.