O contraponto de uma supersafra mundial de soja, como a de 2015/2016, projetada em 317,3 milhões de toneladas está, invariavelmente, ligado ao valor que o grão pode alcançar. E, no mercado, a regra é clara: quanto maior a oferta, menor tende a ser o preço pago por ela. Para a próxima safra, é exatamente esse o cenário mundial mais provável da oleaginosa. Por isso, em dólares, os preços da commodity têm caído nos últimos tempos. Nos contratos para março de 2016, na Bolsa de Chicago, por exemplo, a saca de 60 quilos de soja chegou a ser cotada por US$ 20,52, no dia 21 do mês passado, valor 23,7% abaixo na comparação com maio de 2014. O quadro de queda não está relacionado somente à produção anual da safra, mas ao alto nível dos estoques de passagem de um ano para outro (carry-over, em inglês). “O crescimento da demanda por soja não conseguiu acompanhar o crescimento da safra”, diz o economista Lucilio Alves, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP). Por isso, a partir de agora, o poder de decisão de preços passa a estar mais fundamentado no volume de passagem dos estoques da oleaginosa. Alves acredita que essas reservas vão pressionar os valores até 2018. “Até lá, não vemos a cotação passando de US$ 21 por saca.”

A oferta mundial de soja vem em um movimento ascendente mais forte, nas duas últimas safras. Ela aumentou em 12%, na comparação das safras 2013/2014 e 2014/2015, ao passo que a demanda cresceu 5,6%. “A taxa de crescimento da demanda foi praticamente a metade do que foi a oferta”, diz Alves. Consequentemente, a grande virada dos estoques mundiais de soja aconteceu na passagem dessas safras, em função dos bons resultados de colheita, tanto no Hemisfério Norte como no Sul. O volume da demanda que anteriormente era de 63,4 milhões de toneladas, passou para 85,5 milhões, a maior alta de toda a história, de acordo com a mais recente estimativa mensal do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda, na sigla em inglês), realizada em maio. É também mais que o dobro do registrado na safra 2008/2009, época de preços recordes na Bolsa de Chicago. Em setembro daquele ano, o volume estocado era de 44 milhões de toneladas, o menor na comparação com os 12 anos anteriores. 


Maior oferta: Lucilio Alves, do Cepea, diz que enquanto a produção cresceu 12%, a demanda aumentou apenas a metade disso

Caso sejam confirmadas as projeções do Usda para esta safra, o estoque de passagem mundial desta safra para a de 2015/2016, estimado em 96,2 milhões de toneladas, corresponderá a 31,6% do consumo, calculado em 304,3 milhões de toneladas. “Esse é o ponto que acabará pressionando as cotações da soja no próximo período”, diz Alves. O fechamento anual do relatório da Usda é baseado no estoque do dia 1º de setembro de cada ano, quando se inicia o ano comercial americano, levando em consideração o que está guardado nos armazéns do próprio país, da China, Brasil e Argentina.


Dólar: para Rafael Ribeiro, da Scot Consultoria, o Brasil se beneficou da desvalorização cambial

Para o zootecnista Rafael Ribeiro, analista de grãos da Scot Consultoria, de Bebedouro (SP), o ritmo de plantio mais acelerado nos Estados Unidos, nos últimos cinco anos, e as condições de clima mais favoráveis para esta safra é que sustentam as especulações de um estoque de passagem mais elevado. “Isso, mesmo com a próxima safra americana prometendo ser um pouco menor que a da temporada 2014/2015”, diz Ribeiro. Pelas informações relativas a maio, fornecidas pelo Usda, a colheita projetada para a safra 2015/2016 é de 104,8 milhões de toneladas, o que representaria uma queda de 3%, ante os 108 milhões da safra anterior. “A partir de agora, os agentes de mercado devem fixar os olhos no desenrolar dessa safra americana”, diz Ribeiro.

Mesmo assim, no Brasil, a despeito da perspectiva de valores mais baixos, na comparação com outras commodities, como o milho, por exemplo, a lavoura da soja ainda é mais vantajosa. “Pelas contas, mesmo com os preços em queda, é ela que garante maior receita”, diz Alves. Outro fator importante é o dólar valorizado que tem feito a alegria dos produtores brasileiros e que, por enquanto, não há nenhuma previsão de desvalorização acentuada. “Se não fosse por isso, o cenário da soja no Brasil estaria semelhante ao do mercado internacional”, afirma Ribeiro.

(leia “O dólar salvou a lavoura” no site www.dinheirorural.com.br)