“Quero uma foto do pasto onde estão as bezerras precoces”, diz Carlos Alberto de Oliveira Filho, em mensagem de voz enviada pelo WhatsApp, às 5h30 da matina, do seu escritório em Vargem Grande (SP). Do outro lado da linha, a mil quilômetros de distância, na fazenda Santa Lavínia, em Santa Fé de Goiás (GO), seu funcionário fotografa a novilhada e envia a imagem a Oliveira Filho, proprietário do lugar. Aos 67 anos, o experiente fazendeiro faz uso da tecnologia para manter-se perto da sua produção. A diversidade de negócios – ele também trabalha com confinamento de bois e cultiva batata e grãos – não permite que esteja tão presente fisicamente em todos os lugares quanto gostaria. O jeito é recorrer às ferramentas digitais do mundo moderno. Ao receber a foto, Oliveira Filho avalia os animais, lembra do boletim meteorológico e do contrato de venda de bezerras que tem a cumprir. Em seguida, ele manda a resposta: “Mesmo com a estiagem, o capim voltou. Elas vão terminar no tempo certo. Pode manter por aí”.

Sem piscar Dono da Fazenda Santa Lavínia, Carlos de Oliveira Filho (ao lado) está sempre atento à produção dos seus bezerros (Crédito:Divulgação)

Oliveira Filho costuma dizer que faz esse trabalho com naturalidade, “como a rotina de uma dona de casa, que deixa tudo em ordem”. Sob o olhar atento do proprietário, a Santa Lavínia é uma fazenda de cria, com foco na produção de bezerros, que lucrou na última safra R$ 544 por hectare em pecuária. É um número impressionante. Para se ter ideia, a média do grupo de 420 fazendas que participam do benchmarking do Instituto Inttegra – a Santa Lavínia é uma delas –foi de R$ 28. “Seu desempenho foi quase vinte vezes maior do que a média”, destaca Antonio Chaker, coordenador do Instituto Inttegra.

Ele prevê que as fazendas competentes em gestão serão premiadas pelo mercado, neste ano, com a provável alta do bezerro. “Elas vão ganhar em dobro: pela eficiência e melhores preços.” O resultado de faturamento que surpreende deve-se a uma receita básica. “O segredo é gastar bem e buscar alternativas para maximizar a produção por hectare”, diz o zootecnista Marcel Moreira de Brito, consultor da Terra Desenvolvimento, com sede em Campo Grande (MS) e que acompanha a gestão da Santa Lavínia. Seguindo essas receitas, a fazenda de Oliveira Filho faturou, em 2018, R$ 3,4 milhões apenas com a produção de bezerros.

COMIDA À VONTADE Segundo Brito, a principal evidência de que a empresa gasta bem é a fatia que vai para nutrição e pastagem: 35% das despesas. O valor equivale a R$ 13,50 por cabeça ao mês, superando em quase 23% a média do que é gasto pelas fazendas de cria (R$ 11). Considerando o rebanho total de 9 mil cabeças (3,1 mil só de bezerros), são R$ 121,5 mil aplicados, por mês, na alimentação dos animais. “Na Santa Lavínia, comida não é problema”, destaca o zootecnista. Ele lembra que a fazenda conta com o auxílio da integração com agricultura pecuária e irrigação, permitindo que os animais se mantenham no pasto na seca, sem perder peso. Além disso, há um confinamento estratégico para as vacas, no período de maio a setembro. “Caso não comprovem nova prenhez, elas ficam confinadas, até o desmame do bezerro”, diz Brito.

A estratégia de tirar do pasto as fêmeas que não reconceberam tem como objetivo alcançar maior produção por hectare. São 9,5 arrobas por hectare ao ano, mais do que o dobro da média das fazendas cadastradas no Inttegra.

Como uma empresa que demite funcionários ineficientes, na Santa Lavínia as vacas que não estão prenhas cedem lugar no pasto para um animal produtivo, que gerará um bezerro no final da safra. A estratégia de descartar as fêmeas que não emprenham também vale para as vacas precoces, desafiadas a reproduzir aos 14 meses – cerca de 1 ano antes do usual.

ESTRATÉGIA CERTEIRA “Nosso planejamento é que, em até cinco anos, a reposição seja toda feita com vacas precoces”, afirma Fabiano Araújo, responsável pela reprodução na Santa Lavínia. Com essa estratégia, a fazenda também eliminará uma categoria que consome, mas não produz: as fêmeas de recria, novilhas que ficam na propriedade até atingir a idade de monta, o que pode ser de até 24 meses. A empresa também investe em inseminação artificial e no uso de touros de repasse comprovados por programas de melhoramento genético.

Com tantos resultados contundentes, a Santa Lavínia quebra o paradigma de que fazenda de cria é o patinho feio da pecuária, que geralmente têm rentabilidade bem menor, se comparada às atividades de recria e engorda.

E comprova que, independentemente do segmento, o que determina bons resultados é a gestão baseada em dados e liderança participativa. Mesmo que, de vez em quando, essa gestão ocorra no campo virtual, pelo WhatsApp, como faz Oliveira Filho, o proprietário da fazenda Santa Lavínia.

A métrica entra em campo

Divulgação

Considerando que o objetivo de uma fazenda de cria é a produção de bezerros e que eles são negociados pelo que valem na balança após o desmame, o criador deve estar focado em produzir mais carne com o menor número de vacas. Portanto, a nova métrica que mostra se o resultado está satisfatório é a produção de quilos de bezerro por vaca exposta – fêmea que entrou na estação de monta. “É o índice mais poderoso da cria”, afirma Antonio Chaker, do Inttegra. Segundo ele, ao focar nesse número, o pecuarista tem maior pressão nos controles de peso, fertilidade e mortalidade. Por outro lado, também alcança maior lucratividade. Chaker acredita que este será o índice que mais deve evoluir no segmento. Estima-se que, no Brasil, a média seja de 88 kg de bezerro por vaca exposta. Mas ele destaca que as fazendas lucrativas superam os 157 kg de bezerros desmamados por vaca exposta. “Há maior eficiência por animal, resultando em redução da área de cria, o que implica em diversificação de atividade ou ampliação do projeto”, explica Chaker. No caso da Santa Lavínia, os fatos comprovam a métrica. A fazenda fechou a safra passada com exatos 157 kg de bezerros desmamados por vaca exposta.