01/10/2011 - 0:00
Em 2004, uma grande comitiva de empresários de Mato Grosso visitou Buenos Aires levando um convite a produtores argentinos para cultivar soja no Estado em troca de incentivos fiscais. À frente da proposta estava o então governador, Blairo Maggi, um dos maiores produtores rurais do mundo, que buscava investidores para o campo matogrossense. Passados sete anos, a rota do investimento se inverteu, liderada justamente pelo Grupo André Maggi (Amaggi), da família de Blairo, hoje senador pelo Partido da República. A empresa expandirá seus negócios com o plantio de soja em solo argentino. De início, cultivará uma área arrendada de cinco mil hectares já para a safra de 2012 – a localização é mantida em sigilo – com a possibilidade de ampliá-la para 30 mil hectares num prazo de cinco anos. Se os resultados forem satisfatórios, a Amaggi alimenta planos ainda mais ambiciosos: um projeto de logística e a administração de um terminal portuário para embarque de soja e derivados.
A gigante mato-grossense
Ramos de atuação
• produção agrícola
(soja, algodão e milho)
• produção de sementes
• processamento e
comercialização de grãos
• fertilizantes
• administração portuária
• transporte fluvial
Países onde atua
• Brasil
• Holanda (trading)
• Noruega (processamento
de soja não transgênica)
• Argentina (trading e plantio)
O ingresso na Argentina faz parte do projeto de internacionalização do grupo, que começou a atuar no país vizinho com a abertura de um escritório em Buenos Aires, em 2010, e desde abril opera como trading para negociar soja no mercado local. A meta é comercializar 500 mil toneladas neste ano e atingir a marca de dois milhões de toneladas em 2015. Fincar raízes em solo argentino significa estar no terceiro maior produtor de soja do mundo. A safra 2011/2012 da oleaginosa é estimada em 43 milhões de toneladas. O governo tem a meta, considerada muito ambiciosa por alguns analistas, de ampliar a produção até 2020, para 80 milhões de toneladas. A Argentina tem terras para isso com a expansão da fronteira agrícola para o norte da província de Santa Fé, a noroeste de Buenos Aires, maior produtora nacional. “A Argentina é um concorrente, mas também é um parceiro da empresa”, disse Blairo Maggi à DINHEIRO RURAL . “As nossas atividades se complementam.”
Maggi classifica a etapa inicial do plantio de soja na Argentina como um “aprendizado”. A opção pela produção inicial em pequena escala tem o objetivo de aproximar o grupo dos produtores locais, visando a parcerias no futuro.
“Vamos conhecer um pouco como funciona o mercado de lá”, disse o senador. Também entram na equação, é claro, algumas vantagens competitivas do parceiro do Mercosul. Os custos de produção são inferiores aos do Brasil e a legislação ambiental é sensivelmente menos restritiva que a brasileira. A grande vantagem, porém, é o custo do frete, componente importante no preço final da soja. Se a safra do Mato Grosso precisa viajar dois mil quilômetros até o porto mais próximo para ser exportada, o de Santos, na Argentina as zonas produtoras ficam a cerca de 300 km do porto de Rosário, principal rota de escoamento da produção. “Estaremos do lado do porto”, diz Maggi.
VANTAGEM COMPETITIVA : porto de Rosário será a principal rota de escoamento
Com esse ambiente econômico e a perspectiva de que os preços da commodity se manterão em patamares elevados, pelo menos até o fim de 2012, o projeto da Amaggi pode evoluir para a consolidação da cadeia de produção da soja na Argentina, com um projeto de logística. No mercado brasileiro, o grupo atua desde a produção até o embarque no cais, com seu braço de administração portuária. Para Rafael Ribeiro, consultor de mercado da Scot Consultoria, de Bebedouro (SP), a operação na Argentina também abre as portas para a Amaggi atuar num ramo mais lucrativo da cultura da commodity. No Brasil, 75% da soja exportada – US$ 13,5 bilhões dos US$ 18 bilhões – é embarcada em estado bruto, um produto de menor valor agregado. “A Argentina tem a estratégia de a g r o n e g ó c i o s vender farelo e óleo, produtos semi-industrializados”, diz Ribeiro. Embora produzam o equivalente a apenas dois terços da produção brasileira de soja (49 milhões na safra 2010/2011 contra 75 milhões de toneladas), os argentinos obtêm uma receita 50% maior nas exportações, ou seja, US$ 27 bilhões. A diferença esmagadora (sem trocadilho) fica por conta do maior valor agregado da exportação argentina.
Números globais
Faturamento do grupo
US$ 3 bilhões (2010)
Produção no Brasil
400 mil toneladas de soja (2010)
Operações na Europa
2 milhões de toneladas de grãos (2010)
Exportações
US$ 944 milhões (até agosto/2011)
US$ 1,06 bilhão em 2010
SEM VALOR AGRAGADO: no Brasil, 75% da soja exportada é embarcada em estado bruto
A internacionalização da Amaggi foi iniciada em 2008 com a abertura de um escritório em Roterdã, na Holanda, para onde vai 5% da soja brasileira (68% é vendida para a China). “É inevitável que uma empresa do porte da Amaggi busque mercados fora do Brasil”, diz Fernando Murato Jr., analista de mercado da AG Rural, de Curitiba (PR). “É quase necessário para a sobrevivência da empresa.” A Amaggi tem apresentado bons números em sua incursão internacional. O braço holandês do grupo movimentou dois milhões de toneladas de grãos em 2010. Desde 2009, a empresa controla a processadora norueguesa Denofa, que atende a países com restrições de entrada à soja transgênica. A hermana Argentina é a nova fronteira.