A mais severa seca dos últimos 50 anos causou perdas históricas à lavoura de milho dos Estados Unidos, nesta safra. A perda com a estiagem é calculada em 100 milhões de toneladas de grãos, ou um terço da produção. No Brasil, uma nova temporada de forte calor e falta de chuva no Rio Grande do Sul resultou na terceira quebra em cinco safras, com perdas nas culturas de soja e de trigo.

No Nordeste, a pior seca desde a década de 1970 desencadeou um novo ciclo de migração de agricultores, que não conseguem tirar o sustento da terra. É esse quadro, de produtores à mercê do clima, que tem estimulado os cientistas a desenvolver culturas transgênicas capazes de resistir a fenômenos climáticos que trazem incalculáveis prejuízos à agricultura. É o que acontece num canto arborizado de Brasília, a poucos metros do Lago Paranoá, onde um grupo de pesquisadores da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen) começa a colher os primeiros avanços com plantas mais capazes de sobreviver ao que chamam de “estresse climático”. Ou, simplesmente, à seca. Há cinco anos, o grupo pegou carona no projeto que mapeou o genoma do café, uma planta com grande resistência à escassez de chuvas. Com investimentos de US$ 2 milhões, os cientistas do projeto, que identificou e analisou mais de 30 mil genes, isolaram 29 sequências responsáveis pela tolerância da planta à falta de água. Desses genes, o que ofereceu os melhores resultados foi batizado de CAHB12, um gene que já foi introduzido em outras cinco das principais lavouras brasileiras: cana-de-açúcar, soja, arroz, trigo e algodão. Os primeiros resultados têm sido animadores. As plantas que receberam o novo código chegaram a sobreviver por 40 dias sem água, mais do que o dobro daquelas que não sofreram modificação genética. “O estresse hídrico é o principal motivo, além das pragas, de prejuízos à agricultura mundial”, diz Eduardo Romano, coordenador de projetos de transgenia e biossegurança da Embrapa. “Estamos trabalhando com culturas de grande importância para o agronegócio e para o pequeno produtor.”

 

Além de representar uma economia para o produtor, o cultivo de plantas com menor consumo de água também pode ser a solução para garantir a oferta de alimentos no futuro. Uma projeção da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) aponta que, até 2030, o mundo terá de ampliar em 49% a produção de soja. “Como 70% dos recursos hídricos já são usados pela agricultura, produzir alimentos com menos água será fundamental para ampliar a produção sem expandir a fronteira agrícola”, afirma Romano. De acordo com ele, no atual estágio da pesquisa sua equipe está cultivando na estufa do laboratório as primeirasplantas modificadas geneticamente. Os testes de campo devem começar no segundo semestre de 2013, quando os pesquisadores passarão a avaliar a resistência da florada a longas estiagens e a produtividade das cultivares. Outra vertente da pesquisa consiste no mapeamento genético de um cacto do Nordeste, conhecido como palma, utilizado para alimentar o gado na seca. A palma também poderá, no futuro, fornecer um gene resistente à chuva. Com resultados tão promissores, a Embrapa decidiu patentear o gene CAHB12.

A expectativa de Romano é de que as sementes das espécies transgênicas possam ser vendidas daqui a cinco anos, para que passem pela análise da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Ou seja, as variedades terão de ser submetidas a testes para verificar se trazem riscos ao meio ambiente e à saúde humana. Se forem aprovadas, as novas variedades de cana-de-açúcar, arroz, soja, trigo e algodão poderão render royalties para a Embrapa. Ainda não há uma projeção das receitas que poderão ser geradas. “Tudo dependerá da economia de água que nossas sementes vão propiciar aos produtores”, diz.