São muitos os rios que depois do período de cheia deixam às suas margens áreas de terras férteis, próprias para o cultivo. Mas nem todas essas margens são economicamente viáveis. No mundo, as mais famosas são as do rio Nilo, na África, nas quais há mais de cinco mil anos se cultivam arroz, banana e cana-deaçúcar. No Brasil também há exemplos semelhantes, como o do rio Madeira, de 3,3 mil quilômetros de extensão na Bacia Amazônica.

Ribeirinhos e povos indígenas desfrutam de sua fertilidade há décadas, mas com uma agricultura de subsistência. Agora, um estudo inédito conduzido durante dois anos pela Santo Antônio Energia (SAE) na região do Baixo Madeira, e apresentado em julho, pode tornar essa atividade rural mais eficaz. Em novembro, a SAE começou a construir a primeira agroindústria da região, para processar farinha de mandioca. A hidroelétrica, que começou a operar em março deste ano, a sete quilômetros de Porto Velho, em Rondônia, é um consórcio formado pela Cemig, Andrade Gutierrez, Odebrechet Energia, Caixa Fip e Eletrobras Furnas. Foram investidos R$ 16 bilhões para gerar energia para 40 milhões de pessoas até 2015.

O projeto da SAE tem duas vertentes: a capacitação dos agricultores e a construção de cinco agroindústrias que vão beneficiar 1,3 mil famílias, ao custo de R$ 5 milhões. “Com a capacitação e as indústrias, os ribeirinhos poderão melhorar a comercialização dos produtos que cultivam”, diz o analista socioambiental da SAE, Antônio Marques de Mello Neto. Além da fábrica para produção de farinha de mandioca na comunidade de Demarcação, em 2013 serão construídas mais quatro, para processar polpa de frutas em Cujubim, castanhado-pará em São Carlos, açaí em Nazaré, e babaçu em Calama.

A agricultora Rosely Monteiro é uma das interessadas no projeto. Ela cultiva banana, milho, melancia e abóbora numa propriedade de 60 hectares, próxima à comunidade de Cujubim. “As agroindústrias podem nos ajudar muito”, diz Rosely. Ela acredita que será possível processar as frutas de seu pomar, entre elas caju, manga e cacau, produzir polpas e vender diretamente aos supermercados. “Todos os anos, as frutas estragam nos pés”, diz Rosely. Segundo o diretor de sustentabilidade da SAE, Carlos Hugo de Araújo, o projeto das agroindústrias leva em conta as habilidades dos  produtores rurais e a vocação de cada comunidade. “Vamos ensinar técnicas simples de cultivo para aumento de produtividade nas várzeas”, diz.

 

O estudo da SAE foi realizado pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Agroambientais e Organizações Sustentáveis (Iepagro), uma organização não governamental com sede em Porto Velho. Durante 2010 e 2011, na região do Baixo Madeira, os pesquisadores visitaram 30 comunidades que cultivam nas várzeas baixas, áreas que inundam todos os anos, e nas várzeas altas, que inundam a cada cinco anos. Foram acompanhadas plantações de feijão, mandioca, tabaco, melancia, melão, milho, quiabo, abóbora, chicória, couve e maxixe. O estudo mostrou que essas terras são ricas em nutrientes, principalmente o fósforo, importante para o desenvolvimento de raízes e frutos. A mandioca, por exemplo, o produto de maior destaque na região, mostrou uma produtividade de 31,5 toneladas por hectare, quase 80% superior à alcançada fora da área de várzea, que é de 17,7 toneladas por hectare, em Porto Velho.