10/06/2014 - 11:51
O descendente de japoneses Michinori Konagano, de Tomé-Açú, município da região do rio Acará-Mirim, no norte do Estado do Pará, é uma personalidade respeitada em sua região. Há três gestões, Konagano é secretário de Agricultura do município. Também é produtor rural, herança da família que chegou ao País na década de 1920 para cultivar pimenta-do-reino nas bordas da Floresta Amazônica. Mas ele gosta mesmo é de ser apresentado como presidente da Cooperativa Mista de Tomé-Açú (Camta), entidade que reúne quatro mil pequenos produtores integrados. Em 2010, Konagano ganhou o prêmio Celso Furtado, promovido pelo Ministério da Integração Nacional para destacar projetos que reduzam as desigualdades entre as regiões brasileiras. Na Camta, os produtores vêm aperfeiçoando o sistema agroflorestal para suas lavouras. Em uma mesma área, plantam-se cacau, açaí, cajá, cupuaçu e pimenta-do-reino, que são culturas perenes, e entre uma fileira e outra dessas culturas entram as lavouras anuais, como feijão, milho, banana e mandioca. “A diversidade de culturas leva segurança financeira ao produtor”, diz Konagano. “Se uma falha, a outra o sustenta.”
Entre a salada de culturas que os produtores plantam nas propriedades, uma delas tem colocado o Pará como destaque no cenário nacional. O Estado é hoje o segundo maior produtor de cacau do País, superado apenas pela Bahia. Mas, enquanto no Estado nordestino os agricultores conseguem produzir cerca de 300 quilos de amêndoas por hectare, no Pará a produtividade é três vezes maior, tendo chegado a 942,5 quilos em 2013. “É a maior produtividade do mundo”, diz Fernando Teixeira Mendes, pesquisador da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), no Pará, órgão do MedicilânMinistério da Agricultura. “Misturamos 15 plantas híbridas e chegamos a esse patamar, mas já foram 28 híbridos em uma mesma área.” Isso é fruto de estudo. O cacau, diferentemente de outras culturas, necessita de diversidade genética para que nasçam frutos em quantidade, numa mesma planta. No ano passado, em 141 mil hectares plantados, dos quais cerca de 96 mil estão em produção, foram coletadas 90,3 mil toneladas de amêndoas da fruta. Atualmente, a renda produzida pela atividade paraense é de R$ 474 milhões, com uma taxa de crescimento anual em torno de 15%. “Com as novas lavouras entrando em produção, vamos colher 104 mil toneladas nesta safra”, diz Andrei Castro, secretário de Agricultura do Estado. “E até 2020 dobraremos a produção de cacau.” De acordo com Castro, o cacau começa a frutificar dois anos após o plantio.
A cooperativa presidida por Konagano recebe 600 toneladas de amêndoas secas por ano. “Processamos apenas frutos superiores”, diz. Caso quisesse, poderiam ser coletadas pela entidade mil toneladas de amêndoas na região. “Mas como nosso foco é exportar para o Japão, e atender nichos diferenciados no mercado interno, não baixamos a guarda.” No Brasil, a cooperativa é uma das fornecedoras para a suíça Barry Callebaut, a maior fabricante de chocolates do mundo. De acordo com o agrônomo Jasson Moreira, chefe da Ceplac de Tome-Açú, para aumentar a produção e a qualidade das amêndoas, o principal trabalho na região é com a sanidade das plantas. Há dois anos são testados fungicidas naturais à base de óleo extraído da pimenta, para combater a vassoura de bruxa, uma das piores pragas dessa lavoura. “A sanidade da planta influencia diretamente na produtividade”, diz Moreira. “A previsão é de que em 2015 o óleo comece a ser usado em larga escala no campo.”
No Pará há 17,5 mil produtores de cacau. Na região de Medicilândia, município à beira da rodovia Transamazônica, há três anos a Ceplac tem incentivado os agricultores a verticalizarem a produção. A principal iniciativa já implantada é a Cacauway, fábrica de chocolate administrada por 40 produtores familiares da região, que já exporta cacau orgânico para a Europa e processa barras e bombons vendidos em oito lojas. A mais recente foi aberta há dois meses e está localizada em Belém.
Para produtores como Élido Trevisan, da fazenda Lindo Dia, dono de uma área de 120 hectares em Medicilândia, e Ademir de Camargo, do sítio São Paulo, de 50 hectares na mesma região, o setor vive atualmente um de seus melhores momentos. O preço da tonelada da amêndoa seca é de US$ 3 mil, pronta para a indústria. “Tem gente que consegue mais, mas a lucratividade do cacau é de 50%”, diz Trevisan. “Com esse preço, que não tende a cair, se houvesse mais mão de obra poderíamos crescer ainda mais depressa”, diz Camargo. A produção de cacau, uma cultura de difícil mecanização, necessita de um trabalhador para cada três hectares, durante todo o ano. Segundo os produtores, desde que começou a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, a poucos quilômetros de Medicilândia, o problema da falta de mão de obra só tem se agravado. Mas, segundo Trevisan, mesmo assim não há do que reclamar. Principalmente ele, que desde 2007 tem feito hedge de parte da produção com a Cargill e com a Barry Callebaut, uma atitude rara entre produtores familiares. “Travar preços me dá segurança em primeiro lugar”, diz. “Em segundo, já ganhei quando o mercado perdia.” Todos os anos, Trevisan trava entre 10 e 20 toneladas de amêndoas, tendo como teto 30% de sua produção. Neste ano e no próximo, com novos pés de cacau entrando em produção, ele quer chegar a 120 toneladas na safra. “É bom empreender”, diz Trevisan.
Na casa do produtor, esse parece ser uma espécie de mantra familiar. A mulher, Leodete, e a amiga Cristiane Ferreira estão pegando carona no sucesso das lojas Cacauway para vender mel, geleia e licor de cacau. “Vendíamos antes de a fábrica existir, mas agora é melhor, porque nossos produtos vão mais longe”, diz Leodete. “Tudo que fizermos, sai para o mercado”, diz Cristiane. Segundo as agricultoras,
o ganho extra pode chegar a R$ 2 mil por mês. Mas ele pode ser ainda maior no futuro. Nos últimos tempos, Leodete e Cristiane vêm apostando no artesanato de folhas de cacau desidratadas, que se transformam em embalagens e enfeites para acondicionar chocolates e bombons. “Já são gostosos os nossos doces, agora estão ficando mais bonitos”, diz Leodete.