A cauleta é a principal estratégia do produtor José Antônio Gorgen, do Grupo Risa, para definir como será a plantação para a safra 2016/2017 nos mais de 55 mil hectares que cultiva nos Estados do Maranhão e Tocantins. “Vamos esperar o início das chuvas e plantar nas condições em que for possível”, diz Gorgen. O discurso cuidadoso tem relação com as dificuldades da safra 2015/2016. Por causa da estiagem, Gorgen teve uma produção estimada em 56 mil toneladas de soja e 21 mil toneladas de milho, uma perda de 50% e 65%, respectivamente,  em comparação à safra 2014/2015. “Estamos na região há 32 anos e nunca vi nada parecido. É triste. As três temporadas anteriores também haviam sido ruins, em razão da seca, mas a safra 2015/2016 foi uma catástrofe”, afirma Gorgen. O problema foi comum na região, considerada a mais nova fronteira agrícola do País. Em algumas partes do Matopiba, área de 73 milhões de hectares entre os Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, a média de produtividade ficou entre 25 e 30 sacas por hectare na última safra, ante uma média de 45 na anterior. Em agosto, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), informou que a quebra da safra de grãos 2015/2016 foi de 19,7 milhões de toneladas. Para a safra 2016/2017, que deve ser semeada a partir de outubro, o clima é de incerteza: a chuva pode não vir em quantidade, o custo da lavoura está subindo e vem aí uma safra mundial em crescimento.

Para Marcos da Rosa, produtor rural do município de Canarana (MT) e presidente da Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja-Brasil), é o endividamento dos produtores que deve afetar o próximo plantio. Apesar dos bancos não divulgarem dados sobre dívidas não liquidadas, a Aprosoja-Brasil acredita que a maioria dos produtores está em dificuldades para pagá-las e tomar novos créditos. Isso porque no começo da safra 2015/16, segundo estimativa da entidade, somente os produtores do Matopiba já tinham dívidas acumuladas de R$ 9,2 bilhões em linhas de custeio e investimento. Para todo o agronegócio, a estimativa é de que a dívida dos produtores chegue a R$ 28 bilhões. O resultado, de acordo com a consultoria Céleres, de Uberlândia (MG), é uma estimativa de redução no ritmo de crescimento da área a ser plantada no País. O aumento esperado é de apenas 2,6%, equivalente a 33,8 milhões de hectares de grãos. Nas últimas cinco safras, a área plantada cresceu, em média, 6,3% ao ano. “O problema é mais grave no médio norte de Mato Grosso e principalmente no Matopiba, região de maior crescimento de área plantada nos últimos anos”, afirma Enílson Nogueira, analista de mercado de soja da Céleres.


“O atraso das chuvas pode afetar a produção da lavoura” Marcos da rosa,presidente da Aprosoja Brasil

Nogueira diz, também, que os impactos da dificuldade de crédito tornarão o plantio mais caro em relação aos anos anteriores. “Os fertilizantes caíram de preço no mercado internacional, mas agroquímicos e sementes estarão com preços maiores ao longo da safra.” Os custos de produção variam conforme a tecnologia utilizada e o tipo de semente, mas analistas de mercado preveem um aumento da ordem de 11% até 15% em relação à safra passada. Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, de acordo com a Embrapa Agropecuária Oeste, a estimativa do custo desta safra varia de R$ 2.780 para a soja convencional a R$ 2.885 para a transgênica.

Por conta do custo, Rosa, da Aprosoja, diz que a tendência na safra 2016/2017 é de uma produtividade abaixo da média da safra anterior. “A produtividade deve vir mais baixa, pela menor capacidade dos agricultores em investir em tecnologia, como na seleção de sementes e defensivos”, afirma ele. “Muitos vão usá-los apenas na última hora, quando for estritamente necessário.”

Além disso, o clima ainda pode ser um entrave à produção. “Há previsões de que as chuvas só começarão no Centro-Oeste e no Nordeste por volta do dia 20 de novembro”, diz Rosa (leia mais na pág. 25).  “O atraso da chuva pode afetar a produtividade das lavouras.” De acordo com a Conab, a média nacional da safra passada foi de 48 sacas de soja e de 80 sacas de milho por hectare. “Eu produzi 47 sacas, mas vizinhos meus chegaram a produzir 35 sacas de soja por hectare”, afirma Rosa. 

No mercado internacional, o cenário produtivo também é desafiador. A previsão para a safra americana 2016/ 2017 é de 105 milhões de toneladas de grãos, ante 106,9 milhões na safra passada. Já em relação à produção global, o Conselho Internacional de Grãos (IGC, na sigla em inglês) anunciou no final de agosto que a safra 2016/2017 será a maior já registrada. A previsão é alcançar 1,35 bilhão de toneladas de soja e milho,170 milhões acima da estimativa anterior. Para Leonardo Amazonas, analista do mercado soja da Conab, o aumento da produção deve pressionar para baixo os preços da commodity no mercado internacional. “Em março, os Estados Unidos chegaram a interromper a exportação de soja, em razão dos preços internacionais muito baixos”, diz Amazonas. Na bolsa de Chicago, o preço vem ficando próximo de US$ 10 por bushel, equivalente a US$ 22 a saca de 60 quilos, ante a média esperada de US$ 11 a US$ 12 por bushel. Em real, no final de agosto, o preço máximo ficaria em R$ 86 em Chicago.