Nem o produtor mais otimista, que iniciou seu plantio de soja, no fim do ano passado, sob uma forte estiagem em grande parte da região Centro-Oeste, imaginaria que a colheita da oleaginosa no País terminaria com a possibilidade real um novo recorde de produção. De acordo com o 5º levantamento realizado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), publicado no mês passado, a safra, cuja colheita termina em abril, deve chegar 94,6 milhões de toneladas, ante 86,1 milhões da safra passada, um crescimento ao redor de 10%. “Começamos a temporada com indicadores de produção muito
desfavoráveis para a soja, em função da seca no Centro-Oeste”, diz Ana Laura Menegatti, agrônoma e consultora técnica da MBAgro, de São Paulo. “Agora, pela primeira vez na história, o País
pode ultrapassar, de fato, os 200 milhões de toneladas de grãos e fibras, e a oleaginosa tem um peso grande nessa conta”. A área plantada, no entanto, cresceu apenas 4,4% em relação à safra passada, indo a 31,5 milhões de hectares, evidenciando, mais uma vez, os ganhos de produtividade entre os produtores. “Mesmo com as incertezas, os sojicultores não recuaram no plantio”, afirma Ana Laura. 

O aumento da produtividade, porém, não ocorreu de maneira uniforme. A falta de chuvas no início do plantio e o excesso no mês passado comprometeram a expectativa de crescimento no Sudeste, parte
do Centro-Oeste e no Matopiba, importante região produtora, que reúne áreas do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A melhora na eficiência ficou por conta das lavouras do Sul do País, que foram beneficiaram pela temperatura e chuvas adequadas, repercutindo sobre os índices em nível nacional, estimado em três mil quilos da oleaginosa por hectare, contra 2,8 mil registrado na última safra.

De acordo com Glauber Silveira, presidente da Câmara Setorial da Soja no ministério da Agricultura, e integrante do conselho consultivo da Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja), apesar dos bons indicadores de produção para o País, os agricultores do Centro-Oeste não estão satisfeitos. “A produção até cresceu, mas a qualidade do grão deixou a desejar”. Ele se refere aos grãos de soja que não encheram como o esperado, em função da falta de chuva para esse período da planta. Silveira dá como exemplo o Mato Grosso, o maior produtor de soja do País (veja reportagem na página 32). A previsão de colheita é de 27,6 milhões de toneladas, apenas 4,5% acima da safra passada. “Embora o Estado permaneça como o maior produtor do País, os agricultores poderiam ter colhido mais, caso o clima não tivesse interferido na formação dos grãos”, afirma Silveira.

ESTOQUES ALTOS A promessa de uma supersafra nos principais países produtores, como o Brasil, Estados Unidos e Argentina, que devem colher 108 milhões de toneladas e 57 milhões de toneladas, respectivamente, está se refletindo nos preços internacionais da oleaginosa. A Bolsa de Chicago, referência mundial para indicadores  de soja, vem apontando desde, o início do ano, cotações próximas de US$ 9 por bushel, o equivalente a US$ 20 a saca de 60 quilos. No final do ano passado, a expectativa para a safra 2014/2015 era de que o preço em Chicago permaneceria no valor de US$ 24 a saca. “São os Estados Unidos e o Brasil que estão provocando e sustentando a baixa de preços”, diz Silveira. 

Segundo ele, o que ocorre atualmente é um descompasso entre a oferta e a demanda global da oleaginosa. “O equilíbrio do mercado está complicado nesta safra”. De acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda), a produção mundial vai crescer 11% na safra 2014/2015, com 315 milhões de toneladas colhidas, enquanto o consumo deve ficar em 288 milhões toneladas, cerca de 6% acima da safra anterior. A China, o maior importador mundial, é o fiel dessa balança. Sua demanda é de 86,2 milhões de toneladas de soja, 7,3% acima da safra anterior, mas o país asiático está indo às compras com cautela. Não por acaso, a China deve terminar o período 2014/2015 com o mesmo estoque regulador da safra passada, de 14 milhões de toneladas do grão. Com o apetite chinês em baixa, o estoque de passagem do Brasil segue o caminho inverso e deve fechar a atual safra com 24,8 milhões de toneladas. 

Se, por um lado a queda de preços é um fato consumado, por outro, o próprio aumento do volume produzido, somado à valorização do dólar, que ultrapassou a barreira dos R$ 2,80, pode minimizar as eventuais perda de rentabilidade. Nesta safra, as primeiras negociações em Mato Grosso estão na média de US$ 18 a saca, contra a média do ano passado de US$ 22, segundo do Instituto Mato-grossense de Economia Aplicada (Imea). “Sem dúvida, o câmbio vai ajudar o produtor brasileiro em 2015”, diz Silveira. 

Para o presidente da Vanguarda Agro, Arlindo de Azevedo Moura, a queda de preço da soja deve ser mais sentida principalmente pelos produtores que não realizaram venda antecipada. “Os preços da soja já caíram significativamente e não sabemos o que vem pela frente”, afirma Moura. A Vanguarda Agro, que plantou 224 mil hectares em Mato Grosso, Bahia e Piauí, ainda mantém 144 mil toneladas armazenadas, do total de 480 mil toneladas que estão sendo colhidas nesta safra. O volume é equivalente a 30% da produção. “Vamos esperar alguma recuperação para vender”, diz Moura. De acordo com o executivo, para os 70% já negociados da safra, a companhia travou o preço da saca de soja em US$ 20. “Como já prevíamos cotações menores, negociamos a um bom preço”.