Wilson Zanatta: “Haverá o antes e o depois da LBR”

Queijos do Sul: Zanatta criou a fábrica em Tapejara “por acaso”

Em uma típica manhã chuvosa de verão, o empresário gaúcho Wilson Zanatta chega ao escritório da Lácteos Brasil (LBR) em São Paulo. Ali, no imponente prédio comercial, localizado no bairro de Pinheiros, zona oeste da capital, ele passa boa parte do seu tempo, que divide entre idas ao Rio Grande do Sul e a agenda de reuniões dentro e fora do País. A rotina do gaúcho de Tapejara, que por conta de um problema de saúde abriu mão da criação e investiu numa pequena produção de queijos na fazenda do pai, no final da década de 1980, mudou drasticamente em dezembro do ano passado. Na ocasião, foi anunciada oficialmente a fusão entre a Laticínios Bom Gosto, controlada por Zanatta e pela família gaúcha Stuani, e a LeitBom, que tem entre seus sócios a Laep, do empresário paulista Marcos Elias e dona da Parmalat, e a GP Investments. Os detalhes da parceria foram divulgados no final de fevereiro. Juntas, elas deram origem à LBR, um gigante que nasce com um faturamento anual de R$ 2,8 bilhões.

Maior empresa nacional de produção e captação de leite do País, com 56 mil fornecedores, a LBR exibe números superlativos. Inicialmente, serão dois bilhões de litros captados por ano em 30 fábricas espalhadas em dez Estados, onde trabalham 6,4 mil pessoas. É um pouco menos do que a captação da Nestlé, de 2,1 bilhões de litros anuais, e pouco mais do que o volume comprado pela BRFoods, estimado em 1,7 bilhão de litros.

Caminhos cruzados

Com trajetórias diferentes, a LeitBom e a Bom Gosto construíram marcas fortes no mercado brasileiro. Juntas, querem liderar o setor

Mesmo tendo se transformado em um dos mais poderosos empresários do setor, Zanatta mantém a alma de produtor rural. Para quem o ouve falar, é só reparar no brilho dos olhos enquanto conta sobre os planos para levar adiante o seu sonho. “Crescer em conjunto. Isso nos fez chegar até aqui”, afirma. Agora, ele divide a responsabilidade com Fernando Falco, que estava à frente da LeitBom desde 2009 e assumiu o posto de diretor presidente da LBR. “A parte burocrática do negócio é toda dele”, diz Zanatta, que assumiu a copresidência do conselho administrativo da nova empresa com Fersen Lambranho, um dos sócios da GP Investments. O fundo de investimentos se tornou sócio da LBR e, juntamente com a Laep, detém 40% do grupo recém-criado, por meio da Monticiano (veja gráfico Os donos da LBR). A Zanatta e aos Stuani couberam outros 30% e mais 30% ficaram para o BNDESPar, que já tinha porcentagem equivalente na Bom Gosto. Com a negociação, o banco injetou R$ 700 milhões na LBR, para seguir o aumento de capital e manter sua participação.

Com os sócios definidos em mais de seis meses de negociações, a LBR tem diante de si grandes desafios. À frente da gestão, Falco tem como missão reposicionar marcas que perderam espaço no mercado, como a Parmalat. “Vamos investir para que ela volte a ser nacional e se torne um dos nossos carros-chefes”, afirma. No médio prazo, o plano é relançar a antiga linha de produtos de mesmo nome, que inclui leite condensado e creme de leite. Outro desafio é equilibrar os pontos fortes das antigas companhias, consolidar a união e focar as ações no crescimento conjunto da cadeia produtiva.

“Queremos ser os consolidadores do desenvolvimento da cadeia leiteira, assim como JBS e Marfrig foram na bovinocultura”, diz Zanatta.

Leite do cerrado: Falco estava à frente da fábrica desde 2009

Alguns dos antigos programas implementados pelas empresas foram reestruturados e ganharam força. Um deles tem o carinho e a atenção especial de Zanatta. Batizada de plano 300, a ideia foi concebida pelos técnicos da Bom Gosto. A intenção é aumentar a produção média diária de leite por produtor e multiplicá-la dos atuais 100 litros para 300 litros, com garantia de compra pela LBR. “Vamos estendê- lo pelo Brasil todo e queremos que seja um divisor de águas: antes e depois da LBR”, diz Zanatta. Para que esse projeto ganhe corpo, serão feitos investimentos na capacitação dos técnicos da empresa, para que levem apoio e informação aos produtores. O intuito é mostrar que os investimentos em tecnologia, manejo e sanidade se refletem no aumento dos ganhos. Segundo Zanatta, um dos principais problemas da cadeia é a baixa produtividade. Para se ter uma ideia, a média diária por produtor no Uruguai é de 1.300 litros, enquanto na Nova Zelândia esse volume chega a 4.500 litros. “Queremos que o produtor tenha segurança para produzir e um projeto que o ajude a se profissionalizar”, diz ele.

A nova companhia se prepara para operar além do mercado doméstico. A porta de entrada no Exterior é o Uruguai. Lá, já está a todo vapor o projeto de construção de uma fábrica para produção de leite em pó. O custo total da unidade está avaliado em aproximadamente US$ 40 milhões. Quando concluída, a unidade terá capacidade inicial para captar cerca de 600 mil litros ao dia. Zanatta esteve no Uruguai no final de fevereiro e reuniu- se com o presidente do país, José Mujica, para acertar detalhes do investimento. Todo plano de investimento virá do aporte de R$ 700 milhões feito pelo BNDES, que já havia investido R$ 250 milhões na Bom Gosto, a empresa fundada por Zanatta. A boa vontade do BNDES se explica: o banco oficial pretende reproduzir no leite o que já fizera ao privilegiar a JBS, como base de uma companhia brasileira de carnes global. Sozinhas, tanto a Bom Gosto quanto a LeitBom, empresas endividadas e deficitárias, dificilmente conseguiriam decolar.

Mesmo com a ajuda oficial, colocar em prática os projetos será uma tarefa árdua para a LBR. O setor de lácteos, que movimenta R$ 18 bilhões por ano no Brasil, vem sofrendo duros golpes, com preços pouco remuneradores pagos ao produtor e margem apertada de lucro para as empresas. Para complicar, some-se o baixo consumo de leite e derivados pela população. Com 160 litros por ano, o Brasil, embora seja o quarto maior produtor, é apenas o 65º no ranking do consumo mundial. Em consequência desses fatores, a cadeia produtiva passa por um momento delicado, pois falta uma ação integrada para unir forças e buscar uma aproximação maior com o público. “Temos que saber quais são as preferências dos consumidores, o que os atrai mais”, diz Jorge Rubez, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Leite Brasil). Diante desse quadro, Zanatta promete desfraldar a bandeira do desenvolvimento do setor. Como líder de uma empresa gigante, sua voz será mais ouvida do que nunca.

A força por trás da fusão

Mesmo antes de se unirem, as duas empresas já figuravam entre as mais importantes do setor lácteo brasileiro

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Agradecimento:

Magim Rodriguez Jr.,

dono da Fazenda

Sesmaria e proprietário

da novilha simental

Lessy da Sesmaria (foto)