24/09/2015 - 13:11
Preparar um frango caipira remete, dentro do imaginário popular, às lembranças dos grandes almoços de domingo, com famílias em volta da mesa, para saborear essa iguaria feita, com muito carinho, pelas avós. Assim, quando se fala em frangos, galinhas e ovos caipiras, o senso comum é imaginar pequenas criações em sítios ou nos quintais das casas, utilizadas apenas para a subsistência das próprias famílias criadoras.
Esse sistema de produção artesanal, de crescimento mais lento, tem como resultado uma ave madura, de carne com textura tenra e saborosa e que concentra todos os nutrientes do campo. O produto, entretanto, vem ganhando relevância no mercado e nas discussões de entidades agropecuárias nos últimos anos, tanto que acaba de ganhar um marco regulatório, publicado no final de agosto pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).
Apesar de fornecer um produto tradicional e de conhecimento popular, o setor até então não era completamente regulamentado. A nova norma, intitulada “Avicultura: produção, abate, processamento e identificação do frango caipira, colonial ou capoeira”, define a criação e produção em escala dos frangos e galinhas caipiras, o que marca a história dessa criação no País e incentiva mais produtores a investirem neste tipo de manejo.
“Até agora, somente o ofício circular de nº 07 de 1999, norteava o setor. Este ofício ressaltava somente quesitos básicos da criação de aves caipiras, como por exemplo, o crescimento lento, a não utilização de antibióticos como melhoradores de desempenho, o acesso a piquetes externos, entre alguns outros aspectos de bem-estar animal”, explica Reginaldo Morikawa, presidente da Associação Brasileira da Avicultura Alternativa (AVAL), que contribuiu decisivamente para a elaboração das novas normas.
“Esta falta de critérios mais específicos permitia interpretações diferentes que acabavam por não promover um padrão adequado de produto final, gerando descontentamento por parte do consumidor e uma baixa intenção de investimento por parte dos criadores. Este, com certeza, foi um dos maiores fatores que cercearam o crescimento do setor de aves caipiras no Brasil”, diz Morikawa.
“Devido às intensas discussões sobre a sanidade do rebanho nacional e as formas de preservá-lo de doenças como a Influenza Aviária, muitas normas e regulamentos têm sido desenvolvidos. Neste cenário, nós da AVAL, temos realizado um trabalho muito intenso, contribuindo com a elaboração destas normas e, ao mesmo tempo, preservando os direitos de pequenos e médios produtores, contribuindo para um produto saboroso, saudável e seguro”, acrescenta o presidente da AVAL.
A partir da publicação da normativa pela ABNT, para serem consideradas caipiras, as aves terão que, necessariamente, seguir os procedimentos do marco regulatório, o que também vai facilitar a realização de auditorias e adequações em programas de conformidade de instituições, como o Inmetro (Instituto de Metrologia, Qualidade e Tecnologia). A norma sobre a criação e produção de aves caipiras pode ser adquirida pelo site www.abntcatalogo.com.br.
“Haverá uma contribuição fantástica para todos os que participam deste setor produtivo, desde a indústria até os consumidores finais. Estimativas feitas junto aos membros da AVAL apontam para uma produção mensal de mais de 7 milhões de pintinhos de corte caipiras no Brasil, que agora tende a crescer, caracterizando-se como uma atividade de grande relevância em termos econômicos, de emprego e de geração de renda no campo”, acrescenta o médico veterinário Luis Ricardo Bianchi e também vice-presidente da AVAL.
Estimativas do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) indicam ainda que a avicultura caipira gera acesso à alimentação e complementa a renda de grande parte dos agricultores familiares brasileiros: 80% criam aves caipiras para seu próprio sustento. Dentro desse percentual, 53% utilizam parte da produção para gerar renda complementar. Desta forma, a atividade promove a sustentabilidade econômica do produtor e da natureza e fornece aos consumidores opções saudáveis de uma carne tradicional, com características gourmet.
A norma será capaz de trazer ao setor um ambiente equilibrado e de regras claras, resultando em maior confiança para todos os agentes que atuam na cadeia produtiva, e será capaz de atender os anseios de um número crescente de consumidores em busca de produtos saborosos, saudáveis e de elevada qualidade, observa o executivo. “Acreditamos que este é um divisor de águas, que irá impulsionar, regular, transmitir segurança e seriedade para toda a cadeia produtiva e de consumo, permitindo que as empresas se empenhem em investir mais neste produto.”
ontribuição
Fundada em 08 de junho de 2001 para debater e sanar problemas existentes no setor, devido à falta de padronização das criações de aves caipiras, o que refletia no padrão de qualidade do produto final, a Aval já tem fomentado a cadeia de produção e aprimorando os métodos de produção de aves e manejos alternativos.
Como resultado desse trabalho, tem confirmado que a criação caipira pode oferecer produtos seguros, saudáveis e de altíssima qualidade e tem atraído a atenção para o segmento. A publicação da normativa pela ABNT vem cumprir um anseio das associações, como a Aval, envolvidas com este tipo de manejo, uma vez que pode transformar a produção de aves caipiras no Brasil e a visão que os órgãos governamentais e a sociedade têm sobre ela.
A nova norma, resultado de dois anos de trabalho, foi baseada nas normas da AVAL de criação e manejo e foi comemorada pelos associados e demais agentes do setor, com sua publicação, em 27 de agosto.
“Quando a associação surgiu, a ideia de criações caipiras, orgânicas ou sem uso de antibióticos eram novas, mas as discussões acerca da utilização de tais substâncias nas criações começavam a ganhar corpo. Isso motivou algumas empresas a se espelharem neste exemplo de diferenciação e passarem a utilizar as normas da AVAL para legitimar os diversos modelos de produção existentes”, explica o atual primeiro secretário da associação, o médico veterinário Luiz Carlos Demattê Filho, que coordenou o grupo que debateu as diretrizes da definição do frango caipira.
Um dos grandes problemas enfrentados pelos órgãos públicos, aos quais cabe a caracterização e a informação aos consumidores, tem sido a rotulagem dos produtos advindos da avicultura alternativa. Por isso, o Departamento de Industrialização de Produtos de Origem Animal do Ministério da Agricultura (DIPOA), órgão responsável pela aprovação dos rótulos, solicitou às entidades do setor de avicultura que formulassem uma normativa para harmonizar e regulamentar o setor produtivo.
Este trabalho foi desenvolvido no âmbito da ABNT por um comitê formado pela AVAL, Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) – entidade que congrega grande agentes do mercado da produção avícola do País -, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), MDA , Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e pela Coordenadoria de Defesa Agropecuária do Estado de São Paulo (CDA/SAA-SP).
Coube ao comitê a missão de escrever a norma que regulamentasse a produção do frango caipira, no que se refere à produção, rotulagem, manejo, abate, controle sanitário, insumos e aditivos, documentação, entre outras exigências. Dessa forma, o comitê desenvolveu a lei, tornando-a eficaz no sentido de garantir a sua idoneidade e efetividade como um processo auditável.
Além das regulamentações, o comitê demonstrou uma grande preocupação com o uso incorreto do termo “caipira”, que passou a ser utilizado por empresas que, efetivamente, não produzem frangos ou ovos provenientes deste sistema de criação.
“Os ovos vermelhos são um caso muito ilustrativo e de fácil compreensão. Muitos consumidores acreditam que são caipiras só por serem vermelhos, mas isso não corresponde, necessariamente, à verdade. Frequentemente, galinhas poedeiras ou matrizes de frango de corte, destinadas ao descarte, são abatidas e acabam, muitas vezes, sendo comercializadas como produtos caipiras e isso não é justo com o consumidor. Fato que também contribuiu para melhorar e normatizar o setor produtivo, beneficiando milhões de consumidores que passarão a ser atendidos sempre com produtos idôneos que, apesar de terem um preço mais elevado nas gôndolas dos supermercados, terão seus diferenciais realmente identificados”, analisa Demattê.
Diferentes criações
Mas afinal, como diferenciar um frango caipira de um frango de granja convencional ou orgânico? A diferença é simples, como aponta a norma aplicada pela AVAL, desde 2013:
Frango Convencional: produzidos em granjas de exploração comercial, de linhagens comerciais geneticamente selecionadas para alta taxa de crescimento e excelente eficiência alimentar, criados em sistema intensivo, segundo as normas sanitárias vigentes, sem restrição ao uso de antibióticos, anticoccidianos, promotores de crescimento, quimioterápicos e ingredientes de origem animal na dieta.
Frango criado sem o uso de antibióticos (Antibiotic Free/AF): ave de exploração intensiva, sem restrição de linhagem, criada sem o uso de antibióticos, anticoccidianos, promotores de crescimento, quimioterápicos e ingredientes de origem animal na dieta.
Frango Caipira, Frango Colonial, Frango Tipo ou Estilo Caipira ou Frango Tipo ou Estilo Colonial: aves de linhagem exclusiva para esse fim, criadas em sistema com acesso a áreas externas para pastejo, exercícios e manifestação de comportamentos inerentes à espécie, e que se alimentam com ração constituída por ingredientes preferencialmente de origem vegetal, sendo proibido o uso de melhoradores de desempenho de base antibiótica. Apenas linhagens ou raças de aves de crescimento lento (superior a 70 dias) são aceitas com essa denominação;
Frango Orgânico: produzidos em granja de exploração comercial. Não há restrição de linhagens. Produzido segundo legislação brasileira para os sistemas orgânicos de produção, cujas especificações produtivas encontram-se principalmente descritas na Instrução Normativa n°46 de 07/10/2011.
Sua principal característica produtiva é a ração das aves com ingredientes que tenham origem orgânica certificada, cultivados sem a utilização de defensivos e fertilizantes químicos, respeitando-se o bem-estar animal e o meio ambiente. Acesse: http://www.aval.org.br. A norma sobre a criação e produção de aves caipiras pode ser adquirida pelo site: www.abntcatalogo.com.br, via correio ou nas sedes da ABNT. A publicação sai por R$62. Fonte: Ascom