01/03/2012 - 0:00
A produção de etanol, um dos xodós do governo brasileiro, está à beira de um colapso. Nos últimos três anos, a falta de investimentos e novos projetos de ampliação dos canaviais tem limitado a expansão do setor sucroalcooleiro, aponta o estudo denominado “Movimento Mais Etanol”, da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), apresentado em fevereiro. Segundo a Unica, o Brasil precisa elevar a produção anual para 1,2 bilhão de toneladas de cana até 2020, para atender à crescente demanda por etanol e açúcar – a atual produção é estimada em 571 milhões de toneladas. Para que isso ocorra, os investimentos necessários estão calculados em R$ 156 bilhões destinados à construção de 120 novas usinas e à expansão dos canaviais.
No fim do mês, três semanas depois da manifestação da Unica, o governo anunciou que se responsabiliza por quase 50% dos recursos exigidos. A equipe de técnicos do Ministério da Agricultura apresentou o Plano Estratégico do Setor Sucroalcooleiro, que contará com um aporte de R$ 61 bilhões até 2015. “O governo deu um sinal positivo aos empresários, de que está disposto a colaborar muito com a iniciativa privada”, diz o economista Marco Antonio Conejero, coordenador do Centro de Inteligência do Agronegócio da PricewaterhouseCoopers, em Ribeirão Preto (SP). Para Antonio de Pádua Rodrigues, diretor- técnico da Unica, o plano de fato tem condições para atrair investimentos privados. Mas, alerta Pádua, é importante que o governo diga de onde virão os recursos.
O socorro ao setor sucroalcooleiro será em grande parte financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mas o governo não descarta outras fontes, entre elas a Poupança Rural. “O aporte de R$ 61 bilhões é possível e vai promover a retomada imediata do crescimento da indústria sucroalcooleira”, diz José Gerardo Fontelles, nomeado no início de fevereiro pelo ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro, para a Secretaria de Produção e Agroenergia do Mapa.
O Plano Estratégico propõe três linhas de ação. A primeira, com um aporte de R$ 29 bilhões, servirá para a renovação de 6,4 milhões de hectares de cana-de-açúcar. Como a área total cultivada no País alcança 8,3 milhões de hectares, é possível realizar boa parte da tarefa até 2015, como propõe o governo. “Como o ideal é renovar 20% da área plantada, por ano, daria 1,6 milhão de hectares renovados a cada safra”, diz Conejero, da PricewaterhouseCoopers. “Na safra passada, com pouca ou nenhuma ajuda, os produtores renovaram 961 mil hectares.”
“O aporte de recursos é possível e vai promover a retomada imediata do crescimento da indústria sucroalcooleira”
José Gerardo Fontelles
Secretário de Produção e Agroenergia do Mapa
A segunda proposta do Plano Estratégico é liberar R$ 8,5 bilhões para que as usinas aumentem a produção própria de cana, diminuindo a capacidade ociosa na moagem, hoje em 16%. O dinheiro serviria para as usinas expandirem suas áreas cultivadas em 1,4 milhão de hectares. Em geral, uma usina precisa trabalhar com um mix de 40% de produção própria e 60% de cana fornecida por terceiros, para que possa atuar sem o fantasma da ociosidade. “Hoje, essa relação está desequilibrada”, diz Conejero. Terminada a tarefa da expansão dos canaviais, as empresas teriam condições, na sequência, de construir novas usinas até 2015. Segundo Conejero, em quatro anos, a indústria de base teria condições de fornecer equipamentos para novas 46 usinas com capacidade de moagem de 1,5 milhão de toneladas de cana.
Das três propostas do Plano Estratégico, a terceira é a mais difícil de ser cumprida até a metade da década. A ideia é ampliar as plantações de cana em mais 3,8 milhões de hectares, elevando o total cultivado para 12,3 milhões. Para cumprir o plano, serão exigidos recursos de R$ 23 bilhões. “Se olharmos 2020 como data para cumprir a meta, tudo bem”, diz Conejero. “Mas para 2015 é quase impossível.” Segundo o especialista, para abrir novas áreas é necessário um tempo maior. “Não dá para pensar em um novo canavial com menos de 18 meses de trabalho.” Mesmo assim, Conejero está convencido de que estão ocorrendo avanços na relação iniciativa privada-setor público. “A proposta do governo está alinhada ao que a Unica tem dito, de expansão para 15 milhões de hectares.”
Além das três propostas apresentadas à iniciativa privada, o plano do governo contempla a pesquisa. Para a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) serão destinados R$ 40 milhões. Os recursos serão para pesquisas do etanol celulósico e novas variedades de cana mais adaptadas ao Centro- Oeste, onde se localiza o maior potencial para a expansão das áreas de cultivo.
A Embrapa estima que 34 milhões de hectares de pastagens estão degradados, do total de 56 milhões de hectares cultivados no Centro-Oeste. Segundo Armindo Kichel, especialista em pastagens no Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Corte (CNPGC/ Embrapa) de Campo Grande (MS), da área degradada, oito milhões têm potencial para grãos, outros oito milhões podem ser ocupados com florestas e 18 milhões de hectares de terras mais fracas devem continuar como pastagem. “Uma parte dos oito milhões com potencial para grãos, principalmente a soja, pode ser destinada à cana”, diz Kichel. Segundo o pesquisador, esse movimento já começou. “Em Mato Grosso do Sul, dos atuais 600 mil hectares de cana cultivada, 200 mil hectares vieram da soja e das pastagens degradadas.”