Um grupo de arbitralistas avalia que o projeto de lei nº 3.293/2021, de autoria da deputada federal Margarete Coelho (PP/PI), contém capítulos que violam a Constituição. Para eles, o texto em tramitação na Câmara se resume a uma “inconstitucionalidade chapada”. O Comitê de Jovens Arbitralistas da CBMA (Comissão Brasileira de Mediação e Arbitragem) reuniu advogados que atuam no setor, entre eles o procurador de São Paulo Olavo Alves Ferreira e o advogado Gabriel de Britto.

O evento aconteceu na noite desta quinta-feira, 27. A arbitragem é um método alternativo de solução de conflitos, por meio do qual as partes podem negociar a solução do problema que existe entre elas, sem ir ao Poder Judiciário, pela mediação de um árbitro que seja de confiança das duas. O árbitro é um profissional com instrução para conduzir a solução do conflito, e cuja decisão poderá ter a mesma força de uma sentença. De acordo com a legislação brasileira sobre a arbitragem (a Lei nº 9.307, de 1996) apenas direitos patrimoniais disponíveis podem ser objeto de mediação. É o caso, por exemplo, de dívidas bancárias, direito do consumidor e títulos de crédito. Um caso de pensão alimentícia ou que envolva a prática de um crime só pode ser resolvido pelo Judiciário.

As principais medidas visadas pelo projeto são a restrição do número de casos aos cuidados de cada árbitro e o aumento da publicidade em torno da atuação do setor. Se aprovada a proposta, cada árbitro poderá atuar em apenas dez casos por vez, não poderá estar em mais de um tribunal de arbitragem e as cortes deverão deixar públicos os casos para os quais foi contratada.

Na justificativa da proposta, a deputada do PP afirma que um dos objetivos do projeto de lei é “impedir a repetição dos mesmos árbitros em painéis arbitrais que estejam funcionando concomitantemente, evitando-se, com isso, a possibilidade de haver favorecimento a determinada parte”. Margarete também argumenta que “a publicidade das decisões arbitrais e das anulatórias ajudará a criar uma verdadeira jurisprudência, tão cara ao sistema jurídico, mas inexistente na arbitragem”, o que aumentaria “a segurança jurídica e coesão das decisões”.

De acordo com o procurador do Estado de São Paulo, Olavo Alves Ferreira, que esteve presente na mesa de quinta, o projeto, que o Comitê denomina de “antiarbitragem”, possui uma “inconstitucionalidade chapada”. A expressão era muito usada pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e hoje advogado Sepúlveda Pertence, como forma de se referir aos casos em que a inconstitucionalidade é clara.

Ferreira questionou o limite de casos por árbitro proposto pelo projeto de lei comparando-o com o volume de trabalho dos magistrados. “Um juiz tem centenas de processos. E o árbitro só pode ter dez?”, questionou.

O advogado Gabriel de Britto Silva, que também participou do evento, argumenta que a proposta legislativa faz menção à existência de “câmaras de arbitragem oportunistas”, que, de acordo com ele, “é algo que foge completamente do habitual”. O mesmo argumento foi corroborado pela advogada Thaís Vasconcellos, presidente do Comitê. Ela afirma que são raríssimos os precedentes (decisões judiciais de relevância) de anulação de decisões arbitrais. Por isso, segundo ela, a justificativa do projeto não teria respaldo estatístico.

Um dos principais pontos levantados ao longo do debate desta quinta é que o projeto “antiarbitragem” representa uma intervenção na “livre iniciativa, na autonomia da vontade das partes e na livre concorrência”, agindo “na contramão das leis internacionais” que já existem sobre a arbitragem.

O projeto de lei “antiarbitragem” se encontra na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. No dia 30 de agosto, a CCJ determinou a realização de uma audiência pública sobre o tema. Até o momento, não foi designada a data.