01/07/2011 - 0:00
Confinar ou não confinar?
Comum nos Estados Unidos, a prática de engorda pelo método intensivo está em queda no Brasil. Saiba por que o confinamento não emplacou por aqui
Nos Estados Unidos é regra: os bovinos nascem nos pastos e são desmamados e levados diretamente aos confinamentos para serem engordados. Os frigoríficos recebem, por ano, cerca de 30 milhões de cabeças para serem abatidas. Essa quantidade de animais rende 11,5 milhões de toneladas de carcaças, que depois são desossadas e preparadas para ir às gôndolas dos supermercados. No Brasil, o abate está na faixa dos 40 milhões de cabeças e a produção é de quase oito milhões de toneladas de carne em equivalente carcaça. Em outras palavras: graças a um sistema mais intensivo de finalização, os americanos conseguem, com 25% a menos de animais abatidos, uma produção 30% superior à obtida por seus colegas brasileiros, que utilizam o sistema tradicional de criação extensiva. E nada indica que esse quadro mude, a curto prazo: a perspectiva para o País é abater apenas 1,9 milhão de bovinos confinados em 2011.
Poderia ser maior a participação dos confinadores no resultado dos abates realizados no Brasil? Uma pesquisa junto aos pecuaristas brasileiros, sobre a intenção de utilizar essa técnica de engorda neste ano, aponta um aumento de 31%, o que equivaleria a 2,5 milhões confinados. Quase ninguém, porém, acredita que isso vá ocorrer, a começar pelos próprios patrocinadores da pesquisa, a Associação Brasileira de Confinadores, Assocon. Foram ouvidos 61 pecuaristas de 11 Estados, e há muita desconfiança de que eles falaram da boca para fora.
No Brasil, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos, a engorda de animais em confinamento é utilizada apenas em determinadas situações, como na entressafra do boi, quando faltam pastagens para a engorda, entre os meses de julho e outubro na maior parte do País, principalmente na região Centro- Oeste. Com isso, os pecuaristas acabam melhorando sua remuneração, pois o preço da arroba sobe em função da escassez de oferta de gado para o abate nos frigoríficos. Por parte destes, donos de alguns dos maiores confinamentos do País, eles servem como tentativa para regular os preços.
Caso os pecuaristas cumprissem com o prometido para 2011, o confinamento no País recuperaria parte das quedas dos últimos anos. Os 1,9 milhão de bovinos em 2010 representou um recuo de 10% na comparação com 2009 e queda de 35% ante 2008, ano em que a crise econômica mundial levou alguns frigoríficos e confinamentos a encerrar suas atividades. Bruno Andrade, zootecnista da Assocon e responsável pelo levantamento, diz que uma segunda pesquisa pode mostrar um cenário diferente desse que se instalou, mas ele não acredita muito que isso ocorrerá. A entidade realiza mais duas pesquisas no ano. Uma seria neste mês de julho, para monitorar se a intenção se efetivou. Outra será feita em novembro, após o término dos abates dos animais confinados. Em 2010, apenas com a venda de animais aos frigoríficos, o setor movimentou acima de R$ 3 bilhões.
Ao contrário do ocorrido no início do segundo semestre de 2010, período em que os pecuaristas fazem contas para ajudar na tomada de decisão, em 2011, não estão dadas condições favoráveis. Mesmo com a perspectiva de cotações da arroba do boi gordo na casa dos três dígitos, prevista para meados do mês de outubro, entre R$ 112 e R$ 115, no mercado físico.
Confinar ou não confinar?
Comum nos Estados Unidos, a prática de engorda pelo método intensivo está em queda no Brasil. Saiba por que o confinamento não emplacou por aqui
Conta que não fecha: “Em Goiás, o gado magro está custando R$ 95 a arroba e os frigoríficos estão pagando R$ 98 pela arroba do gado pronto”, diz Ricardo Merola
No ano passado, a forte valorização da arroba do boi gordo, o baixo custo de produção e a demanda por parte dos frigoríficos estimularam os pecuaristas a apostar no confinamento. Segundo Fábio Maia de Oliveira, diretor executivo da Assocon, somente se houver a conjunção de mais alguns fatores, as intenções para 2011 se concretizarão. Entre elas, está a valorização ainda maior da arroba no mercado futuro e a queda do suporte dos pastos além do considerado normal, como aconteceu na seca do ano passado, a mais severa desde 2007. “O que desmente as intenções é que, apesar de os confinadores afirmarem que pretendem fechar um número maior de animais, até o momento, as compras de bois magros não confirmam essa intenção”, diz.
No mercado de compra e venda de animais, o preço do gado magro a ser confinado está acima do preço efetivo da arroba. A Scot Consultoria, de Bebedouro (SP), apontava na primeira quinzena de junho para garrotes de 12 arrobas em São Paulo e cotações de até R$ 1,2 mil por cabeça, preço equivalente a uma arroba de R$ 100. No mercado físico, no mesmo período, a arroba valia entre R$ 97 e R$ 98 para pagamento à vista. No primeiro semestre de 2011, as cotações do boi magro registraram aumento de 29% em relação a igual período de 2010. Para Oliveira, a perspectiva de estagnação no confinamento também está ligada ao aumento de 24% no custo da dieta animal, puxado pelas altas do milho, do farelo de soja e do sorgo.
Prato do boi: estagnação no confinamento também está ligada ao aumento de 24% no custo da dieta animal, puxado pelas altas do milho, do farelo de soja e do sorgo
O confinador Ricardo de Castro Merola, da Fazenda Santa Fé, em Santa Helena de Goiás (GO), acredita que em meados de outubro, mesmo com a perspectiva da arroba acima de R$ 110, deverá faltar gado pronto para o abate. “A alta no custo de produção e o aumento nas cotações de animais para reposição bastam para sinalizar que o confinamento não avançará”, diz Merola. Sua previsão é confinar 20 mil animais, um recuo de 25% na comparação com 2010 e queda de 75% ante 2009. “Em Goiás, o boi magro está custando R$ 95 a arroba. No boi gordo, os frigoríficos estão pagando R$ 98. A conta não fecha.”
Outro desanimado com a atividade é Edílson de Souza, da Agropecuária Nova Era, de Alto Paraíso (GO), que planeja deixar de ser confinador até 2013. “A agricultura está mais rentável”, afirma. A Nova Era deve confinar 1,2 mil cabeças, uma redução de 25% ante 2010. Nos próximos anos, Souza quer destinar toda a área de dez mil hectares ao cultivo de milho, feijão, soja e sorgo.
Na contramão dos céticos e pessimistas, há quem acredite que a estimativa de aumento do número de animais confinados se confirmará. Maurício Palma Nogueira, diretor da Bigma Consultoria, de Casa Branca (SP), diz que o aumento no custo de produção da arroba não deverá frear o crescimento do setor. “Há uma diferença fundamental de cenário”, afirma Nogueira. “Em 2010, o produtor não acreditava em altas cotações da arroba para o segundo semestre. Em 2011, ele acredita e muito.” Para Nogueira, esse é um dado novo, que deve ser levado em consideração. “Acredito que o setor deva crescer entre 20% e 25%”, diz. “O País já tem estrutura para avançar 30%.”
Eduardo Moura, atual presidente da Assocon e proprietário da Marca Agropecuária, de Barra do Garças (MT), reforça o grupo dos otimistas. Moura aposta no confinamento porque, apesar do encarecimento do milho – que é a principal fonte de alimento dos animais -, a cotação da arroba bovina melhorou. “Embora ela tenha dado sinais de instabilidade no final da safra, deve ganhar força nos próximos meses”, diz Moura. Ele prega entre seus pares a busca de maior rentabilidade através da eficiência nas negociações com os frigoríficos e no preparo da mão de obra destinada aos confinamentos, para evitar desperdícios na alimentação do gado, um dos gargalos da atividade. “A seca do ano passado, que deixou muita gente sem pastos ainda não recuperados em Mato Grosso, forçará os pecuaristas a levar os animais para algum confinamento”, afirma Moura. “O resultado pode vir pela necessidade.” A Marca Agropecuária confinará 40 mil bovinos em 2011, aumento de 81,8% em relação ao ano passado.