Ao assumir pela terceira vez como presidente da República em exercício, o vice Geraldo Alckmin declinou novamente do convite feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que se sentasse em sua cadeira no Palácio do Planalto durante a viagem do petista à China. Mas, Alckmin, que acumula o cargo de ministro da Indústria e Comércio, preferiu despachar em uma sala de reuniões ao lado do gabinete presidencial. De novo.

Já na primeira viagem de Lula ao exterior, em janeiro, Lula insistiu para que o vice trabalhasse de sua sala, usasse sua mesa e se sentasse em sua cadeira que, segundo ele, “não morde, mas afaga”. Alckmin respondeu que usaria a sala, mas a cadeira jamais. E lembrou que nunca usou a cadeira de Mário Covas quando ele, então tucano, era seu vice no governo paulista entre 1995 e 2001. “A cadeira é do presidente”, afirmou.

Lula gosta de repetir essa história em conversas reservadas e a contou, em tom bem humorado, aos 27 governadores antes da 1° reunião com o grupo, que aconteceu logo depois do retorno da viagem a Buenos Aires e Montevidéu, em janeiro.

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Manter distância da cadeira presidencial é mais um dos gestos de Alckmin para demonstrar lealdade e evitar melindres após a traumática transição entre Dilma Rousseff e seu vice, Michel Temer, que até hoje é chamado de “golpista” por petistas.

O ex-governador paulista, que disputou a Presidência contra Lula em 2006 e construiu sua carreira no PSDB, manteve, nestes pouco mais de 100 dias de governo, um alinhamento total com a agenda e narrativas de Lula, cumprindo de forma disciplinada todas as missões designadas a ele em múltiplas frentes. Seus discursos, mesmo quando na condição de ministro, quase sempre começam com o preâmbulo “sob a liderança do presidente Lula”.

Como presidente em exercício, Alckmin cumpriu 53 agendas nas três vezes em que o titular foi para o exterior. Nessas passagens, aproveitou a liturgia do cargo para afagar políticos de partidos de oposição que não têm pontes com Lula e o PT, além de se reunir com lideranças do seu partido, o PSB.

No momento em que os articuladores de Lula tentam consolidar uma base no Congresso e se equilibram nas divisões do Centrão, o presidente em exercício recebeu políticos como os senadores Laercio Ribeiro (PP-SE) e Carlos Vianna (Podemos-MG), e os deputados Fernando Faria (PSD-MG) e Simone Marquetto (MDB-SP).

Como vice-presidente também recebeu para um café políticos bolsonaristas, como o deputado Ricardo Barros (PP) e os governadores de Rondônia, Marcos Rocha (UB) e de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL).

Na rotina de Brasília, Alckmin passa as manhãs no gabinete da vice-presidência em um prédio anexo ao Palácio do Planalto, e, à tarde, trabalha no Ministério do Desenvolvimento, que fica no último bloco da Esplanada dos Ministérios.

Além de construir pontes com o empresariado, em especial do agronegócio, que é refratário a Lula, o vice-presidente entrou ao lado do ministro da Defesa, José Múcio, na força-tarefa criada para distensionar a relação com os militares.

Como coordenador do programa de reestruturação da indústria da Defesa, Alckmin mantém linha direta com os comandantes da Forças Armadas, que pleiteiam recursos para o programa Astros 2020 – um sofisticado (e caro) sistema de lançadores múltiplos de mísseis.

Nos finais de semana que fica em Brasília, o vice-presidente mantém um hábito antigo: encontrar amigos e aliados em padarias da região. Já quando vai a São Paulo, seu passatempo é outro: capinar o terreno do seu sítio em Pindamonhangaba.