Prometida pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, a correção da faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) para R$ 5 mil virou “tema tabu” nas negociações da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de Transição. Ninguém quer falar sobre a promessa de campanha na equipe.

Os integrantes do time de Lula, que participaram da primeira reunião de transição no Congresso, evitaram discutir o tema agora e afirmaram que o assunto será tratado somente depois, podendo ficar para o ano que vem, já com o petista na cadeira presidencial.

“Não tratamos (na PEC) da tabela do Imposto de Renda”, disse o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), que participou da reunião da equipe de transição com o relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI).

“Isso não dá tempo”, afirmou o deputado Enio Verri (PT-PR), que comanda a bancada do PT na Comissão Mista de Orçamento (CMO).

O Centrão quer tirar receita do próximo governo ano com a aprovação de projeto que corrige a faixa de isenção da para R$ 5,2 mil de uma única vez, enquanto a estratégia petista é justamente fazer o ajuste da tabela ao longo do tempo para poder implementar outras medidas alternativas, como a desoneração da folha de salários (corte dos encargos cobrados sobre os salários dos funcionários) junto com uma reforma ampla do IR.

O Estadão apurou que o time de Lula estava também fazendo um modelo de desenho de correção da tabela do IRPF que possibilite reduzir o imposto a pagar de quem ganha R$ 5 mil, sem necessariamente ampliar tanto a faixa de isenção. Uma engenharia complexa que exige tempo, muitas contas e uma visão integrada da reforma do Imposto de Renda, muito diferente de uma simples correção da faixa de isenção.

Na prática, aumentar a isenção do Imposto de Renda diminui a arrecadação do governo e o dinheiro disponível para gastar com manutenção dos órgãos públicos, programas sociais e investimentos. Com um espaço a mais no teto de gastos, diminuir a receita passaria a ser nova forma de o Congresso limitar o Executivo.

Esse cenário ficou claro depois que projeto apresentado pelo deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), da tropa de choque do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pode entrar em votação na Câmara. A proposta foi feita sob medida com a promessa de Lula, o que torna muito mais difícil para o PT buscar uma alternativa. “Para ter a suplementação que o novo governo quer, tem que ter receita. Quando se trabalha com previsibilidade, é melhor”, disse Forte.

Aliados de Lira já defendem abertamente a votação do projeto ainda durante a transição, o que faria Lula assumir a Presidência em janeiro com uma receita menor. “A isenção tem que ser discutida agora para ser implementada no ano que vem. A proposta é positiva, vai contemplar milhares de pessoas que estão pagando Imposto de Renda hoje e vai criar um aparato melhor para a economia do País”, disse o deputado Hélio Leite (União-PA), relator da receita do Orçamento de 2023. Se a proposta for aprovada, o relatório da peça orçamentária já deverá incorporar a queda de arrecadação. “Se também for a intenção do governo eleito, temos que avaliar para buscar o complemento do que o futuro governo deseja.”

Essa movimentação é vista dentro do PT como uma tentativa de Lira de impor essa pauta. O temor de integrantes da cúpula do PT é que Lula tome posse já tendo de assumir uma tesourada na arrecadação. Petistas lembram que a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês é uma promessa do presidente eleito, mas que isso poderá ser colocado em prática durante o governo, mais tarde, o que é diferente de ter que enfrentar uma queda de receita na largada.

A perda de arrecadação é muito forte o que limita o espaço para outras medidas na área tributária, como a desoneração da folha das empresas, e reforça cenário de piora do déficit previsto para o ano que vem com a licença para gastar (fora do teto de gastos) que o novo governo negocia com os parlamentares.

Cálculos da XP investimentos de isentar renda acima de R$ 5 mil apontam que as propostas de correção da tabela do IRPF podem levar a uma renúncia de receita entre R$ 108 bilhões e R$ 195 bilhões. Essa é uma preocupação que acende o alerta amarelo do mercado.

Embora a perda de arrecadação com a correção da tabela não tenha impacto na decisão do valor do “waiver” (licença para gastar) que o governo quer aprovar com a PEC da Transição, ela aumenta a déficit previsto para o ano que vem que já está contratado com a expansão de gastos que o PT quer aprovar para cumprir as promessas de Lula.