A Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio) anunciou nesta quinta-feira, 5, a suspensão temporária da Lista Nacional Oficial de Espécies Exóticas Invasoras, que incluía a tilápia. O recuo ocorreu após forte pressão do agro. O setor temia novas restrições à criação do peixe no país.

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Após o anúncio do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, a reação foi imediata. A Associação Brasileira da Piscicultura (Peixes BR) comemorou a suspensão da lista por meio de um vídeo enviado pelo presidente da entidade à imprensa.

“Uma grande vitória do setor, uma briga que começamos e que várias instituições públicas e privadas abraçaram junto. Agora temos a etapa seguinte: a nota diz que o tema seguirá sendo discutido. Temos que continuar mobilizados”, afirmou Francisco Medeiros, presidente da Peixes BR.

Na nota divulgada pelo MMA, o ministério argumenta que a medida visa ampliar as consultas aos setores econômicos que utilizam essas espécies, a fim de definir medidas adequadas para a formulação de políticas e procedimentos de controle do escape no ambiente natural, compatíveis com a atividade produtiva. Veja a nota ao fim da matéria.

Outra entidade que celebrou a suspensão foi a Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (Abipesca).

“A Abipesca parabeniza o MMA por suspender temporariamente a elaboração da Lista Nacional de Espécies Exóticas Invasoras, medida que demonstra responsabilidade e abertura ao diálogo com os setores produtivos diretamente impactados.

A iniciativa representa um reconhecimento da importância econômica e social das cadeias produtivas que utilizam espécies atualmente classificadas como exóticas, muitas delas fundamentais para a geração de empregos, renda e abastecimento alimentar no país. Ao ampliar o processo de consulta aos setores envolvidos, a medida assegura que qualquer decisão futura seja construída com equilíbrio, previsibilidade e segurança regulatória, evitando impactos negativos que poderiam afetar milhares de produtores, indústrias, trabalhadores e consumidores brasileiros.

Por fim, a Abipesca – que representa mais de 90% das exportações brasileiras – reafirma sua total disposição para participar da discussão com o MMA, a Conabio e todos os órgãos envolvidos nesse processo, oferecendo dados, análises e contribuições técnicas que auxiliem na elaboração de um instrumento que concilie a proteção da biodiversidade brasileira com a continuidade das atividades produtivas essenciais ao país”, afirmou a entidade.

Entenda o caso

A tilápia foi incluída na Lista Nacional Oficial de Espécies Exóticas Invasoras da Conabio, órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. O motivo é simples: a espécie não é natural do Brasil, mas originária da bacia do Rio Nilo, no continente africano, o que a caracteriza como exótica.

Uma espécie é considerada invasora quando passa a ocupar ambientes onde não é nativa. No caso da tilápia, indivíduos têm sido encontrados em rios fora das áreas de produção, provocando desequilíbrios naturais.

A tilápia não é a única espécie não nativa amplamente cultivada no país. Diversos cultivos fundamentais ao agro brasileiro vieram de outras partes do mundo e se adaptaram muito bem, como a soja (China), a cana-de-açúcar (Sudeste Asiático) e o café (África). Mas isso não é regra.

“Nem toda espécie exótica se adapta com facilidade. A tilápia conseguiu se estabelecer porque é altamente resiliente e possui grande capacidade de reprodução. Em outros casos isso não ocorre, como com o bagre-africano: ele já foi cultivado no Brasil, perdeu interesse comercial e hoje aparece em alguns rios, mas não se tornou dominante. Ainda assim, por ser um predador, representa risco para outras espécies”, explica Douglas Veloso Oliveira, pesquisador e técnico de laboratório de piscicultura da Universidade Una.

Oliveira destaca que a tilápia disputa espaço com peixes nativos de rios, lagos, represas e reservatórios. Seu crescimento acelerado e a produção intensiva podem alterar a qualidade da água, prejudicando espécies mais sensíveis.

“Quando a tilápia escapa de criatórios, geralmente por falhas estruturais ou situações excepcionais, como enchentes, ela ocupa ambientes onde originalmente não existia, tornando-se invasora. Seu alto potencial reprodutivo aumenta rapidamente a biomassa em rios, lagos e represas, o que pode alterar a qualidade da água, favorecendo a tilápia, mas prejudicando espécies nativas. Além disso, apesar de ser onívora, a tilápia pode consumir larvas e peixes pequenos de outras espécies, afetando o equilíbrio ecológico”, afirma.

Veja a nota do MMA na íntegra:

“A Presidência da Comissão Nacional de Biodiversidade (CONABIO), exercida pela Secretaria Nacional de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais (SBio) do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), comunica a suspensão temporária do processo de elaboração da Lista Nacional de Espécies Exóticas Invasoras Presentes no Brasil.

A medida visa ampliar as consultas aos setores econômicos que utilizam essas espécies, a fim de definir medidas adequadas à formulação de políticas e procedimentos de controle do escape no ambiente natural, compatíveis com a atividade produtiva.

A análise será retomada após a consolidação das contribuições de todos os segmentos interessados, que será submetida à apreciação da CONABIO, formada por 12 ministérios, autarquias e representantes dos setores produtivos da agricultura, pecuária e indústria, órgãos estaduais e municipais de meio ambiente, universidades e institutos de pesquisa, agricultura familiar, pescadores artesanais, povos indígenas e comunidades tradicionais, entre outros.

Destaca-se que o estabelecimento da Lista Nacional de Espécies Exóticas Invasoras Presentes no Brasil decorre de um processo técnico, lastreado em informações científicas aprofundadas, e possui caráter preventivo, não implicando banimento, proibição de uso ou cultivo. O reconhecimento e a identificação dessas espécies visa permitir a detecção precoce e resposta rápida em caso de invasões biológicas, evitando impactos negativos sobre a biodiversidade nativa.”