04/11/2022 - 17:03
A utilização de remédios para emagrecer em excesso e sem a prescrição médica pode causar dependência química e também provocar sérios riscos à saúde. Por isso, assim como qualquer outro medicamento, especialistas alertam sobre a importância de acompanhamento médico para que o tratamento seja feito da forma correta. Na quinta-feira, 3, a apresentadora da Globo Maria Cândida, que comanda o programa Bem Estar, compartilhou com seguidores nas redes sociais sua experiência pessoal de vício em remédios para perder peso. Ela descreveu ainda que sofreu com a compulsão alimentar e a busca por um “corpo perfeito”.
“Na adolescência, nos primeiros castings para modelo, sempre escutava ‘precisa emagrecer 10kg’, e essa frase entrou na minha mente como obsessão que me levava a comer mais e mais”, disse. “Frustrada, conheci mil ‘fórmulas mágicas’ que resolviam o ‘problema’ ali. O remédio me causou dependência química, me levou para a compulsão alimentar, afetou meu quadro depressivo, sofri com insônia, ficava com o coração acelerado, já desmaiei, perdi porcentagem importante de músculos, vitaminas e minerais”, desabafou Maria Cândida.
A apresentadora citou ainda o efeito rebote. “Engordava tudo de novo, além de me sentir péssima como pessoa por não ter a força de vontade para seguir sem (os remédios). Mas entenda: força de vontade eu até tinha, mas meu corpo pedia mais e mais anfetaminas”, publicou.
Ela aproveitou a ocasião para alertar seus seguidores. “Não faça isso com seu corpo, com sua mente! Você não precisa respeitar padrões inalcançáveis, pois o custo de uma dieta restritiva é muito alto”, afirmou.
Efeitos colaterais
“São medicamentos extremamente complicados que podem dar diversos tipos de efeitos colaterais e que precisam ser usados com cautela, e sempre por uma equipe multidisciplinar, tem que ter um endocrinologista, tem que ter um psicólogo ou psiquiatra, para poder orientar bem o paciente”, alerta Gustavo Patury, cirurgião do aparelho digestivo e cirurgião bariátrico nos hospitais São Luiz Itaim e Vila Nova Star.
As anfetaminas, por exemplo, aceleram a perda de peso ao inibirem totalmente o apetite durante a ação de suas substâncias no organismo e podem causar dependência e outros efeitos colaterais. “As anfetaminas têm potencial de causar efeitos adversos como palpitações, irritabilidade, arritmias e aumento do risco de eventos cardiovasculares, como infarto e Acidente Vascular Cerebral (AVC). Por esse motivo, algumas delas (anfepramona, mazindol e femproporex) foram proibidas no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, afirma Renata Marques, endocrinologista do Instituto EndoVitta.
Segundo Patury, no tratamento para obesidade e sobrepeso, sempre há uma equipe multidisciplinar focada na mudança do hábito alimentar e da vida do paciente. “Às vezes, utilizamos de artifícios como algumas medicações ou às vezes – até em casos de obesidade extrema – realizamos uma cirurgia bariátrica”, afirma ele.
Conforme Renata, tanto a obesidade quanto a compulsão alimentar são doenças crônicas e as medicações são mantidas em longo prazo no tratamento. “O que geralmente acontece é que o indivíduo se acostuma a fazer uso das medicações para perda de peso e, ao suspendê-las, o organismo sente e pode gerar efeitos colaterais indesejáveis. Por esse motivo, é tão importante o acompanhamento médico tanto na introdução quanto na suspensão destes tipos de medicamentos”, aconselha ela.
Em quais situações a pessoa pode ficar viciada em remédios para emagrecer?
Para o integrante da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, geralmente, são aqueles pacientes que podem até já ter algum distúrbio alimentar e estão procurando uma perda de peso mais acentuada e mais rápida.
“O paciente toma, por exemplo, uma medicação por uns dois meses, interrompe e tem o reganho de peso. Depois tem que ficar voltando com a medicação”, afirma. “Então, é sempre bom procurar ajuda de um endocrinologista, um psicólogo e de um psiquiatra para entender bem o caso e para poder evitar esses casos de vícios, principalmente destes tipos de medicações que podem levar à hipertensão arterial e causar sérios problemas até como um enfarte ou AVC.”
A compulsão alimentar é uma dessas situações?
“Geralmente, a compulsão alimentar acontece quando a pessoa come quando não está com fome, acaba comendo escondida e tem aquele sentimento de culpa. Também come demasiadamente várias vezes ao dia. Isso acaba fazendo com que a pessoa procure diversas formas para tentar perder peso e acaba indo para esses tipos de medicações ou às vezes até chás emagrecedores”, afirma Patury.
Desta forma, os episódios compulsivos devem ser reconhecidos e valorizados. “A compulsão alimentar é caracterizada por episódios recorrentes de ingestão de grandes quantidades de alimentos, com sensação de perda de controle e sentimento de culpa. Pode vir acompanhada de outros problemas, como ansiedade e depressão. Assim, o tratamento inclui tanto o uso de medicações como o acompanhamento psicológico ou psiquiátrico”, salienta a endocrinologista do Instituto EndoVitta.
E o risco da busca por um ‘corpo padrão’?
É importante que o paciente foque sempre na sua saúde. “Quando indicamos a cirurgia bariátrica para aqueles pacientes que têm o índice de massa acima de 35, que já têm uma obesidade grau 02, estamos focando justamente na saúde e em melhorar distúrbios metabólicos, melhorar a resistência insulínica, a melhoria de diabetes, de hipertensão e a melhoria de apneia do sono”, explica o cirurgião do aparelho digestivo.
Patury alerta sobre os riscos que a busca pelo “corpo perfeito” pode causar. “Cada pessoa é individualizada, cada pessoa vai ter o seu padrão de corpo, cada pessoa tem o seu metabolismo, então isso acaba gerando uma ansiedade muito grande nos pacientes e uma tristeza muito grande, porque geralmente eles ficam tentando chegar nesse ‘corpo padrão’ e, infelizmente, acabam não conseguindo porque não ele não existe”, reforça ele.
A endocrinologista do Instituto EndoVitta acrescenta que a busca por um “corpo padrão” é um grande mal da sociedade atualmente. “A indústria da beleza, a divulgação da imagem nas redes sociais e a comparação do próprio corpo com os ‘estereótipos padrões’ acabam gerando grande pressão pela busca do corpo ‘perfeito’. Tudo isso dificulta a aceitação da própria imagem e leva muitas pessoas à insatisfação pessoal, podendo até mesmo acarretar transtornos psicológicos, psiquiátricos e alimentares”, explica Renata Marques.
Quais os riscos do uso excessivo de remédios para emagrecer?
Hoje em dia há várias medicações aprovadas para tratar obesidade e que podem ser usadas desde que sob acompanhamento médico, segundo Renata Marques. “Porém, seu uso em excesso pode gerar inúmeros efeitos adversos, como piora da ansiedade, picos hipertensivos, sudorese, náuseas e palpitações. O uso de fórmulas combinadas, anabolizantes e medicações sem prescrição médica podem inclusive causar distúrbios graves como arritmias, infarto agudo do miocárdio e outros disfunções hormonais”, alerta a endocrinologista do Instituto EndoVitta.
As anfetaminas, por exemplo, são substâncias que estimulam a atividade do sistema nervoso central e podem ter como efeito a redução do apetite. “Elas têm potencial de causar efeitos adversos como palpitações, irritabilidade, arritmias e aumento do risco de eventos cardiovasculares, como infarto e AVC. Por esse motivo, algumas delas (anfepramona, mazindol e femproporex) foram proibidas no Brasil pela Anvisa”, afirma Renata.
Todos os medicamentos para emagrecer são de uso controlado?
Algumas medicações são de uso controlado e necessitam de receituário especial e até mesmo de termo de consentimento assinado pelo paciente e pelo médico que prescreve. Outras são vendidas sem receita médica. No entanto, para saber qual a indicação, a dose, o melhor horário e a forma de tomar a medicação, é necessário o acompanhamento médico.
E o risco de a pessoa voltar a engordar novamente?
Segundo Patury, os medicamentos que geralmente provocam perda de peso muito acentuada em curto espaço de tempo, como chás e dietas milagrosas, são os que acabam levando o paciente a um reganho de peso. “Por isso, eu sempre friso bastante para meus pacientes que o ideal é justamente focar na mudança de hábito alimentar e no hábito de vida. O paciente tem que se conscientizar de que ele tem que fazer uma mudança estrutural na vida dele, não só do ponto de vista alimentar, mas do ponto de vista de hábitos também, como atividade física e meditação”, acrescenta.
No caso de pessoas obesas, qualquer perda de peso é significativa a partir do momento em que o paciente começa a ter mudanças metabólicas que ajudam a diminuir, por exemplo, o risco de diabetes e outras doenças.
Quais substâncias mais causam dependência?
“Vários grupos de fármacos podem causar dependência, principalmente os benzodiazepínicos, alguns indutores de sono e alguns agentes psicoestiumulantes. É fundamental que a pessoa se informe sobre efeitos desejados e adversos (não só dependência) com o profissional prescritor e, mais ainda, que a pessoa jamais se automedique ou siga indicações de profissionais não aptos a prescrever um fármaco”, afirma Adriano Segal, psiquiatra da Universidade de São Paulo (USP) e membro do departamento de psiquiatria da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).
Segundo ele, é importante lembrar também que, via de regra, os fármacos são apenas parte de um tratamento e não o tratamento em si, especialmente para doenças crônicas e com reincidência, como a obesidade.
Qual a importância do acompanhamento psiquiátrico e de outros especialistas?
O acompanhamento psiquiátrico, assim como de outros profissionais dependendo da particularidade do caso, é essencial para ajudar o paciente. “Não só os chamados transtornos de uso de substâncias (lícitas ou ilícitas) são quadros psiquiátricos, mas, também, há elevada associação de abuso/dependência de substâncias com outros quadros psiquiátricos”, afirma Segal. “O correto tratamento inclui, além do psiquiatra, a psicologia e a área clínica. Outros profissionais podem ser recrutados de acordo com as particularidades.”
Quais as dicas sobre as formas corretas de emagrecimento?
“Colocar o exercício físico como um hábito, ter uma alimentação equilibrada, rica em frutas e verduras, evitar alimentos multiprocessados e industrializados, em que geralmente tem uma grande quantidade de calorias em pequenas porções. Fazer o que a gente chama de ‘mindful eating’, que na verdade é parar, sentar para fazer a refeição, sentir o cheiro, sentir o gosto, evitar comer em frente à televisão, evitar comer no trabalho e evitar comer mexendo no celular, porque você acaba ficando disperso e comendo às vezes cada vez mais”, orienta Patury.
A endocrinologista Renata Marques concorda que as pessoas precisam entender que o emagrecimento tem de ser um processo natural e fisiológico. “Para emagrecer com saúde, é fundamental a mudança do estilo de vida. Isso inclui uma alimentação equilibrada, prática de atividades físicas, garantir uma rotina de sono, praticar atividades de lazer e buscar relações interpessoais equilibradas”, aconselha.
Além disso, mantendo acompanhamento médico regular, também há indicação do tratamento com medicações, caso seja necessário.