Após safras produtivas “até demais” e uma série de combinações que puxaram os preços para baixo, produtores de arroz começaram a reavaliar o plantio do cereal para a safra 2025/26. As preocupações devem se refletir área plantada, que deve ser até 5,6% menor neste ciclo, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

A diminuição do plantio deve resultar em uma produção 10% menor em relação à safra anterior, estimada em 12,1 milhões de toneladas. A previsão é que a produção nacional de arroz em 2025/26 se estabeleça em 11,4 milhões de toneladas.

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O relatório Agro Mensal da consultoria Itaú BBA aponta que o início do plantio tem sido desafiador para os arrozeiros, em um ritmo mais lento em comparação às temporadas anteriores, sobretudo no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. O estado gaúcho é responsável por aproximadamente 80% da produção nacional do grão.

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Segundo a consultoria, a retração pode contribuir para um maior equilíbrio entre oferta e demanda, considerando que o consumo interno segue estável. O relatório alerta não haver riscos para uma possível escassez de arroz, já que os estoques finais da safra atual indicam um certo “conforto”. A solução para esvaziar os estoques? Aumentar as vendas externas. O que vem sendo difícil em um cenário atual em que a balança brasileira foi negativa em setembro. Veja: 

Balança comercial do arroz: Importações x Exportações

Dados: Itaú BBA agro/ Gráfico: IstoÉ Dinheiro

Produtores migrando para outros cultivos

Produtor no principal estado arrozeiro do país, o gaúcho Ciro Alberto Kuhnen contou à Dinheiro Rural que o momento é delicado para os agricultores. Ele atribui o momento negativo aos custos elevados da produção, à “concorrência desleal” com o arroz estrangeiro e à falta de crédito para produtores que estão se endividando.

Ciro Alberto Kuhnen, produtor de arroz no Rio Grande do Sul (Foto: Arquivo pessoal)

“Estamos plantando desanimados com esse preço. A gente está fazendo dívida, a ampla maioria é de produtores é arrendatário e trabalha com dinheiro de financiamento bancário. A gente está fazendo conta para pagar no ano que vem, sonhando que melhore, porque, se as coisas estiverem como estão hoje, a gente não consegue pagar as contas”, afirma.

Kuhnen tem uma produção de 120 hectares de arroz na região metropolitana de Porto Alegre. Ele planeja reduzir sua produção em até 10% nesta safra. O produtor projeta colher aproximadamente 12 mil quilos por hectare, o que, segundo conta, será suficiente somente para arcar com os custos.

“Nosso problema não é apenas que o preço estar baixo, são os custos que dispararam. Tenho um trator que comprei em 2016 por R$ 160 mil. Hoje em dia, se eu procurar, não encontro por menos de R$ 450 mil”, conta.

Produção de arroz de Ciro Kuhnen (Crédito: Arquivo pessoal)

Com este panorama, a expectativa é que vários produtores, como o Ciro, optem por plantar outras culturas, como soja, milho ou até mesmo pastagens nesta safra, em substituição ao arroz. Ainda assim, o processo de substituição é desafiador.

“Acho que uns 60% da área de arroz é dedicada exclusivamente ao cultivo do cereal, é banhado. É área molhada, não tem como plantar outra cultura, a não ser gado. Mas gado também é complicado, porque não é de uma hora para outra que vai conseguir migrar totalmente de uma área de grão para uma área de campo”, conclui o produtor.

Para o diretor da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), Anderson Belloli, os produtores de arroz estão passando por uma crise poucas vezes vista, graças a um combo de situações que dificultam a vida dos agricultores. “Vemos hoje um combo de endividamento como jamais se viu ao produtor rural, aliado, evidentemente, a esse prejuízo dessa safra. Uma dificuldade de repactuação muito grande.”

Ele explica que, comparativamente, produzir arroz não tem sido vantajoso, apontando que o investimento em uma lavoura gira em torno de R$ 14 mil a R$ 15 mil por hectare. Para efeito de comparação, implantar soja custa, em média, R$ 4 mil por hectare.

Isso ocorre porque a lavoura de arroz no Rio Grande do Sul é predominantemente de arroz irrigado, o que exige um investimento em infraestrutura, manejo de água e insumos muito mais complexo e custoso do que a soja, que é uma cultura de sequeiro.

O custo de produção do arroz está estimado entre R$ 85 e R$ 95 por saca, mas o preço de mercado ofertado ao produtor gira em torno de apenas R$ 55.

Ajuda da Conab

A Conab anunciou, na quarta-feira, 22, em Porto Alegre, um novo pacote de medidas para movimentar cerca de 630 mil toneladas de arroz da safra 2024/25. O objetivo da estatal é reequilibrar os preços de mercado e escoar o excedente.

A companhia prevê investir R$ 300 milhões por meio de instrumentos da Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). Nesta nova etapa, serão empregados os mecanismos de Prêmio para Escoamento de Produto (PEP), Prêmio Equalizador Pago ao Produtor Rural (Pepro) e Aquisições do Governo Federal (AGF), acionados quando o preço de mercado de um produto agrícola fica abaixo do preço mínimo fixado pelo governo federal.

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“A Conab também se preocupa em incentivar o produtor a seguir plantando arroz. E é isso que estamos fazendo aqui, porque o agricultor, antes de colocar a semente na terra, faz as contas. Se não valer a pena plantar arroz, ele muda para outra cultura. É isso que queremos evitar com essas medidas”, disse o presidente da Conab, Edegar Pretto, em coletiva de imprensa.

Entenda como vai funcionar:

A previsão da Conab é que as operações de PEP e Pepro movimentem, juntas, cerca de 500 mil toneladas de arroz – o volume total dependerá das regiões que irão arrematar as ofertas em leilão. As operações devem começar em, no máximo, 15 dias.

  • PEP: Conab concede uma subvenção econômica a indústrias e comerciantes que adquirirem o arroz diretamente de produtores ou cooperativas pelo preço mínimo, com o compromisso de escoá-lo para fora da região Sul.
  • Pepro: Pago diretamente ao produtor que participar dos leilões. Para recebê-lo, ele deve comprovar a venda e o escoamento do arroz por um valor que, somado ao prêmio, resulte no preço mínimo. Está previsto um investimento de cerca de R$ 100 milhões para o uso dessas ferramentas.
  • AGF: Permite ao governo federal adquirir o arroz diretamente dos agricultores, formando estoques públicos estratégicos. A estimativa da estatal é adquirir 130 mil toneladas, com um investimento de até R$ 200 milhões.

*Estagiário sob supervisão