Em agosto do ano passado, em Caen, na Normandia, na França, um brasileiro invadia mais uma vez um espaço que, até pouco tempo antes, não era dele. SJ Rodopio, 12 anos, um cavalo da raça crioulo, era uma das promessas para os Jogos Equestres Mundiais (WEG, na sigla em inglês). Juntamente com o cavaleiro Wellington Teixeira, o animal se misturava ao time de campeões mundiais. Rodopio e mais três animais da raça quarto de milha formavam o time nacional da modalidade de rédeas, que testa a precisão de movimentos do animal, exigindo o mínimo esforço do cavaleiro. A equipe não retornou ao País com medalhas, mas para a raça crioulo sua participação valeu como se fosse ouro, pois, pela segunda vez consecutiva quebrava a hegemonia do quarto de milha no mundial. “Historicamente, iam somente animais quarto de milha para essa competição”, diz Onécio Prado Júnior, criador de cavalos crioulos em Santa Rita do Passa Quatro (SP), dono de Rodopio, e vice-presidente de comunicação e marketing da Associação Brasileira de Criadores de Cavalo Crioulo (ABCCC), com sede em Pelotas (RS). “Participar de eventos ajuda a tirar da raça crioulo o estigma de ‘cavalo do gaúcho’ e mostra o animal como um atleta capaz de disputar espaço com todas as raças.”


“Para um cavalo isso é muito, além de ser um feito para poucos” Francisco Moura,presidente da ANCR

A exemplo de Rodopio, muitos cavalos crioulos estão cada vez mais perto dos mundiais. O cavalo de Prado Júnior, que também já havia participado no WEG de 2010, em Lexington, nos Estados Unidos, mostrou que é possível fazer carreira internacional. Para o engenheiro Francisco Moura, presidente da Associação Nacional de Cavalo de Rédeas (ANCR), criador de quarto de milha e competidor na modalidade, a participação do cavalo crioulo foi um grande acontecimento. “Para um cavalo, isso é muito, além de ser um feito para poucos”, diz Moura. Segundo a ANCR, que faz as seletivas para essas competições internacionais, a presença da raça revela o trabalho de incentivo da seleção genética dos animais, realizado pela ABCCC,  além da popularização da prova de rédeas. “Eles têm feito um trabalho modelar”, diz Moura.

Exemplo disso é a realização do campeonato Rédeas de Ouro em São Paulo, em setembro, uma competição que briga em pé de igualdade com o Freio de Ouro, o maior evento da raça crioulo no País e que tem sua final tradicionalmente realizada em Esteio (RS). A grande final do certame, que entrou no calendário dos esportes tradicionais da ABCCC em 2000, passa a acontecer em São Paulo, justamente no ano que marca oficialmente a fixação de um escritório da ABCCC, no Parque da Água Branca, na capital. “Os dois eventos têm uma função. Além de fortalecer a presença do crioulo fora do Rio Grande do Sul, queremos incentivar ainda mais esse esporte”, diz Prado Júnior. De acordo com ele é a aposta certa para os planos de expansão da raça, que hoje forma um rebanho de 380 mil animais, dos quais 30 mil possuem registro. “A princípio, a modalidade de rédeas poderá fazer esse papel”, diz Prado Júnior.


“Participar de eventos ajuda a tirar da raça crioulo o estigma de cavalo do gaúcho” Onécio Prado Júnior,vice-presidente da ABCCC

A participação no torneio Rédeas de Ouro é considerado uma boa estratégia por remeter ao adestramento clássico, e por atrair muito o público urbano, além de pagar bem mais, tanto aqui como lá fora: no Brasil, as premiações chegam a mais de US$ 300 mil, anualmente, enquanto nas competições americanas rendem mais de US$ 1 milhão. Teixeira, o parceiro de SJ Rodopio, que o diga. Montador profissional de rédeas há 21 anos, o goiano de Senador Canedo, município colado à capital do Estado, fez sua vida no esporte. Atualmente, ele é o 19º no ranking da ANCR, acumulando R$ 82 mil em prêmios. “Mas acho que poderia ser bem mais”, diz Teixeira. “Passei por alguns problemas, mas vou recuperar”. Ainda neste ano, ele quer estar entre os dez melhores atletas de rédeas do País. Vontade e treino não faltam. Teixeira é dono de um centro de treinamento de cavalos onde treinam 40 animais, dos quais 15 são crioulos, incluindo aí seu parceiro de mundiais. E ao que tudo indica, a genética campeã está com ele. Ao todo, oito filhos do Rodopio vão ser encaminhados para as provas. “Ganha-se bem e o trabalho é muito gratificante, além de ser uma velha paixão de infância”, diz Teixeira.