04/11/2022 - 21:45
O desempenho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Nordeste, seu principal reduto no País, explica apenas em parte a vitória do último domingo, 30. A taxa de votos do petista se manteve estável na região, em comparação com a de Fernando Haddad (PT) em 2018. A diferença nos resultados dos dois foi o aumento de votos de Lula no Centro-Oeste, no Sul e no Sudeste e, consequentemente, a queda do presidente Jair Bolsonaro (PL) nesses locais.
No segundo turno, Lula obteve 69% dos votos válidos no Nordeste, um total de 22,5 milhões de votos absolutos. Há quatro anos, Haddad obteve a confiança de 70% dos eleitores na mesma região, conquistando 20,2 milhões de votos. A proporção em porcentagem é semelhante porque ela é calculada sobre o total dos votos válidos, que sofreu alterações entre as duas eleições devido ao aumento da quantidade do eleitorado. No Norte, Lula obteve 49% dos votos válidos, contra 48% de Haddad há quatro anos.
Em comparação com o desempenho de Haddad há quatro anos, o ex-presidente cresceu proporcionalmente no Sudeste, conquistando 46% do eleitorado. Em 2018, o ex-prefeito da capital teve 35% dos votos válidos. Como mostrou o Estadão, durante o segundo turno, Lula e Bolsonaro focaram na região que concentra 42% dos eleitores e que, no primeiro turno, foi a que mais depositou votos em candidatos fora da polarização. Os adversários chegaram até a repetir agendas nos Estados.
A expansão do PT também foi vista no Sul, com um crescimento de 6 pontos porcentuais entre as duas eleições: Haddad teve 32% dos votos válidos em 2018; Lula, 38% este ano. Um cenário semelhante ocorreu no Centro-Oeste com um aumento de 7 pontos porcentuais. Há quatro anos, Haddad teve 33% enquanto Lula fechou com 40%.
Analistas ouvidos pelo Estadão apontam diversas razões para o avanço do PT no Sudeste, enfraquecendo Bolsonaro. Para o pesquisador do Centro de Política e Economia do Setor Público da FGV, Arthur Fisch, a imagem do chefe do Executivo sofreu desgaste entre as duas eleições. Na visão dele, isso foi fundamental nessa movimentação de votos.
“Em 2018, Bolsonaro era o candidato que tentava um cargo no Executivo pela primeira vez, então ele entrou como uma novidade, com um discurso de mudança que, depois das eleições, muito não se concretizou. A população se frustra nesse sentido e, na sequência, tem dois pontos: a condução dele na pandemia, que o atrapalha com os votos, e o fato dele deixar de ser novidade e passar a ter uma rejeição maior”, disse.
Mesmo que tenha batido o recorde com 58,2 milhões de voto no 2º turno, o presidente Bolsonaro teve um desempenho menor do que há quatro anos no plano nacional. Nesta eleição, o chefe do Executivo obteve 49% dos votos válidos; em 2018 foi 55%.
A cientista política e professora da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo Tathiana Chicarino cita, como um dos fatores da perda de votos do presidente, a inflação, tema que foi explorado pela campanha petista. “O bolso das pessoas foi um dos elementos para a formulação do voto e isso a campanha do Lula trabalhou muito fortemente. Inclusive, fazendo, no segundo turno, um diálogo muito mais interessante entre passado e futuro do que foi feito no primeiro turno”, afirma Tathiana.
Rodrigo Stumpf Gonzalez, cientista político e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), diz que a expansão dos votos do PT nessas regiões, em comparação com 2018, pode ser justificado ainda pela composição da chapa petista. “A candidatura do Haddad e da Manuela (d’Avila) pela própria identificação dos partidos era uma candidatura, digamos, à esquerda da candidatura do Lula e do Alckmin. O nome Partido Comunista (do Brasil, sigla de Manoela), ainda que o partido com muitos representantes nunca tenha sido muito radicalizado nos últimos anos, ainda é algo que assusta um pouco. O Alckmin é um indivíduo do PSDB que foi para o PSB. (Isso) Facilita em uma eleição que você precisa conquistar uma classe média desconfiada de discursos muito apoteóticos”, afirma.
A estratégia de escolha de Alckmin como vice tinha como objetivo enfraquecer a ideia do antipetismo e atrair o apoio de novos eleitores não muito familiarizados à sigla. Durante a campanha, o ex-governador de São Paulo, por exemplo, assumiu o papel de porta-voz da campanha em discussões trabalhistas com o empresariado.
Durante a campanha, Lula recebeu apoio de figuras históricas do PSDB como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os economistas Persio Arida e Arminio Fraga, e a senadora Simone Tebet (MDB) que passou a participar ativamente da campanha de Lula no segundo turno. Os apoios recebidos pelo ex-presidente Lula também podem ter contribuído para o que PT ampliasse sua votação, na visão dos analistas.
“A vitória do Lula não é um fator único. É um conjunto que leva a algumas estratégias corretas do lado do PT como essa questão de uma estratégia de frente ampla e alguns erros básicos do Bolsonaro tanto em termos de estratégia de campanha como num certo sentido do preço a pagar de ser o candidato que está no governo”, disse Stumpf.
Estados
Nas três regiões, o Estado com maior queda na vantagem de Bolsonaro sobre o adversário, entre 2018 e 2022, foi em São Paulo: de 36 pontos porcentuais para apenas 10. O avanço de Lula no maior colégio eleitoral do País não foi suficiente para que ele vencesse no Estado, mas o petista conseguiu cravar a virada na capital paulista. Em 2018, Bolsonaro ganhou no município com 60% dos votos contra 40% do Haddad. Nas eleições de 2022, o cenário foi: 53% para o petista e 46% para o chefe do Executivo.
Uma diminuição significativa na vantagem de Bolsonaro também foi vista no Distrito Federal e no Rio de Janeiro. Em ambos os locais, o chefe do Executivo teve queda de mais de 20 pontos percentuais na diferença para o PT. Em Brasília, a vantagem caiu de 40 pontos porcentuais para 18. No Rio, reduto eleitoral do presidente, a diferença foi de 36 pontos para 14.