24/10/2012 - 15:43
Graças à fama de estimulante natural, a água de coco é a nova queridinha do consumo saudável, disputando a preferência entre os naturebas de todos os calibres com as bebidas energéticas, à base de cafeína e taurina. Antes descartada como resíduo pela indústria de alimentos, ou usada no campo para aguar os coqueirais, ela se transformou num produto em ascensão no mercado, e já faz parte do portfólio de multinacionais como a PepsiCo. Anualmente, o País produz 65 milhões de litros da bebida, envasados em caixinhas tetra pak, contra 87 milhões de litros dos energéticos, segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não Alcoólicas (Abir). Em receita, segundo uma pesquisa da consultoria AC Nielsen, isso significa que a água de coco movimenta mais de R$ 300 milhões, por ano, no País. “A procura tem crescido, de fato”, diz o consultor Rafael Ikeda, da Nielsen. “Esse cenário está levando as empresas a investir, para ter preços mais competitivos diante das outras bebidas.”
Segundo Ikeda, há uma década o negócio era quase impensável e pouca gente se atreveria a investir seu dinheiro nele. Do coco, a indústria queria apenas a polpa da fruta, para a fabricação de doces, biscoitos e sorvetes. Quem quisesse beber água de coco tinha de recorrer aos ambulantes espalhados pelas praias e ruas das cidades. “Essa história ficou no passado”, diz Paulo Roberto de Maya Gomes, diretor-comercial da Sococo, a maior produtora brasileira de água de coco industrializada. “Agora, a água vale ouro.” Com sede em Maceió, a capital de Alagoas, a Sococo envasa 37 milhões de litros, por ano, o equivalente a 57% da produção nacional. De acordo com Gomes, a empresa quer chegar a 72 milhões de litros em 2016. “Dentro de quatro anos vamos envasar, sozinhos, mais água de coco do que o País inteiro”, diz Gomes. Fundada por um grupo português, em 1966, a Sococo conta, entre seus principais acionistas, com o empresário alagoano João Tenório, ex-senador e cunhado do governador de Alagoas, Teotônio Vilela Filho (PSDB). A presidência da empresa está nas mãos do engenheiro agrônomo Emerson de Melo Tenório, irmão de João Tenório.
Apesar da origem, as fazendas mais produtivas e os projetos mais ambiciosos da Sococo estão localizados no Norte do País, em dois municípios paraenses: Moju e Santa Isabel do Pará. A razão para concentrar seus investimentos no Pará está na produtividade obtida, o dobro da vigente na Bahia, Estado que mais cultiva a fruta no País. A Bahia conta com uma área de 79,6 mil hectares plantados e tira deles 5,8 mil frutos por hectare. O Pará, com 24,6 mil hectares, tem uma produtividade de 10,1 mil frutos por hectare, o dobro da baiana. Na fazenda de Moju, a pouco mais de 90 quilômetros de Belém, está localizado o maior cultivo de coco do País em área contínua. Na fazenda Sococo, dos 21 mil hectares de área, seis mil hectares estão plantados com 796 mil pés da fruta.
Todos os dias, 400 mil frutos são retirados do coqueiral, no lombo de jegues, e transportados por carretas para a fábrica de Ananindeua, também no Pará, para serem processados como coco ralado e seus derivados, entre eles, água e leite. Mas, o motor da expansão pretendida pela empresa está na fazenda Reunidas Sococo, em Santa Isabel do Pará, município a 40 quilômetros de Belém. A cidade, que já é conhecida por ser o principal polo de criação de aves e de hortaliças para abastecer a capital, se transformará em exportadora de água de coco. Ali, a Sococo terminou de plantar em Abril deste ano dois mil hectares de coqueiros-anões que começarão a produzir frutos dentro de dois anos. “Os cocos dessa fazenda serão destinados somente ao comércio de água da fruta, diferentemente das demais fazendas”, diz Alberto Jorge Maynart Tenório, diretor das fazendas. Comprada no ano passado por R$ 50 milhões, a fazenda faz parte de um plano de expansão orçado em R$ 120 milhões, até 2016, em que estão incluídos o marketing, linhas de produção e um centro de distribuição de produtos em São Paulo.
Este ano, a Sococo projeta faturar R$ 605 milhões, um crescimento de 10% em relação a 2011. A maior parte das receitas é obtida no mercado interno – as exportações representam perto de 5% das vendas. “Estamos investindo para que a fatia com as exportações chegue a 30% da receita daqui a dois anos”, diz Gomes. Atualmente, os principais clientes são Argentina, Estados Unidos, França e Japão. “Nesses países, há colônias brasileiras, com muita gente que é fã da água de coco”, afirma Tenório. “Mas a tendência é de que esse mercado no Exterior deixe de ser um nicho.” Celebridades, como a cantora Madonna, já foram flagradas bebendo água de coco. Mas ganhar o mercado externo não será uma tarefa das mais fáceis. Em relação a outros países, a produção nacional ainda é bem pequena.
Os maiores produtores mundiais de coco estão na Ásia, que responde por 80% do plantio. Somente na Indonésia são 2,9 milhões de hectares e 19,5 milhões de toneladas da fruta. O Brasil, na quarta posição atrás de Filipinas e Índia, tem 287 mil hectares, com produção de 2,7 milhões de toneladas da fruta, segundo FAO. No mundo a produção é de 60,7 milhões de toneladas da fruta, em 11,2 milhões de hectares.
Com a fazenda de Santa Isabel do Pará voltada para o mercado externo, a Sococo começa a equilibrar seu perfil empresarial. Hoje, o carrochefe da empresa é a fabricação de 15 mil toneladas de coco ralado, nas unidades de Ananindeua e também em Maceió. “Desse total, 80% é para o varejo e os outros 20%, para a indústria”, diz Gomes. Na indústria, por exemplo, o coco seco da Sococo é transformado nos chocolates Prestígio, da Nestlé, e Fricote, da Garoto, além de servir para o picolé Kibon, da Unilever.
A Sococo também terceiriza serviços para a concorrente PepsiCo. Em Ananindeua, a empresa envasa água de coco para as marcas Kero Coco e Naked, multinacional americana com sede em Monrovia, na Califórnia. “A Naked é a marca de exportação da PepsiCo no mercado americano”, diz Antonio Netto, gerente-geral da fábrica de Ananindeua. A partir dos Estados Unidos, a Naked vende produtos para o Canadá e os países do Reino Unido, principalmente para a Inglaterra. A Kero Coco pertencia à brasileira Amacoco – que também fabricava a marca Trop Coco –, mas foi adquirida pela PepsiCo, em agosto de 2009. Hoje, dos 37 milhões de litros, por ano, produzidos pela Sococo, 50% vão para a PepsiCo. “É uma terceirização que sustenta nossa ambição de continuar crescendo”, diz Netto.
A genética do coco-anão
Com tecnologia, pesquisa mostra que é possível produzir 120 frutos por planta
No projeto de plantio de coco da Sococo, a empresa tem como o seu maior diferencial o cruzamento genético entre os coqueiros-anões e gigantes, que gera um híbrido. Do melhoramento genético sai um coqueiro de tamanho intermediário, com mais frutos e produção precoce, entre três e quatro anos. Segundo Edilberto Sampaio, coordenador fitossanitário da Sococo, os coqueiros nativos podem levar até sete anos para render frutos. “E mais. Em média, o híbrido dá 120 frutos por pé por ano, ante 40 frutos da árvore gigante.”
De toda a plantação na fazenda Moju, 70% é cruzamento com frutos da Malásia e do oeste africano e 30% feitos a partir de outras sementes. O híbrido foi desenvolvido pelo Institut de Recherches pour les Huilles et Oleagineaux (IR HO), centro francês especializado em palmáceas, com sede em Paris. O centro foi contratado há dez anos pela Sococo para estudar a viabilidade de se cultivar a fruta no Pará. “Os estudos mostraram que nossa percepção do potencial da região estava certa”, diz Sampaio.
Jegues parceiros
Os animais de carga são essenciais no manejo das fazendas
Na maior fazenda de coco do Brasil, no município paraense de Moju, para colher 400 mil frutos, por dia, são necessários 240 funcionários. Mas, sem a ajuda de cerca de 100 jegues, o trabalho ficaria inviável. Todos os dias são formadas 85 duplas – um animal para cada dois funcionários –, para a função mais importante na fazenda: a seleção e a colheita dos melhores frutos. Enquanto um dos funcionários utiliza uma foice de cerca de 14 metros, olha para cima e escolhe a olho nu qual coco deve ser tirado do pé, o segundo aguarda ao lado montado no animal e recolhe os frutos. Cada burro carrega duas cestas, e nelas cabem 145 frutos. “Sem essa parceria entre homem e animal, a fazenda não anda”, diz Jurandir Rabelo de Araújo, médico veterinário responsável pelos animais da Sococo.