Na lista de compras de quem vai ao supermercado, produtos de limpeza, higiene pessoal, bebidas e alimentos já não são os únicos itens anotados. Nos últimos tempos, esses produtos, típicos de consumo das famílias, vêm sofrendo a concorrência das flores por um espaço nos carrinhos que circulam pelos corredores das grandes redes varejistas. Rosas em todas as suas variedade e cores, orquídeas do campo, bocas-de-leão, crisântemos, azaleias, violetas e gérberas são algumas das flores que nos últimos quatro anos vêm se tornando compra obrigatória para muitas donas de casa.

 

Para Vieira, as novas flores boca de leão e alstroemeria vão cair no gosto popular

Segundo Roberto Reijers, dono do grupo Reijers, produtor de flores em Minas Gerais, São Paulo e Ceará, o fenômeno de venda nas redes de supermercados e hipermercados tem uma explicação: elas compram em quantidade, conseguem preços mais justos e repassam ao consumidor. “Como a flor sempre foi um desejo e hoje ele é atendido, as donas de casa das classes C e D estão impulsionando os negócios no País”, diz Reijers. Favorecido também pelas compras feitas pela internet, por consumidores das classes A e B, o setor de flores tem registrado altas anuais entre 8% e 12% em volume de produção desde 2008. No ano passado, esse mercado movimentou R$ 4,3 bilhões, de acordo com a Câmara Setorial Federal de Flores e Plantas. Hoje, o Brasil produz mais de 350 espécies de flores de 2,5 mil diferentes variedades. A cadeia do setor gera, ainda, 195 mil empregos diretos, dos quais quase a metade está ligado à produção, 40% ao varejo e os demais a outras funções.

O grupo Reijers, baseado em Holambra, no interior paulista, é uma das empresas que tem apostado no crescimento das vendas no varejo para engordar o caixa. A produção média diária de 300 mil flores, distribuída por 120 hectares de estufas alojadas em 11 fazendas, já não tem como foco apenas o cultivo de rosas, hoje de 255 mil botões colhidos por dia. Em estufas, é a maior produção do País. Apesar desse trunfo, nos últimos anos, a diversificação tem sido a meta da empresa. Hoje, 10% das estufas já são destinadas a flores como a bocade-leão e a alstroemeria, uma espécie nativa sul-americana, que foi melhorada geneticamente e patenteada na Holanda. A escolha das duas espécies, segundo Gustavo Franco Rosa Vieira, diretor de produtos da empresa, se deu em função da durabilidade e da coloração intensa dessas flores, qualidades que atraem o consumidor das redes varejistas. “São flores muito vistosas e que podem se tornar cada vez mais populares, como a kalanchoe, a violeta e o crisântemo”, afirma Vieira. O cultivo de flores da Reijers é feito em sete fazendas na região de Itapeva, no sul de Minas Gerais, em duas fazendas próximas de Holambra, o maior pólo de produção de flores do País, no interior de São Paulo, e em duas fazendas no Ceará, nos municípios de Ubajara e São Benedito. Com a diversificação de cultivos, o grupo pretende regionalizar ainda mais a produção, com novas áreas na Bahia e no entorno de Brasília. Dentro de três anos, a Reijers pretende chegar a 210 hectares de estufas, 75% a mais que a atual área de plantio. “A aposta é o que o Nordeste e o Centro-Oeste desenvolvam uma classe média cada vez mais forte”, diz Reijers. “O mercado é atrativo porque as pessoas estão mudando o conceito de qualidade de vida.” O empreendimento levará a empresa a ter 42% da área ocupada por estufas no Brasil. Segundo a seção gaúcha da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater/RS), o custo médio de uma estufa de mil metros quadrados (0,1 hectare) é R$ 25 mil. Com uma vida útil de cinco anos, cada estufa pode gerar um lucro de até R$ 15 mil no primeiro ano e R$ 40 mil no segundo ano, a depender da espécie escolhida.

No varejo: a loja do Carrefour, na Barra da Tijuca, é a que mais vende flores da rede, com 100 mil unidades por mês

Empresas como a Reijers, além das paulistas Veiling e Pronta Flora, no município de Holambra, Roselândia em Cotia, e as gaúchas Lazzari Flores, de Vacaria, e a Úrsula Flores, de Nova Petrópolis, estão abastecendo grandes redes nacionais, como o Pão de Açúcar, Walmart e Carrefour, e também regionais, como Zaffari (Rio Grande do Sul), Savegnago (interior de São Paulo) e STMarche (São Paulo). De acordo com Laerte José Correa, engenheiro agrônomo da Emater/ RS, a popularização das flores está levando a vendas cada vez mais refinadas no varejo, puxadas por essas redes. “Elas pesquisam as tendências de mercado e abrem nichos”, diz Correa. No Carrefour, por exemplo, nos últimos anos vem sendo notada ainda a presença cada vez mais constante de homens no setor de flores. O Carrefour começou a investir mais pesado na venda de flores há sete anos. Hoje, a oferta em suas 170 lojas pode chegar a 300 tipos, dependendo da sazonalidade. A campeã em vendas é a loja da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. O espaço vende 100 mil unidades por mês, volume equivalente a quatro carretas carregadas de plantas e flores.

 

As 300 mil flores colhidas, por dia, na Reijers passam por um processo de seleção

Além do maior poder aquisitivo no País, um fator que tem estimulado as vendas no mercado interno é o desinteresse dos empresários brasileiros pela exportação, ao contrário do que ocorre na Colômbia, hoje o segundo maior exportador de flores do mundo. A alta carga tributária, o câmbio desfavorável e a logística ineficiente para tirar o produto do País reduzem a competitividade do setor lá fora. Produzir uma rosa no Brasil, por exemplo, é 30% mais caro do que na Colômbia. “Sem contar que para colocar suas flores no Brasil, os colombianos pagam menos impostos”, diz Correa, da Emater/RS. Em 2011, o País desembolsou US$ 34,3 milhões com importações de flores, de acordo com o Instituto Brasileiro de Floricultura (Ibraflor), em Holambra. A influência dessas compras é tamanha que nos últimos anos as flores colombianas passaram a balizar os preços no País. No entanto, para Yuuki Ban, presidente da Associação Riograndense de Floricultura (Aflori), em Porto Alegre, o Brasil tem vantagens competitivas que podem reverter esse quadro. “O principal trunfo do País é a grande quantidade de microclimas privilegiados em todas as regiões”, diz Ban. O Rio Grande do Sul, com um inverno rigoroso, é um exemplo. Com tecnologia, como flores mais resistentes e variedades adaptadas, a produção cresceu 15%, no ano passado. O número de produtores no Estado chega a 600, o dobro de uma década atrás. “Realizamos um trabalho intenso, mostrando que é possível produzir bem”, diz Ban. Por trás desse esforço está um mercado ávido por consumir. Os gaúchos gastam, em média, US$ 20 anuais com flores, o dobro da média nacional. Mas, ainda importam de outros Estados 70% do que consomem. “Essa demanda vai manter o crescimento do setor”, diz.