As pesquisas relacionadas ao desenvolvimento do feto humano ganharam um novo viés: a pecuária de corte. É o que está acontecendo nos microscópios do laboratório do departamento de ciência animal da Universidade de Dakota do Sul, em Brookings, no centro-oeste dos Estados Unidos. Ali, estão sendo usados em bovinos os mesmos princípios da ciência humana para determinar a influência da nutrição da mãe no desenvolvimento do feto. A ideia, segundo Amanda Weaver, pesquisadora e professora de ciência da carne na universidade, responsável pelo estudo Programação Fetal, é melhorar a produtividade da pecuária e a qualidade da carne. A nutrição é um dos principais pilares que sustentam a atividade e representa quase 70% dos gastos com custeio na produção pecuária. “Nosso foco é fazer com que os animais aproveitem mais os nutrientes presentes na alimentação, para a formação dos músculos”, diz Amanda. “Isso começa no feto.” O programa também está monitorando a gordura intramuscular, chama da de marmoreio. “É ela que dá sabor e suculência à carne”, diz.

Amanda Weaver, pesquisadora e professora americana

 

Desde abril de 2010, quando foram obtidos recursos da ordem de US $ 450 mil do Conselho da Indústria de Carne de Dakota do Sul e do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda), Amanda e sua equipe analisam o segundo trimestre de gestação bovina como o ponto de partida para o desenvolvimento das fibras musculares do feto, de acordo com a nutrição oferecida à mãe nesse período. Até então, as pesquisas mundiais destinadas à melhoria da carcaça bovina se concentravam na nutrição do bezerro do nascimento até o abate, ou na condição corporal da fêmea relacionada ao seu desempenho reprodutivo.

No projeto Programação Fetal, 150 novilhas foram divididas em dois grupos. No primeiro, chamado grupo de controle, as 75 fêmeas foram alimentadas para manter o escore corporal entre 5.0 e 5.5 números que correspondem a uma escala visual de avaliação em que não é possível ver ou sentir os ossos da costela e do traseiro do animal. O segundo grupo, chamado de restrito, teve uma alimentação reduzida para perder escore corporal durante o segundo trimestre da gestação, o que ocorreu entre novembro de 2010 e fevereiro de 2011. “Alimentamos os animais com muito menos do que necessitavam”, diz Amanda. Após essa fase, durante o terceiro trimestre de gestação,  as fêmeas foram novamente reunidas e se mantiveram juntas do parto até o desmame dos bezerros.

PROGRAMAÇÃO FETAL: o estudo foi apresentado no 28º simpósio da alltech, em lexington, no estado americano do kentucky

 

Desmamados, em outubro de 2011, os bezerros foram enviados ao confinamento de pesquisa da universidade, no qual a influência da restrição de nutrientes na alimentação materna está sendo estudada desde maio de 2012, mês em que foram coletadas amostras de carne dos animais. “As análises estão ainda em andamento, mas uma coisa é certa: os bezerros que conseguiram aproveitar os nutrientes ingeridos pela mãe tiveram uma melhor formação de fibras musculares”, afirma Amanda.

A importância da formação dessas fibras se deve ao fato de o processo acontecer na fase fetal. Depois de nascido, o animal só consegue aumentar o seu peso, mas novas fibras jamais serão produzidas. Amanda apresentou a pesquisa em maio deste ano, durante o 28° Simpósio Internacional de Saúde e Nutrição Animal da multinacional americana Alltech, em Lexington, no Estado do Kentucky, e no mês de junho esteve em São Paulo, no Fórum Técnico de Bovinocultura, organizado também pela Alltech. A empresa desenvolve, há 32 anos, produtos de saúde e nutrição animal, em 128 países, com presença regional na Europa, América do Norte, América Latina, Oriente Médio, África e Ásia.

Para José Leonardo Ribeiro, gerente de produtos para ruminantes do grupo brasileiro Guabi Nutrição Animal, de Campinas (SP), que participou do simpósio da Alltech, nos Estados Unidos, é fundamental compreender a importância da nutrição das vacas no desenvolvimento do feto e sua consequência após o parto. “Será fundamental para a pecuária do Brasil esmiuçar o metabolismo das fêmeas”, diz Ribeiro. Apenas em 2011, quase 50 milhões de bezerros de corte nasceram no País.

José Leonardo Ribeiro, gerente de produtos da Guabi

A maior parte das vacas gestantes é manejada em regime de pasto e boa parte do período de gestação, entre o terceiro e o sétimo mês, normalmente coincide com o período seco do ano, quando ocorre menor oferta de capim e de pior qualidade. “A vaca acaba se alimentando de forrageiras com menores teores de proteína, energia e minerais”, diz Ribeiro.

Em geral, o pecuarista acaba levando as fêmeas a pastos mais nutritivos depois que o estrago já foi feito. “O descuido nutricional no terço médio de gestação não será compensado pela alimentação correta no terço final, responsável por 75% do crescimento fetal”, diz.