Brasil produz dez milhões de toneladas de carne bovina por ano, mas, em 2025 serão 14 milhões de toneladas para atender a demanda doméstica e a mundial, de acordo com estudos do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).  Da atual produção, cerca de 8,4 milhões de toneladas vão para o prato do brasileiro. O consumo per capita está entre os maiores do mundo: cerca de 40 quilos anuais, mas ainda longe dos campeões, os Uruguaios, com 52 quilos. Em busca de eficiência na produção de carne, um movimento vem ganhando força na pecuária dos últimos anos: a gestão do negócio da porteira para dentro. Vale para o pecuarista em busca de nichos de mercado e também para quem entrega o gado entregue ao frigorífico. “O produtor não tem saída, ele precisa fazer da pecuária um negócio lucrativo”, diz Carlos Viacava, criador de nelore no interior paulista. “No Brasil, há carne de todos os graus de qualidade, da ruim à excelente, mas o mercado começa a buscar pela melhor e isso pode significar lucro para quem produzir de forma diferenciada e sustentável.”

A pecuária é, de fato, um grande e fabuloso negócio. No ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) do setor foi de R$ 400 bilhões. De acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/USP), desse total, R$ 169 bilhões foram gerados dentro da porteira, equivalente a 42% do PIB pecuário. O restante foi dividido entre insumos, indústria e serviços. Até uma década atrás, o trabalho de criação e engorda do gado nas fazendas gerava um PIB de R$ 106 bilhões e há duas décadas, menos da metade do que é hoje.

Neste “Especial Carne Sustentável”, que vai até a pág. 60, estão algumas histórias de pecuaristas determinados a produzir bois a partir de projetos em que o conceito de cadeia produtiva passou a ser o foco do negócio. Eles se concentraram na gestão do negócio para atender nichos com demanda garantida, como os açougues especiais, a alta gastronomia e as redes de fast food.  “Mas, em qualquer caso, é preciso não perder de vista que tudo o que acontece, ou venha a acontecer na pecuária, é no médio e longo prazos, não menos do que dez anos”, diz Renato Barcellos, dono de fazendas em Minas Gerais, São Paulo e Mato Grosso, e atual presidente da Associação de Criadores de Nelore do Brasil (ACNB). “Por isso, precisamos utilizar a raça que criamos como uma marca de força, para construir essa pecuária do futuro.” Barcellos se refere ao programa de carne de qualidade Nelore Natural, criado em 2001 para bonificar a produção de animais superiores e que hoje conta com cerca de 500 produtores. A previsão, para este ano, é entregar no mercado 140 mil toneladas de carne processada. “Isso é muito pouco, perto dos 44 milhões de animais abatidos no País, dos quais 80% têm algum grau de sangue nelore”, afirma Barcellos.


José Roberto Weber, da Aba: “O produtor precisa entregar um boi jovem, bem acabado de gordura e nos padrões  raciais pedidos pelo programa de carne certificada”

O presidente da Associação Brasileira de Angus (ABA) José Roberto Pires Weber, diz que para produzir carne de modo sustentável, os produtores de gado sabem o que precisa ser feito no campo, pelo menos na teoria. “Ele precisa entregar um boi jovem, bem acabado de gordura e dentro dos padrões raciais, conforme as regras dos programas de carne de qualidade”, diz Weber. “O que estamos realizando na ABA é um trabalho de convencimento de que com gestão e manejo é possível cumprir essa meta.”  O programa Carne Angus Certificada, coordenado pela entidade, abate atualmente 400 mil animais, bonificando os superiores com até 10% sobre o preço da arroba. Até 2020, a meta da ABA é abater um milhão de animais por ano.


Renato Barcellos, da Acnb:  “precisamos utilizar a raça que criamos como uma marca de força para construir a pecuária do futuro”

Para Adolfo Fontes, analista da área de proteína animal do Rabobank Brasil, os projetos de carne de raças especializadas, cruzados de nelore com outras, como angus, hereford, wagyu, por exemplo, crescem porque há um consumidor em busca de atributos de qualidade. “A pecuária brasileira cresceu com baixa tecnologia, para ocupar o território. São 170 milhões de hectares de pastos, mas essa fase acabou, definitivamente”, diz Fontes. “A demanda dos consumidores por carne macia, por exemplo, é recente, mas sem volta no tempo.” 

Não há informações sobre a quantidade de carne premium que o Brasil importa, mas há dados que mostram como esse mercado pode crescer. Em 2015, de acordo dados oficiais, o Brasil importou 17 mil toneladas de carne do Uruguai, Argentina e Austrália, por US$ 131,8 milhões, equivalente a US$ 7,7 mil por tonelada. Esses países são, reconhecidamente, produtores de carne macia e suculenta. Para se ter ideia do valor, trazido para o dólar de R$ 3,40 do final de junho, a tonelada sai por R$ 26,3 mil. É o dobro do preço da carne brasileira exportada. A maior parte do que é vendido lá fora sai, em média, por US$ 4 mil. “A carne no Brasil é um negócio de grande potencial”, diz Fontes. “Cada vez mais veremos uma pecuária buscando por modelos de alta performance.”