O  Brasil chegou a produzir tanta borracha natural que pôde até se dar ao luxo de revestir o calçamento das ruas no entorno do Teatro Amazonas, no centro de Manaus, só para que os espetáculos não sofressem a interferência do tráfego de carruagens. Isso só foi possível nos áureos tempos do Ciclo da Borracha, entre o fim do século 19 e início do século 20, quando a produção nacional, além de suprir o consumo interno, abastecia o mercado internacional. Mais de 100 anos depois de os ingleses terem a ideia brilhante de plantar sementes de seringueiras brasileiras  em países asiáticos, e torná-los os maiores produtores, com mais de 65% da produção mundial de borracha natural, o Brasil ainda busca um meio de apagar esse revés de sua história e reconquistar a competitividade no  mercado. O mundo produz atualmente quase 11 milhões de toneladas de borracha natural. O Brasil fornece pouco mais de 1% da oferta mundial do produto. Segundo Ademar Silva Junior, presidente da Comissão Nacional de Silvicultura e Agrossilvicultura da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a realidade brasileira tem sido importar cerca de 280 mil toneladas de borracha natural. Isso corresponde a uma aquisição, em 2012, em torno de R$ 2 bilhões. O País produz apenas um terço do que consome, em torno de 120 mil toneladas da commodity. Para Silva Junior, o começo de uma inversão nesse cenário pode estar em Mato Grosso do Sul. “Além de apresentar relevo, solos e clima adequados à produção de seringueiras, o Estado está próximo dos maiores consumidores, São Paulo, Minas Gerais e Goiás”, diz Silva Junior.

E é justamente de olho nesse potencial produtivo que empresas especializadas na implantação e gestão de seringais estão investindo em áreas de  cultivo no Estado. Uma delas é a Cautex Florestal, com sede em Macaubal (SP) e filial em Paranaíba (MS). A empresa, que já possui mais de cinco milhões de seringueiras plantadas, das quais mais de 3,35 milhões, em cerca de oito mil hectares, em Mato Grosso do Sul, lançou no início do mês passado o programa Complexo da Borracha Natural, em Cassilândia. No Estado, há 12 mil hectares cultivados com seringueira, nas regiões nordeste, norte e central, com oito milhões de pés plantados.

De acordo com Getúlio Ferreira Junior, diretor da Cautex, a escolha da região leste de Mato Grosso do Sul, onde está localizada Cassilândia, se deu em razão de o local ainda ter grandes áreas disponíveis para o reflorestamento, sobretudo pastagens degradadas. “A seringueira é uma alternativa económica e sustentável também para recomposição de áreas de reserva legal”, diz Ferreira Junior. “No final de seu ciclo produtivo, podemos explorar a madeira e vendê-la para a indústria moveleira.” Segundo ele, a borracha natural tem um retorno interessante, apesar do alto investimento inicial necessário, de cerca de R$ 6 milhões para 100 mil árvores plantadas, e retorno no longo prazo. São sete anos, idade em que a árvore está preparada para a primeira sangria de látex. O quilo da borracha natural gira em torno hoje de R$ 3,10 a R$ 3,80.

Com o projeto, o diretor da Cautex espera aumentar para 20 milhões o número de pés cultivados, em uma área de 40 mil hectares, até 2016. De dezembro do ano passado para cá, quando o projeto foi apresentado ao governo de Mato Grosso do Sul, o complexo já recebeu R$ 1 bilhão em investimentos, dos R$ 2 bilhões previstos para a conclusão do complexo, daqui a quatro anos. A construção de um viveiro, um centro de treinamento e uma agrovila, implantada em 300 hectares, com 1,5 mil casas começa ainda neste ano. “Depois vamos construir uma usina de beneficiamento e um parque transformador de borracha natural”, diz Ferreira Junior. A expectativa é de que a usina entre em operação em Agosto de 2014, com uma produção inicial de dez mil toneladas de borracha natural por ano. “Até 2024 o complexo deve processar 80 mil toneladas da commodity”, diz. O Complexo da Borracha deverá gerar mais de cinco mil empregos diretos e indiretos. O que para Maria Dativa Oliveira Machareti e seu marido, Jonas Ademir Machareti, é motivo de comemoração. Eles trabalham há mais de 11 anos na região de Cassilândia fazendo sangria, método de extração de látex que consiste em riscar o tronco da seringueira, fazendo com que a borracha escorra até um recipiente. Para o casal, os investimentos da Cautex possibilitarão que eles também cresçam com o negócio. A renda familiar, hoje em torno de R$ 2,4 mil, pode ultrapassar a casa dos R$ 3 mil.