30/08/2022 - 14:00
Aveia, milho pipoca, canola, linhaça, triticale, girassol, centeio e trigo. Culturas de inverno pouco comuns em um país tropical, no qual as dimensões continentais permitem produção de expressivas 257 milhões de toneladas de commodities agrícolas, começam a ser incentivadas por iniciativas públicas e privadas. O maior exemplo vem de Santa Catarina. Após quebras sucessivas de safra de milho que atingiram em cheio a produção de ração animal, o governo estadual lançou o Projeto de Incentivo ao Plantio de Cereais de Inverno. Com investimento de R$ 5 milhões a produtores que toparam o desafio no ano passado, o resultado foi a produção de 290 mil toneladas de trigo, aumento de 70% com relação ao ano anterior — um recorde para o estado. Mas o potencial é maior.
De acordo com os dados da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), o potencial para a produção de cereais de inverno na região chega a 800 mil hectares. Trigo e triticale se destacam. A primeira opção, segundo o pesquisador e supervisor de pesquisa da entidade Sydney Kavalco, é o trigo pela sua relevância econômica e social, com produção de 350 mil toneladas no estado em 2021. “Apesar de o custo de produção estar alto, os preços do cereal estão bons, o que traz boa rentabilidade”, afirmou. No Brasil, a produção é de 7 milhões/ton e o consumo, 12 milhões/ton. De acordo com o Cepea/Esalq, a tonelada da commodity passou de R$ 1.554,64 em junho de 2021 para R$ 2.122,18 em junho de 2022, alta de 36% considerando os preços praticados no Rio Grande do Sul. Já o triticale que, segundo a Embrapa Suínos e Aves, tem equivalência nutricional do trigo, deve ganhar escala por sua alta produtividade de 4 toneladas por hectare.
Outro efeito colateral bem-vindo para o dono da propriedade com culturas alternativas é a possibilidade de diluir custos fixos. Segundo o engenheiro agrônomo João Rogério Alves a alta dos custos chegou a 31,7% em Santa Catarina nos últimos 12 meses. Somente em fertilizantes, a elevação foi de 83% e em insumos, 51,6%. “O impacto é bastante grande”, disse. “Com maquinários, insumos e estrutura da fazenda é a mesma coisa, o produtor consegue maximizar seus recursos.”
OPORTUNIDADE Mas é no estado vizinho que está sediada uma das empresas que mais tem se destacado com culturas alternativas. Instalada no Rio Grande do Sul, a Agrícola Ferrari começou a mirar este mercado em 1988, dez anos depois de sua fundação como uma empresa de agropecuária. A cultura inicial foi o milho pipoca, nos anos seguintes passou a desenvolver os mercados de girassol, canola, aveia, painço, feijões especiais, linhaça e milho branco. Para alcançar o sucesso, afirmou Alex Luviseto, diretor do departamento Técnico e Comercial da companhia, o fundamental foi criar uma sólida relação de parceria com produtores. “Sempre pensamos na parte agronômica: rotação de cultura, maior produtividade do solo e uma nova receita para o produtor”, afirmou.
O modelo de negócios estava indo muito bem até que uma grande estiagem no Rio Grande do Sul provocou uma indesejada quebra de safra. Da crise, a empresa viu uma oportunidade e em 2004 resolveu expandir suas operações para o Mato Grosso. No estado, a produção do milho pipoca prosperou e em 2010 a empresa ganhou escala ao exportar o grão. “Passamos [o País] de importador para exportador da mercadoria”, disse. Hoje, de acordo com o executivo, o Brasil deve semear entre 50 mil e 60 mil hectares do cereal, do total 40 mil estão em Mato Grosso e a Ferrari participa com mais de 50% desta área plantada.
Claro que focar nas culturas alternativas traz grandes desafios, mas o time da Agrícola Ferrari não se rende. Junto a entidades de pesquisa, como a Embrapa, está sempre de olho em novas oportunidades. Uma delas é a plantação de gergelim. De acordo com a instituição de pesquisa, a produção do grão no Brasil passou de 41,3 mil toneladas na safra 2018/19 para 95,8 mil toneladas na temporada 2019/20, alta de 123%. E segue crescendo. Novamente, segundo Luviseto, o ganho de escala veio com ajuda dos embarques ao exterior. “É uma planta cultivada há mais de 30 anos que só atingiu esse volume com o início das exportações a partir de 2017”, disse. No caso da Ferrari, lider nacional na exportação do produto, os embarques seguem para os cinco continentes.
Com o sucesso da empreitada comprovado, a empresa se prepara para replicar essa história em culturas tão desafiadoras como grão-de-bico, linhaça, feijões especiais e todo seu portfólio distribuídos nas unidades do Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Tocantins e no Pará.