O início do cultivo do algodão no Brasil é incerto. Na literatura há registros de pequenas culturas por indígenas. Mas foi em 1750 que a cotonicultura alcançou escala comercial, logo colocando o País como um dos maiores produtores e exportadores da commodity. Tudo ia bem até que uma infestação de bicudo, por volta da década de 1990, inverteu a balança comercial e o mercado doméstico passou a importador. Agora, nova reviravolta. Com 1,68 milhão de toneladas da pluma embarcadas na safra 2021/22, somando receita de US$ 3,208 bilhões, o Brasil voltou a se destacar alcançando o posto de segundo maior exportador de algodão do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Os dados são do último levantamento da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa).

E a tendência é a cultura continuar em ascensão. Na próxima safra, a área plantada deverá subir 2,6% em relação à anterior, totalizando 1,641 milhão de hectares, de acordo com o levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A produção total projetada (incluindo pluma e caroço) chega a 7,23 milhões de toneladas, crescimento de 15,3%, ante a safra 2021/22. Com esse volume, o País conseguirá atender com folga as cerca de 750 mil toneladas médias do consumo interno e ainda colocar o restante à disposição do mercado internacional.

Os produtores nacionais comemoraram as conquistas do biênio encerrado no último mês de dezembro porque refletem as mudanças no setor. Segundo o presidente da Abrapa, Júlio Cézar Busato, a execução do projeto para a certificação oficial do algodão brasileiro, em parceria com o Ministério da Agricultura, agregou ainda mais valor à fibra nacional. “Ampliamos o programa SouABR, que permite a rastreabilidade desde a semente até o guarda-roupa”, afirmou. Em outra frente, o setor implantou o projeto-piloto do ABR-Log que, segundo o executivo, “já está em processo de testagem do protocolo social, ambiental e de boas práticas, a serem seguidas por todos os terminais portuários, garantindo a certificação socioambiental”.

“União de todos os elos da cadeia de produção ajudou o Brasil a retomar seu lugar entre os maiores” Júlio Cézar Busato Abrapa (Crédito:Divulgação)

O ABR-Log tem o objetivo de melhorar a qualidade das operações para que o algodão chegue ao destino sem danos físicos e sem sujeiras. Para Busato, esses resultados só estão sendo possíveis devido à ação conjunta de diferentes elos da cadeia produtiva, que contribuíram para programas importantes como o movimento Sou de Algodão e a iniciativa Cotton Brazil. Em seis anos de existência, o Sou de Algodão reuniu mais de 1,1mil marcas parceiras que ajudaram a incentivar o uso da fibra junto ao consumidor brasileiro. Já o Cotton Brazil promove a commodity brasileira no mercado externo, ajudando a ampliar os negócios, sobretudo na Ásia, onde a Abrapa mantém um escritório comercial.

SECA O clima vem sendo o maior desafio para a produção do algodão tanto no Brasil como em outros países produtores, a exemplo dos Estados Unidos e do Paquistão. Os concorrentes do produto brasileiro tiveram problemas sérios com suas safras e houve redução da oferta global. Mas mesmo com menos produto disponível, as cotações internacionais não subiram tanto como outras commodities. Isso porque o consumo global da fibra vem caindo ano a ano, passando de 25,5 milhões de toneladas para 25,1 milhões de toneladas no ano passado. Preocupados, os produtores dizem que há um avanço no uso de fibras sintéticas. “Houve uma redução de consumo especialmente na China, maior comprador mundial”, afirmou a analista do Rabobank, Marcela Marini. Ela acrescenta que a menor procura tirou a força das cotações no mercado internacional, quando comparado às altas registradas em outras commodities como milho e soja.

Com essa redução do consumo, é esperada leve recomposição dos estoques globais, passando de 18,5 milhões de toneladas para 19,1 milhões de toneladas, mesmo considerando a oferta menor dos maiores produtores da pluma. Diante da fraca demanda, as cotações da pluma na bolsa de Nova York apresentaram queda de 24% só em outubro de 2022 ante o mesmo mês do ano anterior. O preço preocupa o cotonicultor brasileiro, mas não será impeditivo para que dessa vez ele se mantenha no topo do ranking mundial.