O Brasil é um dos países que menos vão sofrer com o impacto da inflação global agravada pela guerra entre Rússia e Ucrânia, segundo o ex-diretor do Banco Central e CEO da Mauá Capital, Luiz Fernando Figueiredo.

Essa relativa vantagem comparativa apontada pelo economista está no fato de o Banco Central brasileiro ter sido um dos primeiros a começar a elevar a taxa básica de juros, a Selic, para conter a alta de preços. Hoje o BC já está no final do ciclo de aperto monetário.

Outro ponto favorável é que o País é um grande exportador de commodities. Com isso, a disparada dos preços em dólar das matérias-primas, que ganhou força com a guerra, gera mais renda para o setor agrícola e Produto Interno Bruto (PIB) para o País, minimizando o impacto no câmbio. “O cenário é menos negativo para o Brasil, mas não dá para ficar otimista nessa situação.”

O economista frisa que o quadro atual é muito fluido e incerto. Numa semana o barril de petróleo bate US$ 130 e na outra está abaixo de US$ 100. Por isso, acredita que os bancos centrais pelo mundo têm de reagir aos estragos que a guerra trouxe para a inflação, mas devem ser cautelosos para não exagerar na dose e agravar o cenário de baixo crescimento com a alta de juros.

Figueiredo acredita que daqui para frente o risco político passará a fazer parte dos fatores de sustentabilidade que norteiam investimentos. “Países que trazem esse risco vão sofrer muito mais e, nesse sentido, o Brasil não tem esse tipo de problema.”

6 PERGUNTAS:

Qual o cenário econômico antes e depois da eclosão da guerra entre Rússia e Ucrânia?

Com a pandemia, o mundo se viu com uma inflação muito elevada. A inflação dos últimos 12 meses nos EUA é de 7,9% e antes era de 1,5% ao ano. No Brasil, a inflação era em torno de 4% e foi para 10%. Com o arrefecimento da pandemia e a volta das atividades, é preciso normalizar as políticas fiscal e monetária, de maneira que a inflação gradualmente volte a cair. Esse era o mundo pré-conflito Rússia e Ucrânia. O conflito trouxe mais inflação e menos crescimento. E ampliou muito o dilema ou a dificuldade que os bancos centrais vão ter no mundo todo para fazer frente a essa situação. Esse é o pano de fundo.

Qual a posição do Brasil?

O Brasil tem várias questões que são bastante diferentes. Estamos num momento final do ciclo de aperto monetário. O Banco Central foi um dos primeiros a subir juros. Com a guerra, o Brasil sofre a influência de mais inflação em função do aumento do petróleo, do aumento das commodities e alguma coisa de menor crescimento. Mas temos uma grande atenuante porque somos um grande exportador de commodities.

Diante dessa mudança de cenário externo, o que o BC deve fazer?

O BC precisará apertar mais os juros do que imaginava e vai manter a Selic em patamar mais alto por mais tempo do que imaginava antes do conflito. Essas coisas são prováveis, mas, como o conflito pode ser temporário, o BC tem que ter cautela. Há uma semana o petróleo estava a US$ 130 o barril e agora está abaixo de US$ 100. Está tudo muito fluido.

Qual é a efetividade de subir juros para conter inflação de oferta provocada pelas commodities?

A efetividade é não deixar que as altas de preços se propaguem pela economia. Um aumento de custo é sempre desafiador para os bancos centrais.

Qual é o impacto da alta de juros básicos para a atividade?

Ela esfria a economia, lógico. Mas tem outro aspecto que ocorre em uma situação de guerra, que não é só o conflito bélico, mas político e geoeconômico. Essa situação reduz a confiança das pessoas, que afeta o crescimento.

Se a guerra acabar, a tendência é de as coisas voltarem para o eixo?

Eu tenho dúvidas. Não tivemos sanções econômicas tão severas em nenhum outro conflito. O impacto econômico será muito maior do que se imaginava.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.