01/04/2014 - 3:31
Não é de hoje que os Estados Unidos observam o crescimento do agronegócio brasileiro com olhos de águia e uma pitada de preocupação. Cada vez que o País ganha competitividade no mercado externo, Washington não perde tempo: aciona o Comitê de Agricultura da Organização Mundial do Comércio (OMC) e cobra explicações de como isso foi obtido. Em 2012, os chamados leilões Prêmio para Escoamento de Produto (PEP) para o trigo foram alvo dos americanos. O PEP é um subsídio ao frete, concedido a indústrias ou comerciantes que adquiram uma commodity diretamente de agricultores ou cooperativas pelo preço mínimo fixado pelo governo federal. Segundo as denúncias, a medida teria permitido ao Brasil, que historicamente é um importador do cereal, exportar 2,4 milhões de toneladas em 2011. Em 2013, o alvo foi o PEP para o arroz.
Este ano mal começou e os Estados Unidos voltaram a bater à porta da OMC, desta vez para cobrar justificativas do Brasil referentes a outro subsídio agrícola doméstico, o Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (Pepro), para o milho. O Pepro é uma subvenção concedida ao agricultor ou à cooperativa que se disponha a vender o produto pela diferença entre o valor mínimo e o valor do prêmio equalizador arrematado em leilão. “Esses leilões não são subsídios diretos ao produtor. São mecanismos equalizadores do frete”, diz Neri Geller, secretário de política agrícola do Ministério da Agricultura. “Os Estados Unidos não têm nenhuma chance de interferir em nossa política, porque as subvenções seguem regras internacionais de comércio.”
Segundo analistas de mercado, o descontentamento dos americanos em relação ao subsídio para o milho começou no fim do ano passado, depois que o Brasil fechou um negócio com a China e ficou com parte da fatia dos produtores dos Estados Unidos naquele mercado. Pelo acordo, os chineses vão comprar o equivalente a US$ 4 bilhões em milho, algo em torno de dez milhões de toneladas. Na safra 2012/2013, a China importou três milhões de toneladas, volume que deverá mais do que dobrar, chegando a sete milhões em 2013/2014, de acordo com estimativas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda).
No mês passado, os reclamantes pediram ao governo brasileiro que apresente a lista de leilões realizados e o volume do cereal beneficiado com subsídios nos últimos cinco anos. Além disso, eles querem saber quanto da produção escoada através do programa foi exportada e o volume de recursos envolvidos. “Os americanos estão procurando confusão”, diz Geller. Segundo ele, o volume de milho beneficiado com o Pepro abasteceu, basicamente, o Nordeste e o Sul do País no ano passado. De acordo com o relatório de operações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 2013 foram realizados 12 leilões Pepro para o milho de Goiás, Mato Grosso do Sul e, principalmente, Mato Grosso. Os leilões totalizaram 6,3 milhões de toneladas do grão, volume que contou com R$ 327 milhões a título de subvenção do governo federal.
Neste ano, o País deve exportar 23 milhões de toneladas de milho, apenas três milhões de toneladas a menos do que exportou em 2013. Entretanto, de acordo com Daniel Latorraca, pesquisador do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), isso só se concretizará caso o governo continue subsidiando o frete através dos leilões Pepro e PEP. Pelo menos até que a falta de infraestrutura logística do País seja resolvida. “No ano passado, a produção de milho em Mato Grosso foi muito grande, o que fez com que os preços ficassem muito abaixo do valor mínimo”, diz Latorraca. “Sem o subsídio ao frete seria inviável escoar a safra.” Em 2013, a saca chegou a valer apenas R$ 8 no Estado, enquanto o preço mínimo estipulado pelo governo foi de R$ 13,56. “Sem contar que o frete chegou a ser mais caro que o próprio milho, batendo em R$ 15.”