Considerado raro em países desenvolvidos, o câncer de pênis ainda afeta milhares de homens no Brasil. Embora evitável, a doença atingiu a pelo menos 10.265 brasileiros entre os anos de 2016 e 2020. São casos que, além de deixar sequelas físicas e psíquicas às vezes irreparáveis, colocaram o país entre as cinco nações com os maiores números de ocorrências, junto com Quênia, Uganda, Egito e Índia.

Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), mesmo que menos frequente que outros tumores, como o de próstata, o câncer de pênis representa cerca de 2% de todos os casos de neoplasias malignas diagnosticadas entre homens no Brasil, sendo mais frequentes nas regiões Norte e Nordeste – principalmente entre pessoas de menor grau de instrução e renda.

Conforme o Ministério da Saúde, a proporção de internações se manteve relativamente estável ao longo dos últimos anos: foram 1.961 em 2016; 2.017 (2017); 2.142 (2018); 2.194 (2019) e 1.951 no ano passado. Entre 2014 e 2018, as mais altas taxas de mortalidade por câncer de pênis foram verificadas em três estados da região Nordeste: Maranhão, Piauí e Sergipe; e em dois da região Norte: Pará e Tocantins. No ano passado, esses cinco estados, além de 370 cidades de todo o país, foram incluídos em um projeto-piloto que o ministério criou para qualificar o cuidado com a saúde masculina e tentar reduzir a incidência de câncer de pênis. A pasta destinou R$ 20 milhões ao projeto, ainda em fase experimental.

Higiene íntima

De acordo com o urologista Felipe de Paula, membro da diretoria da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) de São Paulo, muitos dos casos da doença poderiam ser evitados apenas com cuidados básicos com a higiene íntima, já que o descuido com a limpeza do órgão sexual masculino é identificada como o principal fator de risco.

“É preciso higienizar muito bem o pênis, mas não só sua parte exterior. É necessário expor a glande, ou seja, a cabeça do pênis; colocá-la para fora do prepúcio [camada de pele retrátil que cobre a extremidade do órgão] e lavá-la bem”, orienta o urologista, destacando que a presença de fimose pode aumentar o risco de surgimento de lesões e dificultar a lavagem adequada da glande (que deve ser feita apenas com água e sabonete ou sabão), aumentando o risco de surgimento de um tumor.

Demora no diagnóstico

Diretor clínico do Hospital Regional do Câncer de Presidente Prudente (HRCPP), no interior paulista, Paula também destaca que, por vários motivos, a maioria dos pacientes costuma demorar a constatar os sinais de que há algo de errado. E mais ainda para procurar um médico.

“Uma pesquisa demonstrou que, mesmo depois de perceber uma lesão no pênis, metade dos homens demorou mais de um ano para procurar o serviço de saúde. Seja por falta de acesso, seja, na maioria das vezes, por vergonha”, declarou o urologista à Agência Brasil, alertando para o fato de que, no último ano, o diagnóstico precoce da doença foi prejudicado também pelo medo do novo coronavírus.

“A situação piorou, pois com a covid-19, as pessoas têm procurado cada vez menos os serviços de saúde. Isto se reflete também em relação aos [diagnósticos de] tumores que se agravam à medida que a pessoa demora a buscar ajuda médica”, comentou Paula, destacando que, quanto mais cedo for iniciado, maiores as chances do tratamento de qualquer tipo de câncer ser bem-sucedido. “Infelizmente, quando muitas destes homens procuram o serviço de saúde, a situação já é grave.”

Paula recomenda que os homens fiquem atentos ao surgimento e à evolução de feridas e manchas em qualquer parte do órgão sexual, mas principalmente na glande. Ferimentos que não cicatrizam, a presença de uma secreção branca e/ou de um cheiro desagradável que não desapareça com a adequada lavagem do pênis podem ser indícios de um tumor.

Outro sinal preocupante pode ser a presença de gânglios inguinais (ínguas) na região das virilhas. Qualquer que seja o caso, a pessoa deve consultar um médico especialista para identificar a real causa do problema e receber o tratamento mais adequado.

Alta taxa de cura

Diagnosticado em estágio inicial, o tratamento do câncer de pênis apresenta elevada taxa de cura. A detecção dos casos de câncer pode ser feita por meio de exames clínicos, laboratoriais ou radiológicos. O tratamento depende da extensão local do tumor e do comprometimento dos gânglios inguinais, podendo ser feito por meio de cirurgia, radioterapia ou quimioterapia, conforme o caso. Segundo o Inca, o diagnóstico precoce é fundamental para evitar que a situação se agrave e seja necessário amputar parcial ou totalmente o pênis.

Embora seja mais frequente entre homens a partir dos 50 anos de idade, o câncer de pênis também pode atingir os mais jovens. Entre os fatores que aumentam o risco da pessoa vir a desenvolver a doença estão o fumo e as consequências de doenças sexualmente transmissíveis maltratadas – razão para os especialistas reforçarem a recomendação para que os homens usem preservativo ao terem relações sexuais.