O interventor federal na Segurança Pública do Distrito Federal Ricardo Cappelli afirmou na manhã desta sexta-feira, 27, que o acampamento montado em frente ao QG do Exército em Brasília teve ‘centralidade’ nos atos golpistas do dia 8, quando bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos três Poderes. Cappelli, que também é secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, indicou que ‘todos os atos de vandalismo tiveram organização, planejamento ou ponto de apoio’ no acampamento. “Virou um centro de construção de planos contra a democracia”, afirmou.

O interventor ressaltou ainda que ‘não houve plano operacional e sequer ordem de serviço’ para conter os atos golpistas. Segundo Capelli, houve falha, uma vez que relatório de inteligência da Secretaria de Segurança do DF – entregue ao gabinete do então chefe, Anderson Torres no dia 6 – apontou ameaça concreta de invasão aos prédios públicos. No entanto, não houve ‘desdobramento operacional adequado, com um plano detalhado’, ressaltou o interventor.

Torres aprovou um Plano de Ações Integradas para o dia 8, mas, segundo Cappelli, as diretrizes estabelecidas em tal documento devem gerar, nas unidades um desdobramento operacional, os planos operacionais ou ordens de serviço. “No evento do dia 8, isso não aconteceu. Não há um registro de quantos homens iriam a campo. Houve apenas um repasse burocrático para algumas unidades pelo departamento de operações”, explicou.

Nas palavras de Capelli, ‘nas melhores das hipóteses, faltou comando e responsabilidade’ na atuação das autoridades do DF contra os golpistas no dia 8. Ainda de acordo com o interventor, o ‘conjunto de coincidências’ identificado durante as apurações sobre o ocorrido no dia 8, pode caracterizar, sob os olhos da Justiça, ‘algo muito pior’ quanto à conduta dos responsáveis pela Segurança Pública do DF.

Segundo o interventor, uma série de condutas das forças de segurança do DF ‘corroboraram a ausência de um planejamento adequado em consonância com a informação que existia’ – o relatório que descrevia ‘tudo o que poderia acontecer’ no dia 8. Capelli diz após a edição do documento, apontando de forma ‘contundente’ os riscos do evento, foi elaborado ‘apenas um memorando, que não acionou batalhões importantes, que sequer foram acionados’. Ele falou em ‘falha operacional’ e ‘ausência de planejamento’.

O secretário-executivo do MJSP apontou, por exemplo, que o efeito mobilizado para área central e Esplanada no dia 8 era relativo a uma ‘rotina ordinária’ da Polícia Militar, não guardando ‘correspondência’ com alerta feito ao gabinete de Torres no dia 6. Também destacou que grande parte dos comandantes dos Batalhões ‘importantes’ da PM estavam de férias no dia 8 e que a barreira montada pelas forças de segurança não era ‘condizente com o alarme’ que existia.

Capelli também anotou que, entre o momento em que os golpistas deixaram o acampamento em frente ao QG do Exército e o minuto em que houve a quebra da linha de contenção da PM, houve ‘tempo suficiente’ para o acionamento de mais tropas que dessem suporte ao efetivo, considerando a ‘clara intenção’ dos ‘manifestantes. No entanto, o acionamento de reforço só ocorreu posteriormente e, quando as tropas chegaram à Esplanada, os três Poderes já haviam sido invadidos.

“Acho que são muitas coincidências juntas. E você percebe uma escalada. A bomba. A diplomação”, anotou Cappelli, ressalvando que é necessário coletar provas sobre o ocorrido no dia 8. “Conspiração não passa recibo, não é fácil você provar. É usual as pessoas todas tirarem férias em janeiro? Muita gente tira férias em janeiro. É razoável, numa escalada de movimentos, como a gente vinha assistindo, com a tensão subindo, todo mundo tirar férias junto? Não me parece”, completou.

O interventor também chamou atenção para a ‘dispensa-recompensa’ do chefe do departamento de operação da PMDF no dia dos atos golpistas. Segundo o interventor, o departamento é uma ‘peça central’, uma vez não desdobrou o plano de ações aprovado por Torres em plano operacional ou ordem de serviço, ‘nem comandou a mobilização condizente com a informação que existia’, sobre a possibilidade de invasão das sedes dos Poderes.

Responsabilidade do ex-comandante da PM, preso

Com relação à atuação do ex-comandante da Polícia Militar do DF, Fábio Augusto Vieira, o interventor na Segurança Pública ponderou que o coronel estava em campo ‘desde cedo’ e que ‘há relatos da preocupação com relação ao aumento de contingente’ de policiais no dia dos atos golpistas. “Mas os comandos dele não foram atendidos”, registrou.

Questionado, Capelli negou ter feito defesa de Vieira, afirmando ‘citar fatos’. “O que me pareceu é que ele (Vieira), no campo e no dia (8) perdeu a capacidade de comando. Ele não tinha comando sobre quem ele deveria comandar e talvez essa tenha sido a falha mais grave dele”, ponderou.

O ex-comandante da PMDF está preso por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. A prisão preventiva foi decretada com base em ‘fortes indícios’ de ‘conivência’ com os atos golpistas em Brasília.